Início Brasil Impeachment é caminho possível para mudança, diz Pedro Passos

Impeachment é caminho possível para mudança, diz Pedro Passos

0

O presidente do Conselho de Administração da Natura, Pedro Passos, defende o impeachment da presidente Dilma Rousseff como "o caminho possível" para a restauração da credibilidade do governo. Mas acha que um eventual governo Temer teria de rapidamente mostrar a que veio. "Ele tem pouco tempo para indicar que a direção é outra, porque não está nascendo de um processo eleitoral, mas de um processo de impeachment com a popularidade dele próprio baixa e com muita descrença em relação ao partido que preside."

 

Passos critica a atuação dos empresários no primeiro mandato de Dilma. Demandas específicas e setoriais "deixam de lado a visão de País". Ele também não se sente representado pelo pato gigante que a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) colocou na avenida Paulista, como símbolo da campanha contra a CPMF. "A representação empresarial deveria falar mais de macropolíticas e menos de símbolos de marketing", diz Passos, na seguinte entrevista:

Em artigo na Folha de S.Paulo, o sr. defendeu a renúncia de Dilma. Qual sua posição em relação ao impeachment?

O governo perdeu condições de tocar o País. A deterioração política e econômica é muito forte, principalmente do ponto de vista de credibilidade e liderança. O impeachment é hoje o caminho possível para a mudança. Eu imaginei que a renúncia seria o caminho menos doloroso, até para o próprio PT. A renúncia poderia vir como gesto de conciliação, de novo projeto para uma transição até a eleição de 2018. Confirmando o processo de impeachment, ainda vamos enfrentar alguma turbulência pela frente até que ele se defina, mas devemos ir em frente. Teremos boas possibilidades que o novo presidente Michel Temer possa assumir o País, ainda que num clima difícil, mas dentro da ordem constitucional.

Há dois anos, em entrevista ao ‘Estado’, o sr. disse que os empresários tinham perdido a confiança no governo Dilma. Um governo Temer teria a capacidade de devolver essa confiança?

Nos últimos tempos, o Palácio do Planalto se transformou num palanque, um desrespeito à liturgia do cargo. Vimos a presidente da República passando a chefe de partido político. Acho que Temer tem condições e experiência política para recolocar o respeito pela instituição da Presidência. Precisamos que ele tenha uma equipe de primeiríssima qualidade, para que ganhe apoio e seja referência para a sociedade, para o mundo empresarial. Esse processo de compor poder através de cargos a qualquer preço tirou credibilidade do Executivo. Pelo menos quatro ou cinco ministérios e instituições deveriam ter nomes exemplares: Fazenda, Banco Central, BNDES, Educação e Saúde. Espero uma equipe não com 40 ministros, talvez 15 ou 20.

Será possível compor um ministério com notáveis ou haverá loteamento político?

O governo terá de ter a presença de diversos partidos, mas tem de ser uma negociação de alto nível, que sinalize mudança na direção do País. Terá de ter um conteúdo liberal mais forte do que o governo atual, que tem propensão mais populista e intervencionista. Se nos ativermos ao favorecimento de pequenos grupos, privados ou de trabalhadores, e continuarmos nessa composição política de varejo, não vamos mudar. Ele tem pouco tempo para indicar que a direção é outra porque não está nascendo de um processo eleitoral, mas de um processo de impeachment com a popularidade dele próprio baixa, e muita descrença em relação ao partido que preside.

Quais medidas seriam prioritárias no primeiro momento?

Além da equipe, é importante vir no primeiro plano o problema da equação fiscal. Montar essa equação passa por medidas de curto e longo prazo, mas que devem ser anunciadas e, se for o caso, negociadas no Congresso desde já. No curto prazo, o primeiro esforço é uma revisão dos incentivos, subsídios e desonerações que foram dados e vêm minando a sustentabilidade fiscal. Em segundo lugar, é preciso enfrentar, talvez com nova legislação, o limite de endividamento ou do crescimento de despesas do governo. Se não for colocada uma trava no orçamento, não se sinalizará credibilidade para enfrentar a questão fiscal, que passa pela desvinculação de receitas, por desindexar a economia e pela Previdência.

Como isso pode ser feito?

Desde o final do governo anterior e em todo o governo Dilma se falou em reforma da Previdência, em limite de despesas, em desvinculação das receitas, mas nada de concreto foi colocado na pauta. Ficou uma discussão estéril a respeito de elevação de carga tributária, a volta da CPMF. Mais impostos não é o mais favorável para a retomada da economia. Outro aspecto do qual não podemos fugir é o dos Estados e municípios, que estão quebrados e sem condições de oferecer os serviços básicos de educação, saúde, segurança. É preciso uma repactuação que permita algum fôlego de curto prazo, mas com contrapartidas fortes, porque não podemos destruir o que foi construído em responsabilidade fiscal.

Que mais precisa de imediato?

Os balanços das empresas mostram que estão muito endividadas. O sistema financeiro está retraído e teremos de lidar com essa questão porque devemos evitar uma quebra em cadeia de grandes empresas e fornecedores. Talvez a credibilidade de um bom Banco Central possa coordenar esses movimentos, com o BNDES. Mas o fato é que temos uma situação difícil de grandes empresas, e não só aquelas envolvidas na Lava Jato. Isso é fruto de uma recessão de quase 10% acumulada no PIB dos últimos anos.

O governo deve atuar?

É sempre difícil, pois um intervencionismo dirigido promove escolhas ruins na maior parte das vezes. Mas estamos diante de uma emergência de crédito e é importante que o governo se inteire com o mercado financeiro. Talvez seja necessário alguma liberação de compulsórios para dar liquidez ao sistema e reduzir o risco para poder refinanciar parte das empresas. Mas precisa ter cuidado para não cair na cilada de escolhas específicas.

A agenda de curto prazo deve apresentar mais algum ponto?

Temos as concessões e a infraestrutura. Vivemos um problema de liquidez interna e há super oferta de recursos lá fora. Com bom planejamento, poderemos ativar essa roda e criar esse vetor de crescimento. E temos a agenda da produtividade. Precisamos de uma economia mais inserida internacionalmente, com menos proteções, para que se possa importar e exportar mais. Precisa começar a fazer alguma coisa, por exemplo, uma proposta de redução de alíquota de importação para os próximos quatro, cinco anos. Ao mesmo tempo, tem de buscar integração com Europa e EUA. Isso demora, mas são choques de produtividade na veia.

O que mais deveria ter a agenda de um governo Temer?

O cuidado com a população carente, alguma rede de proteção social, como Bolsa Família, pois vamos passar por um processo duro, com o desemprego talvez chegando a 13%. É obvio que precisamos também implantar reformas política e tributária, mas se temos dois anos e meio até uma nova eleição, o fundamental é dar um novo rumo e fazer essa transição com sabedoria.

E se o impeachment não passar, como fica o governo Dilma? É possível fazer um pacto como propôs a presidente?

Ficaremos numa situação muito mais difícil. Vejo pouca possibilidade de uma repactuação em torno de um novo governo da presidente Dilma. Falo isso com preocupação, pois tenho a impressão de que a crise pode piorar muito. E persistir no erro pode nos levar a uma situação mais grave por várias razões: falta de liderança, de equipe, de apoio do Congresso, empresarial e da sociedade.

Porque o sr. acha que a crise diminuiria com Temer?

Com nova direção, há uma série de temas que podem ser mais bem aproveitados, como aproveitar a liquidez lá fora. Temos uma inflação declinante que poderá, associada a um compromisso com as contas do governo, baixar as taxas de juros de forma sustentável. Uma taxa de juros declinante vai ter muita importância no déficit nominal. Temos condições de trabalhar o setor externo. São indutores de investimentos. Com a presença de capital externo para algumas concessões, acho que temos algumas avenidas pela frente.

Os empresários têm tido participação forte na defesa do impeachment. Qual foi o papel deles na construção da política econômica de Dilma que hoje criticam?

Como empresário, e há até pouco tempo como presidente do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial), sou bastante crítico em relação à atuação empresarial na formulação da política econômica. Há muitas organizações sólidas, mas para defender interesses setoriais. O resultado são medidas para atender demandas setoriais, mas que deixam de lado a visão de País. E aí o País piora, apesar do benefício fiscal. Os empresários precisam ter nesse momento de crise uma visão mais geral de País. Não adianta defender subsídio se a conta fiscal não fecha. Ou se a produtividade está caindo, defender barreiras à importação. Resolve o problema de curto prazo, até preserva alguns empregos, mas não se sustenta no médio prazo. A atuação empresarial deveria, há muito tempo, tentar resolver primeiro o problema do País, para depois resolver o do setor.

O sr. se sente representado pelo pato da Fiesp?

Acho que a representação empresarial deveria falar mais de macropolíticas e menos de símbolos de marketing. Todo mundo é contra imposto. Sinto falta de uma visão mais ampla de como endereçar as questões do País. Essas bandeiras pontuais me preocupam porque podem causar distorções. O problema do País não é a CPMF em si, é como se resolve o problema das contas fiscais. Será que não tinha de ter o pato da Previdência, o pato das despesas públicas, o pato da infraestrutura e das concessões? Há muitos patos que deveriam estar nessa lagoa. Quando fica uma coisa muito específica, não me sinto representado, acho que o pensamento tem de ser mais abrangente.

Muitos empresários apareceram nas investigações da Lava Jato. O capitalismo brasileiro é viciado em corrupção?

É. Tenho a impressão que o capitalismo brasileiro, por ser fechado, acaba induzindo a grupos de interesse com poder muito alto e influência. Inclusive em alguns setores com práticas corruptas nesse patrimonialismo todo que a gente vê como prática brasileira. O que pode oxigenar isso é maior transparência e competição. É uma pena reconhecer que há práticas tão bem estruturadas para a corrupção no País.

No seu cenário, quando a economia volta a crescer?

Depende da equação política, mas não tenho expectativa, mesmo com um novo governo, que ocorra uma reversão de curto prazo. A impressão é que 2017 ainda vai ser um ano difícil, deve ficar próximo de zero. Acho que temos elementos para acreditar que em 2018 começa a melhorar.

A Natura foi muito beneficiada no período de ascensão da classe C. Qual o tamanho do baque da classe C hoje?

Muita gente efetivamente conquistou uma posição e agora tem de retornar a uma situação anterior difícil. O que a gente sente no setor de consumo é uma frequência de compras muito menor e uma substituição por produtos de menor preço. Nitidamente aquela classe C perdeu vitalidade. Um patrimônio que fica para a sociedade é que, nesses anos, muita gente teve acesso à educação, há muitos novos universitários e espero que, com uma recuperação, mesmo que daqui a dois, três anos, se consiga retomar parcialmente essa perda que temos agora.

Com informações do Estadão Conteúdo.

SEM COMENTÁRIOS

DEIXE SEU COMENTÁRIO

Please enter your comment!
Digite seu nome aqui

Sair da versão mobile