quinta-feira, 21/11/2024
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Uma democracia em construção

Segundo a teoria da separação dos poderes (ou tripartição dos poderes do estado), desenvolvida por Montesquieu, no livro O Espírito das Leis (1748), o poder do Estado, num sistema democrático, pressupõe a partição entre os poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário, cada um desempenhando uma função, com competências diferentes, que, embora funcionando separados, autônomos, constituídos por pessoas e grupos diferentes, estão ligados entre si, um controlando o outro. No chamado “sistema de freios e contrapesos” (checks and balances), Montesquieu afirma: só o poder freia o poder.
No Brasil, a Constituição de 1988 consagrou o sistema Republicano e Democrático de governo. Nesses 21 anos, desde a sua promulgação, a democracia, como forma de governo, se tornou consensual e está consolidada. Isto não mais se discute. O que se pode e deve discutir são as práticas deste processo democrático. Somos um país sem tradição democrática, com uma democracia recente, e ainda não enraizada na população e que ainda carrega muitos elementos da nossa cultura patrimonialista, fisiológica onde os interesses pessoais se confundem com os interesses do Estado.
Nossas instituições são frágeis e não conseguiram ainda se consolidar nas suas funções. Isto oportuniza o aparecimento de diversos problemas que comprometem o real funcionamento do sistema. Exemplo: somente recentemente, após mais de duas décadas da promulgação da CF/88, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a competência do Ministério Público para instaurar inquéritos e realizar diligências investigatórias. Imaginem quantos processos estão parados, ou se já sentenciados serão reformados, em função dessa decisão.
Não existe democracia sem um sistema judiciário funcionando plenamente. No Brasil a aplicação da justiça é comprometida por uma legislação confusa, permissiva e desatualizada. Alguns julgamentos, dependendo de um bom advogado, duram décadas para chegar ao seu final. Não raras vezes prescrevem antes do julgamento, tais são os recursos permitidos por lei. Quer dizer: quem tem dinheiro para pagar um bom advogado dificilmente é condenado. Por outro lado, conforme constantemente divulgado pela imprensa, existem centenas de condenados, já com penas cumpridas e que ainda permanecem na cadeia por falta de assistência jurídica adequada. Não é por menos que popularmente se diz: aos amigos tudo, aos indiferentes o rigor da lei e aos inimigos a morte lenta e cruel.
O fato de termos cidadãos que, dependendo de sua capacidade econômica e poder, conseguem fazer com que um processo de homicídio, por exemplo, se arraste por décadas, levando à impunidade, abala muito um dos princípios fundamentais da democracia. É fundamental que tenhamos justiça, não só qualitativamente boa, correta, mas rápida. Pois quando ela não é rápida deixa de ser boa e justa.
O Poder Legislativo também é um poder fragilizado. O sistema de democracia representativa pressupõe partidos legalmente constituídos e com programas a ser defendido pelos seus representantes no Legislativo. Constata-se a existência de mais de 30 partidos. Alguns sem nenhuma expressão. Uma promiscuidade.
Dessa forma a representação proporcional, que serviria para garantir a representação de todos os setores de opinião no parlamento, o que seria o ideal de um sistema democrático, torna-se num instrumento de instabilidade do sistema de governo.
Para garantir uma maioria tendente a chancelar o seu programa de governo, o Executivo tende, via de regra, a comprar o apoio dos pequenos grupos com uma farta de distribuição de favores, mais ou menos corrupta. Exemplo: o direito de emendar as propostas orçamentárias do governo, conferida ao Legislativo pela Constituição Federal, por não ser o orçamento impositivo, virou moeda de troca. Quando o Executivo não veta, pelo critério de oportunidade e conveniência, libera os recursos das emendas somente dos parlamentares alinhados. Aos rebeldes, ou independentes, a aplicação do contingenciamento.
Constata-se um poder legislativo deteriorado, que não cumpre com seu verdadeiro papel, qual seja o de fiscalizar as ações do executivo.
Enfim, como dito acima, nossa democracia é consolidada, mas ainda é muito recente e traz dentro de si todos os ingredientes do nosso processo de formação colonial, de formação cultural. É uma democracia em construção.

Waldir Serafim é economista e professor universitário

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Parmenas Alt
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