A Corregedoria Geral da Justiça está implantando em Mato Grosso o projeto RecuperAÇÃO, que tem o objetivo de reduzir o índice de reincidência dos detentos do sistema prisional do Estado. Atualmente, a reincidência alcança o alarmante índice de 86,5%.
Com metas ousadas, o corregedor-geral da Justiça, desembargador Orlando de Almeida Perri, pretende alinhar conceitos e uniformizar procedimentos que serão adotados por magistrados vinculados à execução penal neste biênio 2007/2009. A iniciativa é inédita no Estado.
“Uma das principais metas da Corregedoria é trabalhar na melhoria do sistema prisional e esse projeto tem justamente essa finalidade. Queremos ressocializar os reeducandos e vamos desdobrar esse projeto em planos de ações para atingir as metas estabelecidas. O maior beneficiário de toda essa iniciativa, além do próprio detento, é a sociedade, pois cada reeducando recuperado significa um criminoso a menos nas ruas”, destaca o magistrado.
O coordenador do projeto RecuperAÇÃO, o juiz auxiliar da Corregedoria Luís Aparecido Bertolucci Júnior, assinala que o Tribunal de Justiça pretende reestruturar e fortalecer os Conselhos de Comunidade e Patronatos. O conselho é uma entidade de apoio ao reeducando, que acompanha o cumprimento da pena, faz visitas nas unidades prisionais, ajuda o egresso no retorno ao convívio em sociedade, dá apoio aos familiares etc. Uma das metas específicas é que todas as comarcas que possuam unidades prisionais tenham também um conselho até 30 de novembro deste ano.
Outras iniciativas da Corregedoria são fortalecer as instituições de assistência e de recuperação dos detentos, como a Associação de Proteção e Auxílio ao Condenado (APAC) e a Pastoral Carcerária; revitalizar os programas de assistência à família do reeducando e agentes penitenciários; e melhorar a política de atendimento aos reeducandos.
O juiz Luís Bertolucci Júnior explica que existem diversas causas para a ineficácia do sistema prisional mato-grossense, mas as principais são a individualização inadequada na fixação e execução da pena; elevado tempo de tramitação dos processos; falta de fiscalização adequada do cumprimento da pena e elevado estoque de processos.
No âmbito externo ao Judiciário – quando as ações são de competência do Poder Executivo – os problemas são ainda mais graves: inexistem políticas públicas voltadas à ressocialização dos detentos; faltam unidades prisionais (superlotação das existentes); as instalações existentes são precárias; faltam profissionais capacitados e em número suficiente, entre outros problemas.
“A sociedade somente se sentirá protegida quando os reeducandos forem recuperados. E todos os criminosos são recuperáveis”, afirma o magistrado. Para ele, a pena deve ser um meio eficaz na condução de metodologias atuantes no processo de recuperação, ressocialização e prevenção da criminalidade sem reincidência e sem violação dos direitos humanos. “O indivíduo é condenado e preso por imposição da sociedade, ao passo que recuperá-lo é um imperativo de ordem moral, do qual ninguém deve se escusar”.
Entre as metas específicas do projeto estão a capacitação de todos os magistrados e servidores das varas criminais até 30 de novembro próximo; o saneamento de 100% dos processos executivos de pena até 31 de março de 2008; gestões junto aos demais Poderes para a instalação de unidades prisionais para os regimes aberto e semi-aberto bem como o aumento de vagas para o regime fechado. O Poder Judiciário também está implantando medidas para reduzir em 20% do número de processos criminais até o dia 31 de dezembro de 2008.
As juízas Maria Erotides Kneip Macedo e Selma Rosane Santos Arruda, da 1ª e 6ª Varas Criminais de Várzea Grande, respectivamente, também participam do projeto. “Buscamos a verdadeira recuperação do condenado e também benefícios para a sociedade. Se você não trata na unidade prisional o homem que cometeu o crime, quando ele retornar ao convívio com a sociedade ele retorna ainda pior”, ressalta Selma. Já Maria Erotides, responsável pelo Tribunal do Júri da Comarca de Várzea Grande, acredita que neste biênio serão criadas políticas públicas para os condenados. “Vamos padronizar conceitos para começar a trabalhar com a revisão geral dos processos e também vamos acompanhar rigorosamente o cumprimento das penas”, garante a magistrada.
O planejamento estratégico da gestão 2007/2009 do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, pautado na tríade ‘transparência, efetividade e acessibilidade’ da Justiça, prevê a redução em pelo menos 30% do tempo de tramitação dos processos em 1ª Instância e a redução do estoque de processos em no mínimo 20%. Essa também é uma das metas do projeto RecuperAÇÃO.
SISTEMA PRISIONAL – De acordo com dados da Secretaria de Justiça e Segurança Pública referentes ao segundo semestre de 2006, Mato Grosso possui 8.089 reeducandos. Destes, 2.465 são condenados ao regime fechado, 4.647 presos provisórios (que aguardam júri popular ou que foram condenados por sentença penal recorrível), e 952 condenados ao regime aberto e 25 por medida de segurança (aqueles que praticam crimes e que, por serem portadores de doenças mentais, não podem ser considerados responsáveis por seus atos).
Contudo, há vagas para apenas 4.821 detentos nas unidades prisionais do Estado. Ou seja, o déficit no sistema prisional do Estado é de 3.268 vagas.
Ao todo, existem no Estado um centro de ressocialização (presos condenados e provisórios de baixa periculosidade e interesse pelo trabalho), duas casas do albergado (Cuiabá e Várzea Grande), cinco penitenciárias (duas em Cuiabá, uma em Rondonópolis, uma em Água Boa e uma em Sinop), uma colônia agrícola e 51 cadeias públicas.
O perfil do reeducando revela que a grande maioria possui entre 20 e 30 anos e ensino fundamental incompleto. Os delitos mais freqüentes são roubo, furto, homicídio e tráfico de entorpecentes.
Lígia Tiemi Saito