Enquanto estudava Administração na Fundação Getúlio Vargas em São Paulo, Thaís Junqueira já tinha certeza de que não trabalharia em um banco ou seria trainee de uma grande empresa. Seu plano era atuar na área social ou no governo. E bem cedo ela conseguiu não apenas concretizar o desejo, mas ser protagonista de um projeto audacioso para influenciar a educação do País. Aos 29 anos, lidera há seis a Fundação Estudar, que se orgulha de ter concedido 500 bolsas de estudo para jovens com alto potencial nas melhores universidades do Brasil e do mundo.
A organização sem fins lucrativos foi criada há 20 anos com o propósito de identificar talentos e oferecer a eles a oportunidade de estudar em uma universidade de ponta. Hoje, a instituição quer mais. “A grande contribuição da Estudar ao País é a de ajudar a mudar a mentalidade do jovem em relação a mérito”, afirma Thaís.
Para isso, trabalha desde 2005 na ampliação e replicação do modelo pensado originalmente para poucos. Em 2016, a organização espera influenciar de 150 mil a 200 mil pessoas, entre estudantes do ensino médio e superior. O desafio audacioso não assusta Thaís, que embora reconheça a urgência maior do problema da educação básica, defende o trabalho naqueles que já passaram por ela: “O País precisa de líderes melhores, mais capacitados, mais bem informados, mais preocupados em ser eficientes, meritocráticos e em disseminar bons valores. Nós estamos formando esses líderes”.
Ela própria, como líder, procura se cercar de especialistas, se manter atualizada para cumprir suas metas e comemora o fato de viver numa época em que nunca teve de enfrentar preconceito por idade, profissão e gênero. Ao iG, Thaís conta como optou pela área social e como usa suas características pessoais. Leia trechos do depoimento:
Opção pelo social
Desde muito cedo eu soube que queria fazer alguma coisa na área social ou no governo.
Dentro desse tipo de objetivo, muitas oportunidades me interessavam. Gosto da área cultural, de educação e esporte. Fui parar na FGV muito por conhecer o curso de Administração Pública de lá e saber que poderia me dar uma formação generalista. Ainda na faculdade, já estudava e pesquisava sobre o terceiro setor, cheguei a ficar em dúvida se eu queria ser jornalista, mas já tinha perfil de querer gerenciar. Na mesma época em que eu estava fazendo um treinamento na Folha (de S.Paulo), recebi um convite para trabalhar na Fundação Brava, instituição financiadora da Estudar, que investe em projetos de melhoria na gestão de governos e resolvi aceitar. Eu tinha um portfólio de projetos para cuidar ligados a cultura e educação e foi muito legal porque eu pude ver um pouco de tudo. Foi lá, depois de dar muito palpite, que resolveram me chamar para a Estudar. Acho que eles pensaram: “assim ela para de incomodar e trabalha”.
Administradora
Para os desafios que tenho e para função que exerço, acho melhor ser administradora que educadora. Ter uma visão generalista e uma capacidade gerencial são aspectos determinantes para o que fazemos. No fim, o que preciso é me cercar de especialistas e unir todas as pontas, garantir que a gente vai fazer tudo no prazo e com qualidade. De alguma maneira também tenho que ser a guardiã da visão do conselho (mantenedores da fundação).
O trabalho é bem gerencial, muito pouco específico, você tem que conhecer um pouco de tudo. E tem muito a ver comigo, que sempre tenho muito interesse no que está acontecendo, em gostar tanto de cultura e artes, em ler quatro jornais por dia.
Sem preconceitos
Nunca senti nenhum preconceito nem por não ser da área, nem por ser mulher, nem por ser jovem. Até porque hoje a gente vive num mundo de quem faz coisas. É um momento muito especial para o jovem, que nunca teve tanta oportunidade. Provavelmente, se tivesse feito isso há algumas décadas, em outras gerações, eu teria que ter tido uma formação super técnica, de mestrado e doutorado. Foi algo que acabei não buscando, eu sabia que tinha muita energia para fazer as coisas e menos condição e concentração de me aprofundar muito num assunto. Eu me especializei no universo das universidades, mas muito mais pela experiência prática.
Mulheres sensíveis
Mulheres são mais sensíveis e mais intuitivas e acho que isso faz muita diferença em qualquer negócio, mas na área social faz uma diferença ainda maior. Além disso, muitas não estão dispostas a pagar alguns preços que uma vida empresarial e puramente de negócios impõe.
Mesmo atuando na área social, eu faço um trabalho focado em performance, em medição de resultados, de escala, sou cobrada e remunerada por isso, mas tenho que ter um interesse e uma vontade de ter impacto na vida das pessoas. Numa grande empresa, se você precisa demitir 300 pessoas num mesmo dia, você tem que demitir as 300 pessoas. Tem algumas decisões que são inerentes à vida empresarial, mas nessa área você consegue ter um ambiente mais arejado e menos sujeito a isso.
Contribuição da Estudar
Em números absolutos, a contribuição é pequena para um País do tamanho do nosso. Só que em valores, em mentalidade e em mostrar para o jovem que é possível é uma contribuição inestimável, é colossal. O ganho da Estudar está em formar pessoas do padrão que formou nesses 20 anos e que são multiplicadoras. Ajudamos a virar a chave do Brasil e do jovem para um modelo meritocrático, um modelo no qual você ter garra, correr atrás, valorizar os apoios que recebeu e dar isso de volta é o que tem valor.
Agora, entramos numa fase estimulante que é de poder disseminar esses valores em larga escala. A Estudar quer cuidar da carreira e dos passos daqueles que já passaram e já venceram as adversidades da educação básica e chegaram à universidade. Num País que tem tantas causas imediatas essa poderia ficar em segundo plano, mas é da maior importância. Essas pessoas que vão estar à frente das empresas, do País e produzindo na academia.
Metas
Nossa meta é ser altamente reconhecido pelo público de ensino médio, universitário e de jovens profissionais do Brasil. Queremos também ter o processo de seleção e a premiação mais desejados do Brasil para esses jovens. Tudo isso em 2016.
Em números absolutos, a nossa comunidade de pessoas diretamente atingidas por bolsas não deve crescer muito. Hoje são 520, em 2016 deve chegar em 800. Esses são os que dão exemplo para os outros. Mas os indiretamente atingidos devem chegar a 150 mil a 200 mil, através de programas de treinamento, palestras, interação nas redes sociais, programas de workshop no Brasil inteiro, financiamento estudantil. É a expansão e a replicação do nosso modelo para uma base mais ampla de jovens.
Tatiana Klix, iG São Paulo