Desde que os veículos começaram a rodar nas estradas, o combustível que eles usam evoluiu bastante. Com a crise do petróleo, surge o álcool. Depois vêm as energias alternativas: gás, eletricidade, solar, hidrogênio. Mas o que vingou mesmo foi a gasolina e o álcool. Hoje, com o preço que eles alcançam na bomba do posto, que tal uma tecnologia para baratear a produção? O professor Adelson Joel da Silva, do Departamento de Biologia e Zoologia da UFMT, junto com seus alunos do curso de Zootecnia, planeja criar essa tecnologia.
Para entender, vamos do começo. Sabe como é produzido o etanol que movimenta os carros? A base para esse processo é a cana-de-açúcar. A mesma planta que movimentou a economia no nordeste por tantos anos hoje movimenta os veículos nas cidades. Quando chega à usina, a cana é moída, e daí saem o caldo e o bagaço. Os dois são ricos em açúcar, que é essencial para o processo. No caldo, que também é chamado de melado, eles colocam fermento, que na verdade são fungos microscópicos. Esses fungos liberam enzimas, substâncias que vão desmontando o açúcar e rearranjando as moléculas como álcool. Depois, é só separar esse álcool.
Até então, os cientistas achavam que essas enzimas produzidas pelos fungos trabalhavam separadas. Ou seja, um tipo de enzima quebrava um pedaço do açúcar, depois vinha outro tipo e quebrava outro pedaço, e assim sucessivamente. Mas em 2012, enquanto fazia doutorado na Universidade de Brasília [UnB], Adelson descobriu que não era bem assim que as coisas funcionavam.
Na verdade, esses vários tipos de enzimas se juntavam e faziam um complexo, que se concentrava em cima do açúcar. E quando se usa esse complexo, tudo acontece mais rápido do que quando as enzimas trabalham sozinhas.
E é nesses complexos que se baseia o trabalho de sua equipe. Quando paramos para pensar, quem faz o trabalho mesmo são as enzimas, e não os fungos. Então, se os complexos enzimáticos puderem ser produzidos artificialmente, as usinas não vão precisar dos fungos – que não são exatamente baratos.
Além disso, se pudermos pular a parte em que os fungos estão na história, temos outras vantagens. “Podemos aquecer mais a mistura, sem nos preocuparmos em matar os fungos, e isso vai deixar o processo ainda mais rápido”, comenta o professor. E os complexos não servem só para a cana-de-açúcar. Segundo conta Adelson, deve ser possível também identificar e sintetizar complexos enzimáticos para outras plantas ou, basicamente, qualquer organismo.
Voltando para a questão do combustível, além de desenvolver essas ‘micromáquinas’, o pesquisador também usa o bagaço da cana que, segundo ele, também tem um alto potencial de produção de etanol, assim como o caldo.
Atualmente, a equipe está identificando quais são os complexos multienzimáticos, como eles trabalham e como se formam. Depois de conseguir sintetizar esses complexos, eles pretendem patentear a tecnologia e oferecer para a indústria.
Parceria e sacrifício
O professor Adelson está só há um ano na UFMT, mas já conseguiu reunir alguns alunos para suas pesquisas. Como ainda não conseguiu montar um laboratório, e alguns dos equipamentos que ele precisa não estão disponíveis em Mato Grosso, ele trabalha em parceria com a UnB.
Na capital federal, eles cultivam fungos, coletam e analisam as enzimas. Izabelly Pacheco é uma das bolsistas do projeto, e conta que apesar de ser muito boa essa parceria com outra universidade, também não é fácil. A bolsa da pesquisa tem que ir toda para compra de passagens, e de vez em quando ainda precisa de uma força da família. Os contatos de Adelson ajudam na hospedagem, e assim eles vão dando um jeito, enquanto o financiamento não cobrir os custos ou a compra de equipamentos para Cuiabá.
Até agora, as bolsistas fizeram duas viagens, ficando 45 dias em uma e 15 na outra. Esse tempo todo é necessário porque os fungos demoram a crescer, e os processos e análises são demorados. Mas para Izabelly, todo o tempo investido e alguns sacrifícios valem a pena. “Eu não aprenderia tudo isso só na minha graduação [Zootecnia], e esse projeto nos traz uma autonomia. É muito conhecimento. Eu fiquei apaixonada pela pesquisa”.
Apesar de produtiva, a parceria com a UnB e a ajuda dos alunos de graduação na pesquisa também são desafiadoras. Segundo o professor Adelson, os alunos aprendem muito, mas ao mesmo tempo eles não têm certas experiências ou habilidades, e cabe ao professor essa função de ensino. Uma forma que eles encontraram para superar isso foi a realização de seminários mensais. Os alunos apresentam, para o resto do grupo, um pedaço da pesquisa, alguma informação ou conhecimento importante. Assim eles pesquisam, ensinam, aprendem e, de quebra, já praticam para falar em público, o que vai ser muito importante quando forem divulgar os resultados.
Junto com o trabalho dos complexos enzimáticos, Adelson também começou a pesquisar o uso de peçonha do escorpião e compostos vegetais no combate ao câncer de mama, e adianta que os resultados podem trazer benefícios também para o agronegócio. Junto com a professora Rosina Miyazaki, da Comissão de Controle da Dengue, ele planeja estudar a leishmaniose e montar um grande laboratório para abrigar as pesquisas.
O professor Adelson, seus alunos e os estudos desenvolvidos pela equipe vão para a telinha: hoje, 1º de abril, às 18h30, no programa Repórter MT da TV Universidade [Canal 02 – rede aberta].
Mais pesquisas você pode conferir no canal da UFMT.Ciência no Youtube. http://www.revistafapematciencia.org/noticias/noticia.asp?id=707