quinta-feira, 07/11/2024
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Técnico da Croácia vê Brasil sob pressão e descarta retranca

Aos 42 anos, Niko Kovac é o segundo técnico mais jovem na Copa do Mundo – Sabri Lamouchi, da Costa do Marfim, é apenas um mês mais novo – e o menos experiente de todos. Tem apenas 10 jogos em sua carreira como treinador: cinco à frente da Croácia sub-21 e outras cinco com a seleção principal. Ainda não perdeu uma partida.

E seu primeiro jogo da Copa do Mundo será justamente contra o Brasil, anfitrião do torneio e maior vencedor da história dos Mundiais. O desafio, porém, não intimida Kovac, que conta com a pressão sobre os donos da casa para surpreender na estreia.

“Este jogo é um grande desafio para nós, assim como um grande prazer abrir a Copa do Mundo com todo o planeta assistindo. O Brasil é extremamente favorito. Espero que eles ganhem o torneio. Mas eles também estão enfrentando um peso inimaginável vindo da torcida. Sim, todos eles jogam em grandes clubes, mas a pressão não pode ser comparada a essa. Se temos que enfrentar o Brasil, então eu acho que o melhor para nós é que seja no primeiro jogo”.

Em que se baseiam as esperanças da Croácia? “Em alguns aspectos, o Brasil não é mais forte que nós. Nós teremos uma resposta para o seu jogo”, respondeu lentamente e em voz baixa. “Temos que neutralizar a pressão inicial e levar o jogo para a direção que nos convém. A Croácia nunca estacionou o ônibus [dentro da área, jogou na retranca] contra ninguém e não começará a fazer isso agora. Pelo menos é o que eu espero, porque as coisas nem sempre saem do jeito que você quer, não importa o quão bom seja o seu plano”.

Kovac foi entrevistado na nova sede da Federação Croata de Futebol (HNS), no 11º andar do Double Tree de Zagreb, um luxuoso hotel da rede Hilton, uma semana antes da Croácia enfrentar o anfitrião Brasil no jogo de abertura da Copa do Mundo. O complexo está localizado em uma emergente zona comercial em Zagreb – a “Cidade”, como alguns meios de comunicação locais gostam de chama-lo. Na realidade, são apenas alguns prédios de vidro brilhante e aço erguidos no lugar de ex-armazéns em ruínas e casas de operários.

A HNS adquiriu recentemente um grande espaço comercial por aproximadamente 2 milhões de euros. Tudo parece novo e há uma sensação de recomeço. Foi Davor Sucker, lenda da Copa do Mundo de 1998 e agora presidente da federação, quem disse que sua missão é a de finalmente levar o futebol croata ao século XXI.

“É como você querer dirigir a 200 km/h em uma autoestrada, mas seu carro só pode chegar a 150”, continuou Kovac, nascido e criado em Berlim. “O que você vai fazer? Você vai turbinar seu carro e tentar ajustá-lo para que possa ir mais rápido, ou irá comprar um novo. Você precisa deixar seus jogadores em ótima forma após uma longa e exaustiva temporada – e para fazer isso, tem que entender que cada pessoa é única”.

Kovac assumiu em outubro passado, substituindo o impopular Igor Stimac pouco antes da reta final das eliminatórias da Copa do Mundo. Em dezembro, após ter passado com sucesso de um confronto decisivo com a Islândia, ele fez todos os candidatos ao time passarem por uma série de exames médicos e deu a cada um deles um programa de treinamento individual. Eles deveriam fazer este trabalho adicional em seus clubes e então, após o fim da temporada, passaram novamente por exames e novos programas de treinamento foram criados.

Os métodos do técnico têm levantado algumas sobrancelhas na Croácia, onde as coisas sempre foram feitas de uma maneira mais tradicional. O que particularmente chamou a atenção é seu estafe que inclui professores universitários, analistas de vídeo profissionais e especialistas em tecnologia, alguns deles do exterior.

“Sou um firme seguidor da ciência. Se pesquisas podem nos ajudar a descobrir a cura de doenças, é certo que podem melhorar um time de futebol. Seja uma análise de dados ou biomecânica, pode lhe dar uma vantagem.

Mas ao insistir em abordagens individuais de treinamento, Kovac segue a escola de pensamento que está ganhando mais e mais apoio no futebol. Ele assume a ideia de “treinamento diferencial” desenvolvida pelo professor Wolfgang Schollhorn, da Universidade de Mainz, que já trabalhou com nomes como Jürgen Klopp e o técnico do Mainz, Thomazs Tuchel.

Ele então passou a revelar sua filosofia de treinamento. “Eu prefiro a formação 4-2-3-1, mas tenho minhas próprias interpretações. A coisa mais importante é ter jogadores que possam jogar de várias maneiras. Temos jogadores que querem a bola e a posse é importante para nós, mas mudanças, recuperando a bola e com pressão do contra-ataque, podem ser cruciais. Não preciso de jogadores que não possam acompanhar a volta [para a defesa] e certamente não estou interessado em especialistas”.

Esta sequência de pensamento o levou a usar pelo menos três armadores. No último jogo oficial da Croácia em uma competição, contra a Irlanda em Zagreb, Luka Modric e Ivan Rakitic jogaram mais recuados, com a estrela ascendente Mateo Kovacic à frente deles. O robusto e experiente Ognjen Vukojevic foi o único especialista na marcação entre os muitos meio-campistas que Kovac chamou inicialmente para seu elenco preliminar de 30 jogadores. Ele fez o corte final, mas isso não significa certeza de jogar.

“As linhas de jogadores precisam evoluir constantemente, mesmo dentro do mesmo sistema”, explicou Kovac. “Equipes geralmente tem dois marcadores e um camisa 10 clássico. Agora talvez um meio-campista possa ser essencialmente um marcador, mas o mais importante é ter jogadores que sejam bons em construir jogadas pelo meio. Eu gostaria de jogar sem um marcador, mas você também tem que levar em consideração o tipo de adversário que está enfrentando”.

E como será contra o Brasil? Pode a Croácia realmente atuar com todos os três armadores contra os anfitriões? “Estamos indo e voltando várias vezes neste assunto. Vamos ver”, disse ele, com um sorriso que pareceu sincero, ao invés de misterioso.

Luka Modric e Ivan Rakitic tiveram uma temporada fantástica e o desempenho da Croácia depende muito se a dupla pode estar afinada para a Copa do Mundo. Por outro lado, Mario Mandzukic estará ausente do jogo contra o Brasil por cumprir suspensão de um cartão vermelho e é um sério desfalque para Kovac. De qualquer forma, ele prefere focar na equipe, não no individual. “Sempre penso no plural. Claro que um jogador como Modric é um tesouro para qualquer time, mas a união é a chave para o sucesso, não só no futebol, mas na vida”.

Embora ele nunca fale sobre as chances da Croácia ir mais longe que a fase de grupos, Kovac prontamente elenca seus favoritos para ganhar o título. Após o Brasil, ele lista a Argentina, depois a Espanha e seu país natal Alemanha. Sobre a Inglaterra, ele para pensar antes de responder. “A Inglaterra é sempre boa, mas eu acho que às vezes esperamos muito deles. Acredito que possam passar da fase de grupos e talvez ir um passo além. Não acredito que eles possam alcançar as últimas fases”.

Outro assunto que Kovac está sempre pronto para falar é sobre sua dupla identidade cultural. Ele diz, no entanto, que sua mentalidade é “mais alemã que croata”, o que significa que acredita “mais na razão que na emoção” para tomar suas decisões. Talvez seja o tipo de salto que o futebol croata precisa como um todo para seguir adiante, como deseja o presidente Suker?

“Nós, os croatas, temos nossa própria identidade e características que precisamos que manter”, disse Kovac. “Mas nós também precisamos mudar e ser mais abertos para aprender com os outros – não copiá-los, mas adaptar suas boas ideias para nossa mentalidade. Não fazer isso é inaceitável e impede o progresso. Estes são os valores que aderi para minha vida e que quero passar adiante. Quero ser autêntico – e quero que me time também seja assim”.

Aleksandar Holiga
Do UOL, em Zagreb (Croácia)

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