Um grupo de pesquisadores que estuda a narcolepsia, doença que faz as pessoas adormecerem subitamente, está transformando o conhecimento que produziu em uma nova maneira de ajudar outro grupo de pessoas: os insones.
Em estudo publicado ontem no site da revista “Nature Medicine” (www.nature.com/ nm), cientistas de um laboratório suíço relatam como conseguiram reverter o problema ao bloquear a ação de uma molécula chamada orexina no cérebro de animais e pessoas.
Essa substância é importante para manter o estado de vigília e é uma molécula ausente no cérebro dos narcolépticos. Por isso o portadores dessa doença não conseguem dormir e acordar em ciclos normais. É um mal que afeta uma em cada 2.200 pessoas, aproximadamente, de acordo com um levantamento feito nos EUA.
A equipe que publicou o estudo, liderada por François Jenck, do laboratório suíço Actelion, conseguiu produzir uma droga antiinsônia que imita a ação da orexina em pacientes de narcolepsia.
O medicamento foi testado em roedores e cães, e testes clínicos já foram feitos em humanos para determinar a segurança e a eficácia da droga, afirma Roland Haelfi, assessor de relações públicas da Actelion. Estudos estão sendo feitos agora para avaliar a dosagem ideal para o medicamento.
Os pesquisadores afirmam que até o fim deste ano devem conseguir iniciar um ensaio clínico de fase 3 –uma avaliação mais detalhada da ação da droga-, que permitiria ao laboratório pedir licença para começar a vendê-la. Os cientistas preferem não especular sobre quando a droga pode chegar ao mercado, mas estudos de fase 3 costumam levar alguns anos.
Músculos desligados
Pacientes narcolépticos às vezes são vítimas também de ataques de cataplexia, surtos nos quais o paciente perde a força dos músculos por alguns poucos segundos ou minutos.
Uma droga que manipula a orexina, em princípio, poderia trazer o risco de submeter pessoas a essa experiência, mas Jenck afirma que o problema não apareceu durante os testes.
Thomas Scammell, professor de neurologia da Universidade Harvard, diz que, com cautela, o trabalho de Jenck pode ser classificado como “promissor”. “Acho que pode ser o começo de algo bastante entusiasmante”, disse o cientista, que não tem ligação com o grupo suíço.
Segundo ele, a droga funciona de maneira diferente de outros medicamentos contra insônia, mas os testes com animais e humanos já mostraram que ela pode ter ação ampla.
Scammell afirma que uma droga como essa, caso se mostre mesmo segura, pode ser uma alternativa para pessoas que não se adaptam a remédios para dormir mais convencionais. A preocupação é saber se a droga pode causar problemas semelhantes à narcolepsia nos usuários.
“Estudos seguidos a este serão importantes para ter certeza de que a qualidade de sono é boa”, diz. A cataplexia é difícil de estudar em laboratório, porque em geral é causada por emoções intensas.
Outro cientista independente do grupo suíço, Luís de Lecea, da Universidade Stanford, também considera a pesquisa promissora. “Este novo composto pode originar uma nova família de remédios contra insônia”, disse.
A vantagem de atacar a orexina, segundo ele, é que ela é uma substância presente em um número menor de neurônios. Por isso, a droga teria uma ação mais específica, em relação a outros medicamentos usados hoje.
Lecea alerta para o fato, porém, de que os estudos realizados até agora ainda não é possível atestar a qualidade do sono experimentada pelas pessoas que tomaram a droga.
FO