O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a Ficha Limpa vale para as eleições de 2010. Após um empate de cinco a cinco, a maioria dos ministros decidiu aplicar um dispositivo do regimento interno da Corte para solucionar a questão. Ele prevê que, em casos de impasse, vale a decisão anterior. No caso específico, a do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que foi favorável à aplicação da lei.
Os ministros chegaram à decisão após analisar um recurso apresentado pelo deputado Jader Barbalho (PMDB-PA), que tentava reverter decisão do TSE que o tornou inelegível por ter renunciado a um mandato no Senado para evitar um processo de cassação – o que é proibido pela nova lei.
Foram favoráveis à aplicação do dispositivo que acabou com o impasse os ministros Carlos Ayres Britto, Cezar Peluso, Joaquim Barbosa, Celso de Mello, Ellen Gracie, Cármem Lúcia e Ricardo Lewandowski.
Dias Toffoli e Marco Aurélio Mello e Gilmar Mendes, que ficaram vencidos na questão, criticaram a decisão e disseram que, apesar do julgamento desta quarta-feira, novos problemas podem atravessar o caminho da Lei da Ficha Limpa.
Entre eles há o fato de que, quando o 11º ministro, que vai ocupar a cadeira de Eros Grau, for empossado, pode-se mudar o entendimento da lei. “Pode haver uma decisão diametralmente oposto”, disse Mendes, alegando que a Ficha Limpa que vale hoje poderia ser derrubada pelo novo ministro.
O presidente da Corte, Peluso, também demonstrou essa preocupação e disse que a decisão desta quarta foi artificial. “Qualquer solução é artificial. E é simplesmente pelo fato óbvio que não há maioria que decidiu. (…) Tenho pra mim também que é grave, me preocupou com o risco forte de futuras decisões contraditórias”.
Além disso, novos questionamentos sobre a lei devem ser analisados pelo STF. Tanto em casos de renúncia ao mandato para evitar processos de cassação – como o de Jader – ou os de Paulo Maluf (PP-SP), que foi considerado inelegível por uma condenação por órgão colegiado, e de Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), quem foi considerado inelegível devido a uma multa por “conduta vedada” a agente público.
Julgamento
No início do julgamento, o ministro Joaquim Barbosa, relator do recurso de Jader Barbalho, manifestou-se pela manutenção da decisão da Justiça Eleitoral, que barrou a candidatura do político ao Senado.
De acordo com ele, a lei deve ser aplicada nestas eleições, uma vez que, mesmo existindo há menos de um ano, ela não altera o processo eleitoral e é linear, afetando a todos os candidatos de maneira equilibrada.
Em seu voto, Barbosa disse que a renúncia para escapar de um processo de cassação, o que é vedado pela Ficha Limpa, ficou caracterizada no caso de Jader que, segundo ele, estaria preocupado mais com a “carreira” política que com a representatividade de seu cargo.
“A renúncia é ato que desabona o mandato, a preocupação [de Jader] é com a própria carreira política e com os possíveis mandatos futuros, ato de quem não se preocupa com sua biografia. Preocupa-se apenas com a chance de ser novamente eleito e fazer uso das prerrogativas e benefícios da condição parlamentar”.
Depois de Barbosa, Marco Aurélio Mello e Dias Toffoli proferiram seus votos. Contrários à aplicação imediata, alegaram que a Lei está agindo de maneira retroativa para prejudicar possíveis candidatos.
Em votos curtos, informando que entregariam por escrito as justificativas, votaram a favor da Lei da Ficha Limpa os ministros Carlos Ayres Britto, Ricardo Lewandowski e Cármem Lúcia. Os três mantiveram as posições apresentadas no julgamento de Roriz no STF.
Após o grupo, o ministro Gilmar Mendes proferiu seu voto. Taxou a lei de casuística e disse que ela flerta com o nazi-facismo. Destacou ainda que um dos relatores da matéria no Congresso, deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP), formulou uma alínea, justamente a que torna inelegível quem renuncia ao mandato para evitar processos de cassação, para atingir o ex-governador do Distrito Federal, Joaquim Roriz (PSC), que disputaria eleições com o PT em Brasília.
Num discurso duro, por vezes aumentando o volume de sua voz, Gilmar disse que, ao aceitar a Ficha Limpa, uma carta branca seria dada ao Congresso, que, a depender “da imaginação, que é livre”, poderia se criar um “salão de horrores”.
“Dificilmente vai se encontrar caso de mais escancarada e escarrada retroatividade. E mais grave que lei é o convite para a irresponsabilidade do legislador e manipulação das eleições (…) Essa é uma Lei casuística para ganhar eleição no tapetão. Covardia que faz a maioria contra a minoria (…) Pode-se avançar para quem tiver um inquérito contra si ficar inelegível, não há freios para isso”.
Após o voto de Gilmar foi a vez de Ellen Gracie. Ela disse que não mudaria sua posição em relação ao último julgamento, e optou pela aplicação imediata da lei. Depois dela, o ministro Celso de Mello proferiu seu voto, contrário à Ficha Limpa, o mesmo fez Cezar Peluso, deixando o placar em cinco a cinco.