Existe remédio para quase tudo, graças ao progresso das ciências farmacêuticas e da medicina. Mas para que um remédio se torne um veneno basta exagerar na dose. Segundo dados do Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas (Sinitox), o uso de medicamentos é a segunda maior causa de intoxicação no Brasil. Em quase 22 mil casos observados em 2005, pelo menos sete mil correspondem a intoxicações acidentais ou de consumo abusivo. Alguns foram fatais.
Segundo o Sistema Único de Saúde (SUS), em média, 2.500 pessoas são atendidas, anualmente, com intoxicação medicamentosa, o que representa um gasto de R$ 500 mil.
O designer Bruno Harnik, de 21 anos, tratou as crises de amidalite durante anos com uma combinação de anti-inflamatórios e
antibióticos. Como o problema era recorrente, ele continuou tomando os remédios em outras oportunidades. As bactérias que causavam a infecção desenvolveram
resistência aos medicamentos. “A crise voltou pior. Fui ao médico e tive que tomar um remédio mais forte”, lembra.
“Quando se toma um antibiótico por conta própria, você corre o risco de não só não matar o agente da enfermidade como também matar bactérias fundamentais para o corpo”, esclarece Andressa Salvador, farmacêutica especializada em pesquisa clínica. A farmacêutica Célia Chaves, representante da Federação dos Farmacêuticos no Comitê Nacional para Promoção do Uso Racional de Medicamentos, diz que muitos tomam remédios preventivamente, o que também é errado. “Quem tem fortes enxaquecas diariamente, às vezes, ingere medicamentos antes da dor aparecer. A dor é um sintoma de uma doença, por isso, é preciso investigar a causa”, aconselha.
Autor de pesquisas sobre a ação de remédios e professor de farmacologia da Universidade de Campinas (Unicamp), o médico Gilberto De Nucci lamenta a automedicação: “No Brasil é mais grave, porque se tem acesso a remédios controlados (de tarjas preta e vermelha) sem a prescrição médica”.
Ele esclarece, ainda, que: “Mesmo os medicamentos de venda livre ou fitoterápicos (à base de ervas) podem causar efeitos indesejados.” E conta que a cura de muitos males pode estar na mente do paciente, pois, conforme observou em anos de pesquisa, em cerca de 70% dos remédios não há evidência científica de que funcionem. “Muitas vezes, o que cura é a bula”, completa.
Medicamentos X Intoxicações
O uso de medicamentos é a segunda maior causa de intoxicações no Brasil. Só perde para animais peçonhentos (escorpiões, cobras, aranhas).
Antigripais, antidepressivos e anti-inflamatórios são campeões de intoxicações.
Entre as intoxicações por medicamentos, a maioria envolve crianças de até 5 anos, seguidas por adultos de 20 a 29 anos.
Situações envolvendo uso indevido de remédios
Má administração ou acidente individual: 9.697 casos.
Prescrição médica inadequada: 1.854 casos.
Problemas no lote do medicamento: 115 casos.
Fonte: Dados do Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas
(Sinitox), 2005, com base em 21.926 casos analisados
Por Marilia Melhado/F.U