Chegando numa delegacia para anunciar um roubo, engoli a amarga sinceridade de um policial civil. Responsável por digitar o (quase que inútil) boletim de ocorrência, o policial demonstrou muito mais preocupação em explicar que ele não poderia ajudar do que entender em detalhes a ocorrência.
Ele teve pressa em ouvir o relato. Ao frisar que também foi furtado um produto que custava cerca de R$ 100, ele tratou logo de resumir: “Então roubaram um notebook, som automotivo e alguns pertences pessoais”. Entendi que R$ 100 não era muita coisa para a polícia. Para quem espera receber o salário todo mês é.
Nessa hora, eu já havia adivinhado as frases que ouviria a seguir. Numa análise feita pelo próprio policial, apenas 5% de todos os roubos e assaltos praticados são investigados. O BO serve apenas para preencher as estatísticas. Repito aqui o que eu ouvi do próprio policial.
Veio o sentimento de tristeza por ter esforçado e suado tanto para gerar alguma grana a um ladrão. Essa sensação sofreu mutação e virou constatação. Nada será feito e o prejuízo de cerca de três mil reais vai latejar na minha mente e no meu bolso durante um bom tempo.
Diante do furto, verdadeiro prejuízo psicológico e material, a sensação que tive, e que reflete a sensação de milhares de vítimas da bandidagem, não causa indignação suficiente. Acabamos por nos tornar coniventes com os atos de violência diante da polícia.
Ao nos roubarem, por um momento nos apagam o orgulho de ter trabalhado desesperadamente. Tiraram o resumo do meu suor num bairro que sente saudades de João Arcanjo Ribeiro. E ninguém pode me olhar torto por ter me lembrado de quando ele morava no bairro Boa Esperança. Os moradores comentam que o número de furtos e assaltos era mínimo quando João Arcanjo circulava pela região. Em relação a outros bairros, os noticiários mostram que a violência só tem aumentado. Triste realidade. Não há lugar seguro para fugir.
Aonde vamos parar? Acho que todo cidadão de bem procura essa resposta todos os dias, numa busca constante por um retorno positivo. Só que apenas perguntando, nos incluímos na turma do deixa quieto.
Simone Alves
Jornalista em Cuiabá e mais uma vítima da violência