No dia em que o Conselho de Ética da Câmara abriu processos contra 67 deputados acusados de envolvimento na máfia dos sanguessugas e um grupo de parlamentares deflagrou movimento pelo voto aberto no plenário nas sessões de cassação, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), patrocinou uma manobra regimental que dá sobrevida aos três senadores citados no esquema das ambulâncias superfaturadas e até pode facilitar sua renúncia. Renan enviou ao Conselho de Ética do Senado uma “denúncia” contra os senadores Ney Suassuna (PMDB-PB), Magno Malta (PL-ES) e Serys Slhessarenko (PT-MT), e não uma “representação” contra eles.
Com esse artifício, os três senadores ganharam, no mínimo, um mês a mais para decidir se renunciam a seus mandatos e, assim, se livram do risco de cassação. Renan adotou essa interpretação protelatória dez dias depois de ter prometido que iria “acelerar” o processo contra os parlamentares acusados.
Por causa dessa manobra, o primeiro passo do Conselho de Ética do Senado será fazer um trabalho que a CPI dos Sanguessugas já fez, que é investigar a denúncia. Em relatório parcial apresentado no dia 10, a CPI já concluiu pelo envolvimento de 69 deputados e dos 3 senadores na máfia das ambulâncias – todos acusados de apresentar, mediante recebimento de propina, emendas ao Orçamento da União destinando recursos para municípios comprarem os veículos superfaturados vendidos pela Planam, empresa que supostamente liderava o esquema. Segundo estimativa da Polícia Federal, que desmontou o esquema e prendeu 47 pessoas em maio durante a Operação Sanguessuga, o desvio de recursos chega a R$ 110 milhões.
Se o Conselho de Ética do Senado chegar à mesma conclusão da CPI – de que houve envolvimento dos três senadores na máfia dos sanguessugas -, enviará então parecer à Mesa Diretora, a quem caberá decidir se abre ou não processo. Só depois dessa avaliação é que as ações serão abertas – provavelmente depois das eleições.
Para justificar sua decisão, Renan afirmou que o Senado “não é um tribunal de exceção” e os três acusados têm o direito a ampla defesa. “Demonstrei isenção em todos os momentos do processo. Lugar de ouvir defesa dos senadores é no conselho.”
“É uma manobra protelatória. Não tem cabimento o conselho fazer uma investigação preliminar sobre algo que já veio apurado da CPI e da Polícia Federal”, reagiu Jefferson Péres (PDT-AM), que relatará o caso de Suassuna. Demóstenes Torres (PFL-GO), relator do caso de Serys, também ficou indignado: “Eles enganaram a gente. Vou devolver imediatamente para a Mesa, dizendo que há indícios para abertura de processo. Caso contrário, estaremos fazendo papel de palhaços.” Sibá Machado (PT-AC), relator do caso de Magno Malta, foi o único que considerou normal o procedimento.
“Se alguém pensa em realizar manobra vai se desmoralizar perante a opinião pública”, avisou o presidente da CPI, deputado Antonio Carlos Biscaia (PT-RJ).