Não se perde mais do que alguns minutos. Com uma busca na internet e alguns erros e acertos, é possível encontrar diversos sites vendendo, impunemente, remédios tarja preta, que oficialmente só são comercializados com receita médica especial.
Os medicamentos oferecidos, como anorexígenos e antidepressivos, são perigosos e têm fortes efeitos colaterais. Há ainda anabolizantes que não têm sequer registro no Ministério da Saúde (entenda a função de cada um no quadro abaixo). Além de crime, a prática preocupa as autoridades de saúde. Na busca por soluções milagrosas para um corpo perfeito ou na tentativa de sanar problemas emocionais, muitas pessoas desconsideram os riscos para a própria saúde. Para Cíntia Cercato, endocrinologista do Hospital das Clínicas, em São Paulo, “a auto-medicação exclui as particularidades orgânicas que cada pessoa tem para receber um medicamento. O resultado são complicações ainda maiores”.
A facilidade na compra de medicamentos pela internet é proporcional aos perigos. Além do mais grave – a falta de acompanhamento – não há garantia de que os remédios não sejam falsificados ou adulterados. O único cartão de visitas dos vendedores são os depoimentos, um tanto duvidosos, de pessoas que já utilizaram o serviço. A maior parte dos vendedores alega que os produtos são conseguidos nas fábricas e distribuidoras. “Tenho contatos nessas empresas, que facilitam o meu trabalho. Vendo produtos de maneira ilegal, mas não falsificados”, garante Willian, do site “worldshopp”.
Tampouco há certeza de que o remédio será entregue. Os interessados têm que depositar o dinheiro na conta dos vendedores, enviar um e-mail de confirmação e esperar pelo produto. No site “fiquelindahoje“ há a possibilidade de se fazer uma “doação” com o valor do remédio por meio de um site em que não é preciso se identificar. O esquema serve para evitar registro em conta bancária, o que pode ser usado como prova pela polícia. Na página, há até imitações de selos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e da Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon).
Outros sites preferem copiar modelos de portais de compra pela internet reconhecidos, como é o caso do “Bomberfarma”, que vende anabolizantes. “O uso desses remédios para fins estéticos se tornou tão freqüente que muitos esquecem que eles possuem uso terapêutico”, diz Paulo Zogaib, professor de Fisiologia do
Esporte da Universidade Federal de São Paulo. Segundo o especialista, para estimular o crescimento dos músculos usa-se uma dose até 60 vezes maior do que a utilizada em clínicas para a recuperação de pacientes com traumas musculares. “Os efeitos dessa superdose são devastadores para o fígado e podem gerar câncer e atrofia muscular”, completa.
Em caso de dúvida, há sempre um conselho pouco confiável dos vendedores. Após o repórter da Folha Universal se apresentar como um homem com alguns quilos a mais, vem a recomendação: “o Dualid S 75 mg é o moderador de apetite mais forte. Os efeitos são boca seca, nervosismo e constipação intestinal”, tranqüiliza o vendedor Willian. Em outra conversa pela internet, ao tentar vender o medicamento controlado Sibutramina, Diego, que se identifica como responsável pela “Mph importadora”, tenta assustar: “ele regula o colesterol e ajuda a prevenir infartos. É preciso acabar com a barriga indesejada, pois ela pode causar até mesmo impotência”.
Diego diz que tem facilidade em conseguir anorexígenos por ter trabalhado em uma grande indústria farmacêutica. Ele justifica que vende remédios para pagar a faculdade de Farmácia na Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Paraná. Já Willian se vangloria. “Trabalho a hora que quero e meu lucro mensal é de R$ 3 mil. Está bom para você?”, provoca. Apesar disso, ele sabe que pratica atividade ilegal. “Tem que ficar esperto com a Polícia Federal”, diz. A pena para quem vende remédios controlados pela internet pode chegar de 10 a 15 anos.
F.Uni