Cerezo Barredo trabalha com Casaldáliga dentro da Teologia da Libertação, em São Félix. Ele tem atividade fora do país, dentro dos murais religiosos. A docente relata que as obras trazem o povo simples, marginalizadas dentro da igreja: Cristo bem negro, a mulher, o indígena, o pequeno produtor. “Tira o povo do estado comum e coloca em murais”. Cerezo seria mais popular e Bueno, acadêmica. “O trânsito na cultura dos dois é igual, mas o procedimento de ambos é diferente”.
"A Ceia Ecológica", de Cerezo Barredo (2001). (Fonte: acervo da pesquisa)
O andamento do projeto, de acordo com a pesquisadora, mostra muita convergência entre a imagem criada pela palavra e a criada pelos traços e cores. A poesia e a pintura marcam a presença e a identidade cultural de Mato Grosso. Mas cada um com seu estilo.
Ela aponta que o traço migratório se destaca na pintura que tem o chimarrão, ou poesia que se remete ao tomar o chimarrão de manhã ou final da tarde, que são próprios da tradição sulista, mas que se envolve hoje com a cultura local. Principalmente em obras de artistas do interior, que tiveram mais esse trânsito. “A maioria dos artistas que se encontram na capital é de Cuiabá. Eles registram mais o trânsito local. No interior, há mais pessoas que vieram de outro lugar para se assentar aqui e se misturam com a cultura local”.
Para apresentar as artes à sociedade, a pesquisadora conta que todo ano a Unemat desenvolve o projeto Varal de Poesia. Nele acontecem lançamentos de livros, poesias, coletâneas, presença de artistas e exposições de pintura. Além disso, há também concurso de poesia para crianças e adultos. “A sociedade já fica esperando o evento para ver as novidades. Tem muita aceitação desse trabalho”, garante.
Ela expõe a dificuldade que ainda existe das pessoas perceberem que poesia não é só de amor, sendo complicado olhar para a obra, pintura, e conseguir extrair sentido. O público em geral supõe que artes plásticas são só para museu e para quem entende. “Não conseguem olhar para uma igreja que tem uma tela com o Cristo negro e pensar no que será que aquilo significa. O que quer dizer um Cristo andando na Floresta Amazônica. Às vezes, essas dificuldades limitam. Mas é por isso que o projeto veio, para tentar expandir esse olhar. Olhar que olha para a poesia e consegue ver imagem e olha para a imagem e consegue ver poesia”, reflete a pesquisadora.
Poesia também é lugar de engajamento e reflexão social, como mostra esta obra de Dom Pedro Casaldáliga (Reprodução)
Próximos passos
O projeto é realizado há dois anos e a pesquisadora pediu a prorrogação do prazo por mais 12 meses. No próximo semestre, seu grupo de pesquisa organizará uma oficina para professores que gostam da poesia e de formar olhares. A atividade vai apresentar questões de cultura, poesia, pintura, como fazer essa leitura de reconhecimento. Um dos próximos passos também será ouvir os artistas para saber o nível de consciência deles sobre a relação da arte que desenvolvem com esse trânsito, com a formação da identidade.
Aos 40 anos de fundação, Sinop ainda vivencia processo de migração, conforme a pesquisadora Adriana Precioso (Foto: Prefeitura Municipal)
O primeiro momento do projeto foi conhecer como aconteceu a formação migratória, que é diferente no interior e na capital de Mato Grosso. Adriana Precioso relata, por exemplo, que Sinop é uma cidade de 40 anos, nova, ainda em processo de migração. Oposto a Cuiabá, que já tem uma consolidação com valores centenários que fazem parte da cultura.
A docente afirma que o trabalho já mostrou a convergência do espaço amazônico, pantaneiro, com a questão das cores, do verde, do marrom, da terra vermelha, marcas da geografia local colocadas na pintura. E nos poetas a ligação é representada na palavra. “O ciclo sazonal de Mato grosso é diferente dos outros lugares do Brasil. A gente tem aqui o tempo da seca e o tempo da chuva. Essa diferença é fortemente marcada e apresentadas pelos poetas como uma formação de identidade”, conclui.
Foto de capa: EBC