O reverendo brasileiro Josué Yrion é um missionário conhecido nos Estados Unidos e no Brasil. Radicado na Califórnia, ele causou polêmica durante uma pregação, em espanhol, em que acusou a apresentadora Xuxa de ter um pacto com o diabo. “Xuxa é satanista, ela vendeu a alma para o demônio por US$ 100 milhões (R$ 164 milhões). Xuxa, O-xú e Ori-xá, nome de dois demônios do Brasil”. O vídeo com as acusações de Yrion está disponível na internet mas não é o único a afirmar que a apresentadora tem envolvimento com cultos satânicos.
No Youtube, site de compartilhamento de vídeos, uma das seqüencias mais acessadas, com mais de 4,5 milhões de visitantes, é a que a apresentadora canta um dos antigos sucessos, “Cãozinho Xuxo”, entre lágrimas, abraçada a uma criança. Exibida de forma invertida a canção seria, segundo o vídeo, uma invocação ao diabo, embora nada seja explícito. A tal gravação ao contrário afirma registrar Xuxa falando coisas do tipo “meu anjo é o diabo”. Legendas tentam ajudar a compreensão do internauta e cenas de um antigo incêndio nos estúdios da apresentadora ilustram o filmete.
Professor da Universidade William Carey do Centro Mundial de Missões da Califórnia, Yrion é uma voz que costuma repercutir nos meios religiosos e já fez muito barulho ao se lançar numa campanha contra os desenhos infantis da Disney que, segundo ele, contém mensagens subliminares satânicas e pornográficas. Desta vez, o alvo foi Xuxa. De acordo com o reverendo, a apresentadora “doa sangue” duas vezes por ano para uma igreja satânica em São Francisco, nos Estados Unidos, e uma boneca da marca Xuxa perturbaria crianças no Brasil. Ele conta que mutilou com as próprias mãos uma dessas bonecas que havia deixado uma criança enferma. Enquanto ele arrancava os braços e pernas, a boneca, segundo ele, teria soltado um grito lancinante: Ahhhhhhhh!, berro que Yrion reproduz no culto.
A história parece enredo de filmes de terror, mas ganhou destaque na imprensa brasileira. Uma das colunas mais lidas do jornal “Folha de S. Paulo” trouxe o assunto no último dia 11 de agosto. Em nota ao jornal, a assessoria da apresentadora Xuxa avisa que não comentaria tais barbaridades.
A “barbaridade” disponível para quem quiser ver na rede mundial de computadores esquenta uma discussão que costuma gerar polêmica: afinal, existe gente que alcança sucesso meteórico por fazer pactos diabólicos? Há um incalculável acervo digital sobre ocultismo, satanismo e referências a alianças com o demônio na internet.
Apesar de toda polêmica, Yrion parece conhecer do que fala. São Francisco é, realmente, o berço da Igreja de Satã, fundada em 1966 por Anton Szandor LaVey, que desfilava pelas ruas com um leopardo negro. Conhecido como o papa negro, fundou a igreja e foi o sumo sacerdote até 1997, quando morreu de edema pulmonar.
Os membros da igreja de LaVey eram ligados a Hollywood e o próprio sarcedote fez o papel de diabo no filme “O Bebê de Rosemary” (1968), do cineasta Roman Polanski. Em 1969 ele lançou o blasfemo “A Bíblia Satânica”, o primeiro de uma série maligna. Os mandamentos do satanismo pregam convicções egoístas e hedonistas. “Satã representa todos os ditos pecados que levam à gratificação física, mental e emocional”, diz um deles. Mas os rituais são conhecidos por sacrifícios de animais – comum em alguns cultos de religiões afro-brasileiras – e até de humanos.Celebridades das mais variadas estirpes são hora ou outra vinculadas ao diabo. Retratado na biografia “O Mago”, do jornalista Fernando Morais, o escritor Paulo Coelho, que já vendeu 100 milhões de livros no mundo, se deixou seduzir por práticas ocultistas na juventude. De acordo com a biografia, o encontro do escritor brasileiro com o demônio aconteceu em 25 de maio de 1974 e a motivação seria a busca pelo sucesso.
Referindo-se ao demônio, Paulo Coelho escreveu no próprio diário: “Senti que você vinha fechando o círculo à minha volta, e sei que você é mais forte que eu. Você tem mais interesse em comprar minha alma do que eu em vendê-la”. Quando ocorre o suposto encontro, Coelho vive um pesadelo traduzido por odores, barulhos e sensações de terror. Paulo Coelho foi parceiro musical de Raul Seixas, falecido em 1989, e ambos foram influenciados pelo satanista inglês Alester Crowley, falecido em 1947, uma das figuras mais controversas do século passado. Na canção “Sociedade Alternativa”, assinada por Coelho e Seixas, eles lembram um dos ensinamentos do bruxo Crowley: “Faz o que tu queres, pois é tudo da lei”, um mantra que prega a liberdade total, sem limites pelo prazer. Para se ter uma idéia de como Crowley era estimado por roqueiros, ele aparece na capa do disco “Sargent Peppers”, dos Beatles.
O rock é um campo frutífero para relações com o demônio. A banda inglesa Rolling Stones tem, entre os sucessos, a canção “Simpathy for the devil” (condolências com o demônio), um disco batizado de “Their Satanic Majesties Request” (A Serviço de Sua Majestade Satânica), além de lançarem um outro álbum, “Voodoo Lounge”, com referências ao vodu e magia negra. Mais claro, impossível. Muito antes porém destes roqueiros acusados de satanistas fazerem sucesso, um artista da década de 30 é famoso até hoje por uma história de um pacto com o diabo que se tornou uma lenda americana. Robert Johnson deixou apenas 40 canções fundamentais para o blues moderno. Cantor, e sem reconhecimento, se tornou popular subitamente ao exibir uma habilidade espantosa e única de tocar violão e gravar uma canção chamada “Me and The Devil Blues” (Eu e o diabo blues). A explicação seria um acordo com o diabo em troca do sucesso feito numa encruzilhada do Mississippi, nos Estados Unidos. Mas Johnson não viveu para saborear a fama. Morreu aos 27 anos, depois de passar três dias em coma, supostamente envenenado por um marido traído.
F.Uni