A eleição do socialista François Hollande à presidência da França pode aproximar as relações do país com o Brasil, sem que haja, no entanto, mudanças em relação a temas polêmicos, como a agricultura, segundo especialistas ouvidos pela BBC Brasil.
Para o cientista político Stéphane Montclaire, da Universidade Sorbonne, Hollande deverá buscar apoio de grandes emergentes, como o Brasil, para tentar convencer a Alemanha a revisar o pacto fiscal europeu e incluir medidas de estímulo ao crescimento econômico.
"As críticas de Dilma Roussef e de Hollande sobre as políticas de austeridade na Europa para superar a crise são muito semelhantes", diz Montclaire. A presidenta brasileira declarou várias vezes que "simples medidas de austeridade e consolidação fiscal não permitirão superar a crise na zona do euro" e que também são necessárias políticas de expansão dos investimentos no continente.
Esse é o mesmo argumento de Hollande. Em seu primeiro discurso no domingo, o presidente eleito afirmou que "a austeridade não pode mais ser uma fatalidade na Europa".
"Hollande vai precisar demonstrar que as propostas da França também têm apoio fora da União Europeia por parte de países com peso no cenário econômico internacional", diz ele.
"O Brasil também precisa de uma Europa forte para exportar seus produtos. Poderá haver nessa questão um ponto de convergência entre os dois países", diz o cientista político.
Segundo Montclaire, a aproximação maior entre o Brasil e a França será por razões estratégicas e irá facilitar relações que já são "muito boas". O presidente Nicolas Sarkozy, que ficará no cargo até 15 de maio, havia firmado com o Brasil, no final de 2008, uma parceria estratégica que prevê cooperações em várias áreas, sendo a mais importante a da Defesa.
Conhecimento
O pesquisador Jean-Jacques Kourliandsky, especialista em América Latina do Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas da França, diz que Hollande conheceria melhor o Brasil do que Sarkozy e também possui vários interlocutores no país, o que é um fator positivo.
"Hollande deverá ter uma compreensão mais rápida dos dossiês envolvendo o Brasil. O contato com autoridades brasileiras poderá ser mais fácil", diz ele, lembrando que o socialista participou de edições do Fórum Social Mundial em Porto Alegre e já se encontrou com o ex-presidente Lula.
Ele ressalta que essa maior proximidade nas relações entre a França e o Brasil não estão ligadas a questões ideológicas, pelo fato de Hollande ser socialista, e que posições assumidas pelo Estado francês não deverão mudar. "Hollande deverá apoiar a candidatura do Brasil a uma vaga de membro permanente do Conselho de Segurança da ONU porque isso é uma posição já assumida internacionalmente pela França", diz Kourliandsky.
Da mesma forma, diz o especialista, não deverá haver mudanças na posição francesa em relação às reivindicações do Brasil para obter maior acesso aos seus produtos agrícolas nos mercados europeus. "Isso é uma posição do Estado francês em relação aos seus agricultores e não irá mudar", afirma.
México
Para o analista, a principal mudança em termos de relações internacionais na gestão de Hollande poderá ser na relação com o México. Os laços entre os dois países ficaram profundamente abaladas depois que Sarkozy começou a fazer pressão pela libertação de uma cidadã francesa, Florence Cassez, condenada no México a 60 anos de prisão por sequestro.
A pressão provocou um imbróglio diplomático entre os dois países, que acabou levando ao cancelamento do Ano do México na França. Segundo o especialista, ao França estaria tendo atualmente dificuldades para discutir com autoridades mexicanas a reunião do G20 – grupo de países desenvolvidos e grandes emergentes – que ocorre no México em junho. Ele afirma que Hollande, prevendo sua vitória, já teria enviado colaboradores ao México para tentar resolver a crise com o país.
BBC-Brasil