quinta-feira, 21/11/2024
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OUTRAS FACES DO NEGACIONISMO

 Desde os primeiros anos da década de 1990, no Brasil, o discurso de satanização do Estado e de idealização da iniciativa privada foi, progressivamente, ganhando adeptos. Alguns por pragmatismo econômico, outros por identidade ideológica, muitos por adequação à supremacia do ideário dominante.

            Sob o bordão de “caça aos marajás“, Fernando Collor inaugurou o ataque aos servidores públicos e ao Estado. Para fertilizar o sentimento anti-público foi necessário o desmonte progressivo dos serviços públicos, a corrosão da sua relevância social e, concomitante, o enaltecimento aos serviços privados. Para tanto, consolidou-se um tripé estruturado sobre a asfixia orçamentária; o financiamento generoso do privado (através de políticas tributárias regressivas e incentivos fiscais imorais); e o ataque ininterrupto ao Estado e aos servidores públicos.

            Simultaneamente ao seu desmonte e à sua satanização, o Estado mantém-se objeto de intensa cobiça. Afinal, como assegurar políticas e legislações adequadas aos interesses privados senão através da direção do Poder do Estado? Assim, a cada pleito, as disputas eleitorais oferecem uma miríade de empresários e prepostos comprometidos com a defesa dos interesses privados em detrimento do interesse público, mesmo que sob o juramento eleitoreiro contrário. Todo esse processo que, no Brasil, já soma 30 anos, não passou incólume por dentro das universidades públicas.

            Contraditoriamente, muitos adeptos do neoliberalismo esforçaram-se, nos últimos anos, para serem aprovados nos concursos públicos. E, dentro das universidades públicas, gratuitas, de qualidade, democráticas, laicas e socialmente referenciadas, atuam cotidianamente para seu desmonte, seja através da aderência às políticas privatistas que atendem sob diversos nomes e formas, seja pela facilidade com que justificam os cortes orçamentários e encampam as parcerias com a iniciativa privada. Por dentro, na prática, promovem o sitiamento da universidade.

            E assim, em nome do “novo” – como se contemporâneo fosse sinônimo de qualidade superior – seus defensores movem-se desenvoltos em meio à destruição de uma instituição secular, cujo fundamento é o conhecimento sólido e acumulado. Em nome do “novo”, faceiros, vendem facilidades tecnológicas, entre abstrações ideais e a impertinência da realidade social perversa. Em nome da “modernidade” promovem o empreendedorismo sob a batuta do Sistema S, que assim como eles, alimentam-se do público para a partir dele detratá-lo.

            Em nome do “novo” e por dentro da própria universidade pública vão lhe minando as forças. De forma oportunista, alguns não somente aliam-se àqueles que querem pô-la de joelhos, mas chegam, inclusive, a pedir sua intervenção. Outros, de costas para a autonomia assegurada pela Constituição Federal, apressam-se em ajustar-se aos governos de plantão, mesmo que ao custo de renegar a tradição democrática. Uma outra parcela dedica-se a inviabilizá-la sob a aparentemente bem-intencionada iniciativa de agregar professores voluntários (não remunerados) que justificarão a falta de concursos públicos e a geração de empregos remunerados para jovens recém-formados. Uma outra parte, ainda, ao invés de utilizar o conhecimento científico produzido pelas diversas faculdades, prefere garantir plateia para coaches motivacionais; ou, então, criar vídeos infantilizados que tratam estudantes e professores universitários como crianças para vender falsas facilidades que a Flexibilização prometeu, mas não entregou.

            Neste processo de destruição da Universidade Pública, o mais lamentável é perceber que seu desmonte tem sido produzido com a conivência ativa ou passiva de parcelas significativas de professores e técnicos que, muitas vezes, ainda se arrogam seus defensores. Nessas condições, nem precisamos de Weintraubs, Damares e Bolsonaros fazendo ataques mentirosos, desleais e contumazes contra as universidades públicas. Basta continuar a submetê-la aos agentes privados ou às mentes privatizadas dos agentes públicos.


[1] Professora da área de Ciência Política do Depto. Sociologia e Ciência Política/SOCIP/UFMT e do Programa PPGPS-SES/UFMT; Pesquisadora MERQO/CNPq; Membro GTPFS/ADUFMAT-ANDES/SN.

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Parmenas Alt
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