Chauke Stephan Filho
Quando foi da manifestação do dia 19 de abril, domingo, em Brasília, realizada diante do Quartel-General do Exército, manifestantes clamaram por intervenção militar. Diante do fato, o ministro Roberto Barroso declarou-se “assustado” ante mais esse atentado contra a segurança do Estado e cobrou providências. Por sua vez e ao contrário do ministro, o sociólogo Sérgio Alves de Oliveira, articulista da ciber-revista Alerta Total, declarou abertamente sua solidariedade aos manifestantes e à sua causa em pró da ditadura militar.
E agora?!
Será que os ministros do STF,
paladinos do Estado democrático de direito, levarão o articulista Sérgio Alves
de Oliveira à prisão pelo crime de manifestar opinião política não boazinha em
favor de um governo militar para o Brasil?
Sua Excelência o ministro Barroso disse com muita propriedade
sobre aqueles que brandem a espada contra a Constituição que se trata de gente
sem fé no futuro. Verdade! Aquela turma de verde e amarelo só acredita em Jesus
Cristo. Será que tamanho descaro em desafio à ordem democrática restará impune?
A Polícia Federal não impedirá a ameaça que representam à segurança do Estado,
à paz social?
Sim, existe a liberdade de expressão, mas não de
qualquer expressão. Tudo tem limite. Opiniões políticas imaturas, radicais,
irresponsáveis não podem ter livre curso nas ruas ou nas redes sociais.
Sim, existe a inviolabilidade da correspondência,
assegurada pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, mas esse papel é de
1948! Coisa arcaica, antiquada, completamente incompatível com o mundo atual da
comunicação eletrônica.
Naquele tempo, os fascistas, os machistas, os
fanáticos religiosos, os homofóbicos, os transfóbicos, os racistas, os
desagregadores, ou seja, todos aqueles que não sabem pensar ou sentir de forma
politicamente correta, não podiam se comunicar com milhões de pessoas por todo
o mundo instantaneamente. Hoje, os radicais de extrema-direita comunicam-se
como se estivessem num grupo de amigos, falam o que pensam, expressam suas
ideias autoritárias com toda a sinceridade e muito à vontade. Ficam parecendo
membros de uma grande e unida família sem nenhuma vizinhança indesejável.
Um absurdo!
Criminosos intelectuais não podem se
sentir tão livres! O problema é que o “grupo de amigos” pode incluir
milhões de pessoas. Cria-se com isso enorme foco para o vírus da intolerância,
que grassa também na forma de pseudonotícias. Eis por que o Excelso Pretório
bate-se pela censura (democrática) das redes sociais. Havendo censura, nenhuma
pessoa, sobretudo as de grupos minoritários oprimidos sob o privilégio branco,
ficará estressada ao navegar na rede-múndi. À sombra do STF, manter-se-á em
perfeita paz e segurança a sociedade brasileira. Com as suas togas, nossos
maiores magistrados tratam de abafar as vozes do ódio que ressoam no
ciberespaço como silvos da Serpente. Suas Excelências os ministros Gilmar
Mendes, Dias Toffoli e Alexandre de Moraes esmagam os ovos do réptil, no que
honrosamente representam o conjunto de seus pares, todos empenhados em
substituir os gritos de ódio por sussurros de amor.
Se cada uma das personalidades autoritárias que
vomitam discursos de ódio usasse um mimeógrafo para divulgar o seu pensamento,
se cada direitista apenas escrevesse cartinhas para meia dúzia de
simpatizantes, aí sim, o direito à inviolabilidade da correspondência poderia
ser efetivo. Porque nisso não haveria nenhum efeito social de massa capaz de
ameaçar a segurança cultural do estabilismo, a sua hegemonia, o seu monopólio
democrático da comunicação pública, a qual não pode ser de todos. Sim,
monopólio democrático e excludente, porque a democracia não pode receber seus
inimigos como aconchegante seio para uma faca.
No mundo globalizado de hoje, sem fronteiras e sem
identidade, não há mais causas coletivas. Ora, se cada um é apenas mais um no
mercado, a única forma admissível de protesto tem por justificação o direito do
consumidor. E, claro, nenhum consumidor precisa de organização política
subversiva só para ir àquela loja de eletrodomésticos, tampouco precisa de
mídia de massa para reverberar vozes de desafio político já sem cabimento na
democracia. Tudo está tranquilo, só os loucos pensam em fechar o Congresso ou o
STF. A propaganda comercial tem o mais interessante conteúdo, o que realmente
importa: o novo telefone da Apple, a passagem aérea em promoção, aquela revista
de boa forma e decoração… mas armas, não!
Sem armas! Para que se garanta a segurança de cada um
basta o respeito de cada um para com os direitos humanos, para com a
diversidade, a alteridade. Somos todos cidadãos do mundo. É à Unesco, é à OMS,
é à ONU que devemos acatamento. Nesses instâncias superiores do Governo Mundial
é maior a integração. Daí, pois, ser maior o exemplo da sua moralidade a ser
seguido e defendido.
No Brasil, o Congresso e o STF representam esse
admirável mundo novo da Nova Ordem Mundial. Lá fora brilha o Sol de George
Soros, irradiando os dólares de que tanto carecem as minorias oprimidas sob o
racismo. Que homem bom! Aqui dentro mesmo do Brasil, Felipe Santa Cruz, o
grande presidente da OAB, é outra fonte de luz. Este causídico mostra-se,
aliás, sempre cordialíssimo, mesmo quando uma ou outra biscatinha entre as suas
colegas falta-lhe com o devido respeito.
Quanta bondade e felicidade anuncia o novo mundo de
que todos seremos cidadãos! Correção política e direitos humanos para todos.
Futuro tão maravilhoso ninguém pode ameaçar. Sim, Sérgio Alves de Oliveira deve
estar com os manifestantes na cadeia. Cadeia para os dissidentes da Democracia!
Viva o ministro Gilmar Mendes! Viva o ministro
Barroso! Viva o ministro Alexandre de Moraes! Viva o ministro Toffoli! Vivam
todos os seus pares e luminares do Estado Democrático de Direito! Viva Felipe
Santa Cruz! Viva a OAB! Viva a ABI! Viva a Abert!Viva a ANJ!
Viva a nossa jovem e eterna Democracia! (Mas
com responsabilidade e amor, senão a liberdade de expressão transforma-se em
libertinagem política.)
* Chauke Stephan Filho nasceu em Cuiabá no ano de 1960. Com formação em sociologia e política (PUC/RJ), português e literatura (UFMT) e educação (Unic), dedica-se ao estudo da sociologia do racismo como servidor concursado da Prefeitura de Cuiabá (IPDU), onde também serve como revisor. É colaborador do Alt Notícias.