O que será que o próximo ano pode nos reservar?
O ano atual começou com uma discussão imensa sobre como se desenrolaria a guerra comercial entre EUA e China e passou quase a integralidade discutindo sobre como sairíamos da crise do coronavírus, passando por eleições municipais que trouxeram uma mensagem mais tradicional na política e a eleição de Biden – essa que ocorreu após um espernear impressionante de Trump.
É, não foi um ano fácil ou pouco emocionante.
Dito tudo isso, vamos ao que você veio ler neste artigo. O que será que o próximo ano pode nos reservar? É possível observar isso em três diferentes óticas: saúde, economia/reformas e política/relações internacionais. Vejamos cada uma delas a seguir.
Saúde
O mundo todo está atrás de uma vacina para a Covid-19, isso não é novidade. No momento em que esse artigo é escrito, temos seis vacinas já aprovadas e em distribuição no mundo: a da Pfizer/BioNTech, a da Moderna, a da Sinovac Biotech, a do Gamaleya, a da CanSino Biologics e a da Sinopharm. As autorizações variam entre autorização emergencial ou oficial, mas todas essas vacinas já são realidade em diversas partes do mundo.
Mais de quatro milhões de doses já foram aplicadas nessa que será a maior campanha de vacinação da história.
Isso é realmente relevante, dado que o vírus acabou de completar um ano entre nós e já temos imunizantes sendo aplicados. É claro que isso não seria possível sem os esforços ao redor do mundo em termos de ciência e de financiamento, dado que é de interesse geral que a situação seja equalizada o mais rápido possível.
Faz-se aqui uma ressalva a um país cujo presidente parece não ter o mesmo interesse em celeridade: o Brasil. Com uma parte do mundo já vacinando, por aqui Bolsonaro afirmou diretamente que não está tão preocupado (“não dou bola pra isso”, citando-o) e até ironizou, sobre uma vacina que já foi aplicada em líderes políticos ao redor do mundo (a da Pfizer/BioNTech) ser capaz de efeitos tão adversos como “transformar você em um jacaré”.
De brincadeira em brincadeira, já estamos atrasados nessa corrida e isso não sairá de graça no próximo ano.
Em termos de saúde, certamente o aspecto mais relevante para 2021 será o fato de termos uma vacinação mais ampla que possa encaminhar uma redução no número de mortes e de casos de Covid-19 em todo o mundo. São algumas vacinas autorizadas e outras devem sair em breve, o que é bastante positivo, dado que a quantidade de pessoas a serem imunizadas é imensa, demandando algumas bilhões de doses – sobretudo pensando que a maioria dessas vacinas já aprovadas demandam duas doses de aplicação.
Vivemos hoje o pior momento da pandemia em termos de casos e mortes. A segunda onda já ocasionou mais casos e mortes na Europa do que na primeira e, ao redor do mundo, a pandemia nunca infectou nem matou tanto quanto agora. Segundo dados atualizados até a tarde de 27/12/2020, são quase 80,6 milhões de casos e mais de 1,75 milhão de mortes até então. De acordo com o infectologista Anthony Fauci, o pior da pandemia ainda está por vir.
Por basicamente dois motivos vale seguir atento com essa questão no próximo ano: em primeiro lugar, a ideia era de que em no máximo dois meses teríamos a situação controlada (e aqui no Brasil já quadruplicamos isso, ainda sem caminho claro para o fim) e, em segundo, ainda há uma linha tênue entre o que sabemos e o que não sabemos desse vírus – o que nos deixa no limiar entre acreditarmos que de fato há um “novo normal” ou apenas no aguardo do que a vacinação pode nos fornecer de segurança.
Qualquer que seja o caso, a prudência segue sendo necessária. Provavelmente essa corrida pela vacinação parecerá muito mais com uma maratona do que com um tiro curto de cem metros.
Economia/Reformas
Outro bom motivo para olhar 2021 é o fato de que chegamos ao final do atual ano com o governo apenas tendo colocado na mesa parte da reforma tributária (que efetivamente muda muito pouco do cenário) e uma reforma administrativa que mais anuncia o futuro do que resolve o presente. Temos uma oportunidade de, no próximo ano, realmente tocar mudanças mais relevantes. Levando em conta que as eleições municipais sinalizaram que quem não entrega e só fica no discurso será substituído, tanto Congresso quanto governo deverão ter interesse em “deixar suas marcas” nesse próximo ano – dentre outros motivos para poder usarem tal vantagem no ano eleitoral que ocorre depois.
É possível considerar 2021 como sendo um ano estratégico para o campo de reformas que impactem a economia basicamente por dois aspectos: considerando que (apesar do cenário atual de letargia) iniciemos um vigoroso processo de vacinação ainda no primeiro semestre do próximo ano, a pandemia irá aos poucos saindo do foco principal que tem atualmente (que concentra basicamente todos os esforços, ao menos em teoria) e, para além disso, temos mais um ano de espaço entre duas eleições (a municipal de 2020 e a presidencial de 2022).
Caso a estratégia a ser utilizada para a discussão das reformas em 2021 seja a mesma de 2019 com a reforma previdenciária, buscando mais apresentar quais problemas essas reformas vêm a resolver do que necessariamente discutindo narrativas inócuas, podemos prever que ao menos uma das duas reformas mais importantes para o momento (tributária e administrativa) deve ser aprovada em 2021.
Atenção: isso só acontece se o foco for o mesmo de 2019.
A recuperação da economia deverá ser lenta. Não é demais relembrar que, antes mesmo da crise atual chegar, ainda não havíamos nos recuperado do baque de 2015-2016. Outro indício dessa recuperação mais lenta é o fato de que nossos mercados – como o de trabalho – são pouco flexíveis e, no fim das contas, embora tenhamos a sensação de que aqui sofremos menos com a situação atual do que outros países no mundo, isso certamente contribui para que nos recuperemos mais lentamente também. Reformas auxiliam nesse caminho de retomada – embora, mais uma vez, elas deixam o caminho mais fácil, mas não garantem a chegada.
Política/Relações internacionais
A eleição nos EUA trouxe um recado interessante ao mundo: na disputa entre o nacionalismo e a globalização tivemos uma vitória do segundo caso com a eleição de Joe Biden. Isso não zera todas as questões a serem enfrentadas – sobretudo com em relação a guerra comercial com a China, esta que, ainda que com certa vantagem pro Tio Sam, ainda não acabou.
Os destinos eleitorais na maior economia do mundo costumam impactar o resto do mundo diretamente. Isso já acontece em tempos regulares, mas agora isso torna-se ainda mais intenso, com efeitos notáveis sobretudo aos países emergentes como o Brasil.
A reeleição de Trump significaria uma continuidade das medidas que vão em direção do famigerado America First e, dentre outros pontos, isso significa que tensões comerciais com a China poderiam seguir adiante e os caminhos para relações internacionais mais diretas entre países – e não tanto em blocos de países – deveriam seguir intensificados.
Já a vitória de Biden acarreta um retorno do pêndulo do mundo para o lado da globalização, aliviando tensões internacionais em prol de um comércio mais amplo mundialmente. Neste cenário, ganham os países emergentes, por passarem a ter uma nova janela temporal de investimentos que antes concentrar-se-iam justamente onde houvesse maior foco nacional – nos EUA, por exemplo.
Independente do resultado já decidido nos EUA não podemos nos esquecer que a China já corre por fora para ampliar sua presença. Esse movimento que começou logo no início do segundo trimestre aumenta a cada dia. Como uma economia que há décadas cresce ininterruptamente e caminha nos próximos anos para se posicionar como a maior do mundo, o gigante asiático não quer depender tanto dos rumos da atual maior economia do mundo.
Nossa política aqui influencia? Sim, mas com maior relação ao item anterior (das reformas) do que sobre o resto do mundo. Ajeitar a casa por aqui fará muita diferença – porque quem se mostrar como boa oportunidade de negócios irá receber os mais vultosos fluxos financeiros.
Vem logo, 2021!
Tal qual passada a aprovação da reforma previdenciária na Câmara em 2019 e o famigerado questionamento sobre “o que vem no pós-previdência”, o foco está cada vez mais direcionado para o que vem no pós-pandemia. Tendo em vista que se trata de uma questão sanitária, esse aspecto será primordial para equalização de tudo.
2020, o ano que valeu por dez (em diversos aspectos), encerra-se nos próximos dias. Mas tenham em mente desde já: pode ser que 2021 seja mais calmo, mas certamente será um ano estratégico em todo o mundo.