domingo, 29/12/2024
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O perigoso agente cancerígeno que ainda é encontrado em produtos de cuidados pessoais

Autoridades apontam que o benzeno, encontrado em loções e protetores solares, é perigoso para a saúde

O benzeno parece estar em todos os lugares nos últimos anos. Primeiro, foram os higienizadores para as mãos com “níveis inaceitáveis” do carcinógeno; depois, houve recalls de sprays antifúngicos para os pés e relatos alarmantes de desodorantes, xampus secos e protetores solares contaminados.

Algumas dessas descobertas geraram manchetes e postagens de mídia social carregadas de pânico. No TikTok, influenciadores de bem-estar físico emitiram alertas para que as pessoas parassem de usar protetor solar; um médico na mesma plataforma chegou a comparar o uso de xampu seco com benzeno ao tabagismo. No âmbito jurídico, várias ações coletivas foram movidas por causa dessas descobertas.

O benzeno, encontrado naturalmente no petróleo bruto, não é adicionado intencionalmente aos produtos, mas é usado na química de fabricação de corantes, detergentes, tintas e plásticos. Pode ser encontrado em itens de cuidado pessoal quando os produtos químicos neles inseridos não são purificados o suficiente ou quando certos ingredientes ativos nos produtos reagem entre si ou se decompõem.

Ainda não há dados que comprovem que baixos níveis de exposição ao benzeno contido em produtos de cuidados pessoais acarretem riscos significativos à saúde. Alguns especialistas disseram que muitas das descobertas mais alarmantes sobre o benzeno vieram de um único laboratório de testes que foi, posteriormente, criticado por aplicar uma metodologia que não é padrão.

Ainda assim, dado que altos níveis de exposição ao benzeno foram associados ao surgimento de câncer, especialistas afirmam que vale a pena verificar as formulações de xampus secos, protetores solares e outros produtos.

O que a pesquisa mostra sobre o benzeno?

Muitas das pesquisas feitas até agora analisam especificamente a exposição regular a altos níveis de benzeno em ambientes ocupacionais.

As provas de que o benzeno pode causar câncer em humanos vêm de observações de trabalhadores em indústrias farmacêuticas e de petróleo que remontam à década de 1920. Em 1987, a Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer relatou que havia “provas suficientes” de que o benzeno era cancerígeno em humanos e animais. Hoje, a Organização Mundial da Saúde, a Agência de Proteção Ambiental dos EUA e o Programa Nacional de Toxicologia dos EUA concordam que o benzeno pode causar câncer, particularmente a leucemia.

Também foi comprovado que a inalação de altos níveis de benzeno por longos períodos está relacionada a outros cânceres de sangue e câncer de pulmão, bem como anemia, diminuição da capacidade de combater infecções e períodos menstruais irregulares.

As autoridades de segurança ocupacional em todo o mundo geralmente recomendam que a exposição no local de trabalho seja limitada a uma parte de benzeno por um milhão de partes de ar, ou um ppm (uma parte por milhão), em um dia de trabalho de oito horas.

O resto de nós também está exposto ao benzeno, mas em níveis muito mais baixos, principalmente por meio das emissões dos veículos, da fumaça de cigarro e dos fogões a gás.

“Não podemos evitar totalmente a exposição em nosso ambiente moderno”, disse Emily Barrett, pesquisadora de saúde da Escola de Saúde Pública Rutgers. Um estudo estimou que a exposição ambiental média de uma pessoa está abaixo de 0,015 ppm em um dia – quase cem vezes menor que o limite da exposição ocupacional.

O que sabemos sobre o benzeno em produtos de cuidados pessoais?

Com o aumento do número de relatos da presença de benzeno em produtos de cuidados pessoais, os cientistas começaram a investigar se baixos níveis do produto químico têm efeitos na saúde.

Alguns estudos de laboratório mostraram que pelo menos certa quantidade de benzeno pode penetrar a barreira da pele.

Uma das preocupações dos pesquisadores é saber se os ingredientes, que ajudam loções e protetores solares a derreter na pele, podem acelerar a absorção, afirmou Kurunthachalam Kannan, toxicologista no Departamento de Saúde do Estado de Nova York, cuja pesquisa encontrou benzeno em produtos de cuidados pessoais.

Como o benzeno evapora com facilidade, as pessoas também podem inalar parte do produto químico ao aplicá-lo sobre a pele. Isso significa que são expostas pelas duas vias, explicou Luoping Zhang, toxicologista da Universidade da Califórnia em Berkeley. Mas o fato de evaporar rapidamente sugere que a exposição pela pele não é tão preocupante se comparada à exposição regular ao benzeno no ar. Os trabalhadores da indústria química podem estar em maior contato com o produto do que a maioria de nós.

A pesquisa feita sobre esse tema até agora não apontou a existência de risco significativo. Em um dos estudos, o grupo de pesquisadores acadêmicos examinou dados de mais de 27 mil pessoas que usaram cremes prescritos contendo peróxido de benzoíla (BPO), que atua como antisséptico. Quando compararam os dados desse grupo com os dados de pacientes que não tiveram exposição ao peróxido de benzoíla, não encontraram risco aumentado de câncer associado ao benzeno entre aqueles que usaram cremes.

Ainda assim, os especialistas se mostraram preocupados com essas exposições potenciais, já que esses produtos são aplicados diretamente no corpo quase diariamente e em locais pequenos e mal ventilados, como os banheiros.

A quantidade de benzeno à qual os norte-americanos estão expostos parece estar aumentando: embora pesquisas feitas em nível nacional mostrem que as quantidades de benzeno no ar diminuíram – graças a limites mais rígidos impostos à composição da gasolina –, os marcadores de benzeno em amostras de urina aumentaram nas últimas décadas. Ao mesmo tempo, os cientistas descobriram que mais produtos podem ter benzeno, incluindo fraldas, lenços umedecidos descartáveis e absorventes internos e externos.

De acordo com Ami Zota, professora associada de ciências da saúde ambiental na Escola de Saúde Pública Mailman, da Universidade Columbia, a descoberta de benzeno nesses produtos ressalta as lacunas na supervisão regulatória da segurança de produtos de cuidados pessoais. “Como muitos testes de segurança de produtos são voluntários, é a indústria que define as próprias normas”, ela ressaltou.

Por que há tanta atenção especificamente ao benzeno?

Grande parte do interesse em torno da contaminação por benzeno em produtos de cuidados pessoais foi impulsionado pela Valisure, pequena empresa de testes de drogas sediada em New Haven, Connecticut. Esta relatou ter encontrado contaminação por benzeno em higienizadores para as mãos, sprays corporais, protetores solares, xampus secos e medicamentos para acne, todos contendo peróxido de benzoíla. As descobertas que apareceram em alguns dos relatórios da Valisure se espalharam em plataformas de mídia social como o TikTok e o Truth Social.

Mas alguns cientistas questionaram a metodologia da Valisure, argumentando que seu protocolo de testes frequentemente envolve o aquecimento de produtos em níveis muito mais altos do que as temperaturas que ocorrem na vida cotidiana, o que pode acelerar a decomposição dos ingredientes e sugerir um risco de exposição ao benzeno muito maior do que os consumidores realmente enfrentam. “Esse laboratório é conhecido por fazer comparações absurdas em seus relatórios”, disse Michelle Wong, química e educadora científica na Austrália que fez críticas on-line ao trabalho da Valisure.

As empresas geralmente testam produtos em temperaturas elevadas para simular como se decomporiam ao longo do tempo e para definir datas de validade, explicou Kelly Dobos, consultora química cosmética e professora adjunta de ciência cosmética na Universidade de Cincinnati. Entretanto, aquecer produtos a temperaturas mais altas do que as recomendadas para esse tipo de teste de estabilidade pode apresentar resultados defeituosos, afirmou David Keire, diretor do escritório de pesquisa de qualidade farmacêutica da Administração de Alimentos e Remédios (FDA, sigla em inglês), observando que, “se você atear fogo em algo, vai queimar”.

Em uma entrevista, David Light, presidente e cofundador da Valisure, defendeu os métodos da empresa chamando-os de cientificamente sólidos, pois também incluem testes em temperaturas mais baixas.

Outros questionaram a motivação por trás do trabalho da Valisure, uma vez que ela pode se beneficiar financeiramente do aumento da regulamentação e dos testes de produtos estimulados por suas descobertas. Light retrucou que, embora tenha fins lucrativos, o foco da empresa é proteger os consumidores e melhorar a saúde pública.

O que você deve fazer sobre isso?

Especialistas enfatizaram que não há necessidade de entrar em pânico sobre o benzeno em produtos de cuidados pessoais, mas vários sugeriram que é bom armazenar esses itens adequadamente para evitar que as embalagens se quebrem. Aqui estão algumas etapas simples para minimizar uma possível exposição.

Protetor solar: nenhum dos especialistas entrevistados sugere abandonar o protetor solar por medo do benzeno. Mesmo em testes da Valisure, a maioria dos protetores solares não possuía níveis detectáveis. “Os benefícios dos protetores solares são bem conhecidos. O risco é algo que assumimos que existe e estamos colhendo mais informações”, disse Zhang. Mas se você prefere agir com excesso de cautela, evite guardar o protetor solar no carro e não use os que são aerossóis. Muitos dos produtos que contêm benzeno são aerossóis. O benzeno tem mais probabilidade de aparecer nessas formulações porque pode contaminar os propelentes.

Xampus secos: se você está preocupado com a potencial exposição ao benzeno, tente mudar para xampus secos que vêm em pó, em vez de produtos em aerossol, recomendou Barrett.

Cremes para acne: se você quiser continuar a usar produtos com peróxido de benzoíla, guarde-os em um lugar fresco e escuro, como um armário ou geladeira, disse Dobos. Isso ajudará seus ingredientes a permanecer estáveis por mais tempo. Você também pode falar com um médico sobre alternativas ao peróxido de benzoíla que podem funcionar melhor para seu caso.

Verifique sempre seus produtos em relação às listas publicadas da FDA que informam quais itens de saúde foram recolhidos do mercado e que dão alertas de segurança.

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