O confinamento (lockdown) imposto na esteira da pandemia do novo coronavírus acelerou a implementação de antigos planos para estabelecer a chamada “nova ordem mundial”.
E isso não é teoria da conspiração. Já se tornou um objetivo abertamente declarado.
Sob os auspícios do Fórum Econômico Mundial (WEF – World Economic Forum), os formuladores de políticas globais estão abertamente defendendo um plano intitulado “O Grande Reinício” (The Great Reset), com a explícita intenção de criar uma tecnocracia global.
Não é por acaso que, em 18 de outubro de 2019, na cidade de Nova York, o WEF participou do “Evento 201”, uma “conferência de alto nível”, sobre reações à pandemia, organizada pelo John Hopkins Center for Health Security.
Pelo que se deduz do manifesto, essa vindoura tecnocracia envolverá uma estreita cooperação entre os chefes da indústria digital e os governos.
Com programas como “renda mínima garantida” e “assistência médica para todos”, o novo tipo de governança combina um estrito controle da sociedade com a promessa de “justiça social abrangente”.
Essa nova ordem mundial, organizada por uma tirania digital, virá com um abrangente e astuto “sistema de crédito social”.
A República Popular da China é pioneira neste método de vigilância e controle de indivíduos, corporações e entidades sociopolíticas.
Para o indivíduo, sua identidade seria reduzida a um aplicativo ou chip que registra praticamente toda sua atividade pessoal.
Para obter alguns direitos individuais, como o de viajar para um determinado local, a pessoa terá de contrabalançar esses privilégios aparentes com sua sujeição a uma rede de regulações que define em detalhes o que vem a ser um “bom comportamento”, o qual deve ser considerado benéfico para a humanidade e para o meio ambiente.
Por exemplo, durante uma pandemia, esse tipo de controle se estenderia desde a obrigação de usar uma máscara e praticar o distanciamento social até vacinações compulsórias para poder se candidatar a um emprego ou viajar.
Trata-se, em suma, de um tipo de engenharia social que é o oposto de uma ordem espontânea.
É a antítese daquilo que se pode considerar ‘desenvolvimento’.
Como o engenheiro mecânico com uma máquina, o engenheiro social — ou tecnocrata — trata a sociedade como um objeto.
Diferentemente das brutais supressões do totalitarismo de épocas anteriores, o engenheiro social moderno tentará fazer a máquina social funcionar por conta própria, de acordo com o projeto original.
Para esse propósito, o engenheiro social deve aplicar as leis da sociedade da mesma maneira que o engenheiro mecânico segue as leis da natureza.
A teoria comportamental atingiu um estágio de conhecimento que tornou possível praticamente todos os sonhos da engenharia social.
As maquinações da engenharia social operam não pela força bruta, mas sutilmente por meio de “cutucões”, como sempre apregoou seu papa, Richard Thaler.
Sob a ordem imaginada pelo “Grande Reinício”, o avanço da tecnologia não visa a aprimorar as condições das pessoas, mas sim a submeter o indivíduo à tirania de um estado tecnocrático.
“Nossos especialistas sabem o que é melhor” é a justificativa.
A Agenda
O plano para uma revisão e uma reforma geral do mundo é criação de uma elite de megaempresários, políticos e sua comitiva intelectual que costumavam se reunir em Davos, na Suíça, em janeiro de cada ano.
Criado em 1971, o Fórum Econômico Mundial (WEF) tornou-se um evento megaglobal desde então.
Mais de três mil líderes de todo o mundo participaram da reunião em 2020 .
Sob a orientação do Fórum, a agenda do “Grande Reinício” afirma que a concretização da atual transformação industrial requer uma renovação completa da economia, da política e da sociedade.
Dado que uma transformação tão abrangente requer a alteração do comportamento humano, o “transhumanismo” obviamente faz parte do programa.
O Grande Reinício será o tema da 51ª reunião do Fórum Econômico Mundial em Davos, em 2021.
A agenda proposta será o compromisso de direcionar a economia mundial para “um futuro mais justo, mais sustentável e mais resiliente”.
O programa clama por “um novo contrato social” que seja centrado na igualdade racial, na justiça social e na proteção da natureza.
Segundo o documento, as “mudanças climáticas” exigem que “descarbonizemos a economia” e que o pensamento e o comportamento humano passem a estar “em harmonia com a natureza”.
O objetivo é construir “economias mais iguais, inclusivas e sustentáveis”.
Essa nova ordem mundial deve ser implementada “urgentemente”, pois a pandemia “deixou nua a insustentabilidade do nosso sistema”, que carece de “coesão social”.
Os defensores do Reinício afirmam que a ONU falhou em estabelecer ordem no mundo e não foi capaz de impor forçosamente sua agenda de desenvolvimento sustentável — conhecida como Agenda 2030 — por causa de sua maneira burocrática, lenta e contraditória de trabalho.
Por outro lado, as ações do comitê organizacional do Fórum Econômico Mundial são rápidas e inteligentes.
Quando um consenso é formado, ele pode ser rapidamente implantado pela elite global em todo o mundo.
Engenharia social
Esse projeto do Grande Reinício é engenharia social na mais pura definição do termo.
No entanto, vale ressaltar que a ideologia do Fórum Econômico Mundial não é nem de esquerda nem de direita, nem progressista e nem conservadora; também não é fascista ou comunista.
Ela é tecnocrática. Como tal, inclui muitos elementos de ideologias coletivistas anteriores.
Nas últimas décadas, o consenso que surgiu nas reuniões anuais de Davos é o de que o mundo precisa de uma revolução e que reformas sempre demoram muito tempo.
Por isso, seus membros querem uma profunda transformação a curto prazo.
O intervalo de tempo deve ser tão breve que a maioria das pessoas dificilmente perceberá que está acontecendo uma revolução.
A mudança deve ser tão rápida e dramática que aqueles que reconhecerem que uma revolução está acontecendo não terão tempo para se mobilizar contra ela.
A idéia básica do “Grande Reinício” é o mesmo princípio que conduziu as transformações radicais das revoluções francesa, russa e chinesa.
É a idéia do racionalismo construtivista incorporado ao estado.
Só que projetos como o “Grande Reinício” não oferecem resposta para a pergunta: quem governa o estado?
O próprio estado não governa.
Ele é apenas um instrumento de poder.
Não é o estado abstrato que decide, mas sim os líderes de partidos políticos específicos e de certos grupos sociais.
Os antigos regimes totalitários precisavam de execuções em massa e campos de concentração para manterem seu poder.
Hoje, acredita-se que, com a ajuda de novas tecnologias, os dissidentes poderão ser facilmente identificados e marginalizados.
Aqueles que não se ajustarem serão silenciados; opiniões que divirjam do “consenso da maioria” serão desqualificadas como moralmente desprezíveis (como já ocorre hoje).
Os lockdowns de 2020 possivelmente oferecem uma prévia de como esse sistema funciona.
O lockdown funcionou tão perfeitamente — no sentido de condicionar a população a adotar uma mentalidade bovina — que parece ter sido orquestrado — e talvez tenha sido.
Como se seguissem um único comando, os líderes de grandes e pequenas nações — de diferentes estágios de desenvolvimento econômico — implementaram medidas praticamente idênticas.
Muitos governos não apenas agiram em uníssono, como também aplicaram essas medidas com sem ter qualquer consideração pelas terríveis consequências de um bloqueio econômico global.
Meses de paralisia econômica imposta pelos estados destruíram a base econômica de milhões de famílias.
Conjuntamente com o distanciamento social, os lockdowns produziram uma massa de pessoas incapazes de cuidar de si mesmas.
Primeiro, os governos destruíram o direito ao próprio sustento; depois, os políticos (os próprios destruidores) se ofereceram como salvadores.
A demanda por assistência social não está mais limitada a grupos específicos, mas tornou-se uma necessidade das massas.
Antigamente, dizia-se que a guerra era o que alimentava e dava forças ao estado.
Agora, é o temor de doenças.
O que temos pela frente não é o aparente aconchego de um benevolente e abrangente estado de bem-estar social, com uma renda mínima garantida e assistência médica e educação para todos.
O lockdown e suas consequências trouxeram um aperitivo do que está por vir …
Um estado de permanente medo, de controle comportamental rigoroso, de perda maciça de empregos e de crescente dependência da “benevolência” de políticos.
Para concluir
Com as medidas tomadas no rastro da pandemia de Covid-19, foi dado um grande passo para “reiniciar” a economia global (nas palavras de seus próprios proponentes).
Se não houver resistência popular, o fim da pandemia não significará o fim dos lockdowns, das quarentenas e das medidas de distanciamento social.
No momento, porém, os oponentes dessa nova ordem mundial, organizada por uma tirania digital, ainda têm acesso à mídia e a plataformas para discordar.
No entanto, o tempo está se esgotando. Os criadores da nova ordem mundial são espertos.
Declarar o coronavírus como uma pandemia foi útil para promover a agenda de seu “Grande Reinício”.
Somente uma maciça e contínua oposição pode desacelerar e, quem sabe, interromper a ampliação do poder dessa tecnocracia tirânica que está em ascensão.
Antony Mueller é doutor pela Universidade de Erlangen-Nuremberg, Alemanha (FAU) e, desde 2008, professor de economia na Universidade Federal de Sergipe (UFS), onde ele atua também no Centro de Economia Aplicada. Antony Mueller é fundador do The Continental Economics Institute (CEI) e mantém em português os blogs Economia Nova e Sociologia econômica.
Fonte: Mises Brasil – O Instituto Ludwig von Mises – Brasil (“IMB”) é uma associação voltada à produção e à disseminação de estudos econômicos e de ciências sociais que promovam os princípios de livre mercado e de uma sociedade livre.
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