Relator da ação que contesta no Supremo Tribunal Federal (STF) a abrangência da Lei da Anistia aos torturadores do regime militar, o ministro Eros Grau recomendou o arquivamento da matéria no julgamento desta quarta-feira (28). Depois de mais de cinco horas, o julgamento foi paralisado pelo presidente do STF, ministro Cezar Peluso, e deve ser retomado nesta quinta-feira (29).
Na avaliação dele, a ação proposta pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) fere acordo histórico que permeou a luta por uma “anistia ampla, geral e irrestrita” e que o Judiciário não teria autorização para reescrever a história da Lei da Anistia. Da forma como foi proposta pela OAB, a matéria “reduziria a nada” a luta pela anistia travada ao final do período ditatorial, disse em seu voto.
Reduzir a nada essa luta, as passeatas duramente reprimidas pela polícia e os comícios é tripudiar os que com desassombro e coragem lutaram pela anistia na hora certa. Sem ela, não teria sido aberta a porta do colégio eleitoral para eleição do doutor Tancredo [Neves]”, argumentou Eros Grau. “A anistia é para ser concedida a pessoas indeterminadas e não a determinadas pessoas”, complementou.
O relator apresentou um parecer de 76 páginas em uma sessão que durou quase cinco horas no STF. Eros Grau terminou a leitura do voto com a mensagem: “É necessário não esquecermos para que as coisas não voltem a acontecer como foram no passado.”
A ação foi apresentada pela OAB, que questiona o perdão para crimes comuns praticados por agentes do governo durante a ditadura militar, como assassinatos, estupros, sequestros e torturas, entre outros delitos praticados.
A lei completou 30 anos em agosto de 2009 e é a primeira questão polêmica a ser julgada no plenário da Suprema Corte depois da posse do novo presidente, ministro Cezar Peluso, que substituiu Gilmar Mendes na última sexta-feira (23). Mendes deixou o comando do STF, mas continua no quadro de ministros da Corte.
A favor
Antes de Eros Grau apresentar seu parecer, entidades favoráveis e contrárias à ação apresentaram seus argumentos da tribuna do STF. Falando em nome da Ordem dos Advogados, o jurista Fábio Konder Comparato argumentou que a norma, da forma como foi aprovada há 30 anos, deixou sem punição autores de “crimes de incomum violência” e lembrou que a matéria foi aprovada por um “parlamento submisso”.
“É lícito e honesto que governantes e seus comandados que tenham cometido crimes de profunda violência sejam perdoados por uma lei votada por um Congresso submisso?”, questionou Comparato.
Contra
Já a Advocacia-Geral da União (AGU) procurou derrubar os argumentos favoráveis à ação da OAB. O advogado-geral da União, Luis Inácio Adams, sustentou que a Lei da Anistia foi um “ato de clemência”.
“Reconhecer a constitucionalidade da Lei de Anistia é diferente de compactuar com o cometimento de tais crimes. Anistia é ato político de clemência”, justificou o advogado-geral da União.
PGR
O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, fez coro com a AGU argumentando que o processo de construção da anistia “passou por um longo debate nacional”. “A sociedade articulou-se e marcou na história do país uma luta pela democracia pacífica e harmônica”, afirmou Gurgel.
O procurador-geral lembrou ainda discurso do ex-senador Franco Montoro, quando da aprovação da lei. “Esse não é o momento que se devam ascender divergências nem de saber quem atirou a primeira pedra. Chega de rancores, chega de ódios, anistia ampla, geral e irrestrita”, dizia Montoro.
Robson Bonin
Do G1, em Brasília