quinta-feira, 21/11/2024
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NÃO É LEGAL MANDAR CONTRIBUINTES PARA SERASA

Os nomes dos contribuintes inadimplentes com o Fisco serão enviados para a Serasa. A medida ­– que de certa forma já vinha sendo praticada pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), antes mesmo de ser regulamentada – agora será adotada como praxe nos casos de contribuintes cujos débitos não foram parcelados ou, ainda, que não estejam garantidos por penhora em execução fiscal.

A Serasa vendeu 65% do seu capital, em junho passado, ao Experian Group Limited, com sede em Dublin (Irlanda), operações em 36 países e clientes em mais de 65 outros. Esse é o maior grupo empresarial do mundo em análise de crédito. Tais créditos, todavia, não são os tributários do Estado, mas decorrentes de relações civis e comerciais, formadas por um conjunto de direitos e obrigações expressamente assentidos pelos contratantes. Assim, quando uma pessoa (física ou jurídica) assina um contrato ou, ainda, emite um título de crédito, ela o faz segura de que não cumprindo com sua obrigação correrá o risco de ter seu nome incluído no rol de devedores da Serasa.

Já o Fisco possui meios unilaterais – ou imperativos se preferirem –, de perseguir seus créditos tributários. Além disso, possui um arcabouço particular para constranger os contribuintes inadimplentes. Cite-se como exemplo a certidão negativa conjunta emitida pela Receita Federal e também pela PGFN, que deixa de ser expedida na existência de débitos, impedindo o contribuinte de participar de licitações e de obter créditos em instituições financeiras, entre outras situações. Há também a própria execução fiscal na qual o contribuinte somente pode apresentar defesa depois de suportar o pesado encargo de ter seus bens penhorados para garantir o futuro pagamento da dívida.

A nova prática de constrangimento dos contribuintes inadimplentes, além de desnecessária, poderá agravar ainda mais a situação daqueles que possuam débitos em discussão junto ao Fisco, porque a relação tributária é compulsória, o que afasta do contribuinte/cidadão o direito de escolha sobre assumir as obrigações de pagamento e, conseqüentemente, o risco de ter seu nome inscrito na Serasa, no caso de seu descumprimento.

O procedimento afronta o direito constitucional à ampla defesa, na medida em que o contribuinte é taxado como pessoa não merecedora de crédito, sem ter assumido antes esse risco e, ainda, antes mesmo de ter o direito de demonstrar que o Fisco não possui o crédito que alega ter.

A intenção da PGFN afronta o princípio da legalidade, pois as disposições do Código Tributário Nacional concernentes à dívida ativa (aquela proveniente do não pagamento de crédito tributário), não prevêem em nenhum momento a possibilidade de se incluir o nome do devedor de tais créditos na Serasa ou em qualquer outro sistema privado de proteção ao crédito. Como o Fisco só pode fazer ou deixar de fazer o que está previsto na Lei, a inscrição na Serasa dos contribuintes será ilegal.

Apesar da impertinência da medida, a insaciável gana do Fisco fará com que nomes de contribuintes sejam incluídos indevidamente na Serasa. E não há que se justificar essa medida com o alto índice de inadimplência dos contribuintes. Ainda que esse fato seja realidade, para o seu combate, basta que os órgãos de fiscalização e controle intensifiquem suas atuações, o que, aliás, não foge do leque de suas obrigações, no qual consta o princípio constitucional da eficiência da Administração Pública.

A inclusão de contribuinte nas listas da Serasa, a bem da verdade, inscreve-se como mais uma conveniência do Fisco no afã de compelir o contribuinte inadimplente ao pagamento do tributo, pois, como já ressaltado, essa inclusão pode dificultar a prática de atos civis e comerciais da pessoa cujo nome foi inscrito naquele rol.

Ademais, a remessa de nomes ao Serasa pode gerar danos naquelas hipóteses em que a dívida inscrita seja indevida e declarada como tal pelo Judiciário. Se isso ocorrer, ao contribuinte nascerá o direito de pleitear indenização por danos morais por ter seu nome inscrito indevidamente na Serasa, assim como, atualmente, diversas instituições financeiras são rés em ações indenizatórias, por incluírem erroneamente o nome de pessoas que adquiram seus produtos nos órgãos de proteção ao crédito.

Outra ilegalidade que vem sendo severamente criticada (e com razão) por renomados juristas consiste na transgressão ao direito de privacidade da pessoa. O inadimplemento de obrigações tributárias está alicerçado em uma relação jurídica entre o Estado e o contribuinte seja particular ou não (ultimamente, Municípios vêm sofrendo dificuldades com o Fisco Federal). Essa relação não deve interferir em outras relações jurídicas firmadas entre o contribuinte inadimplente e outros cidadãos particulares. Daí que a divulgação para uma empresa particular – no caso, a Serasa –, de um descumprimento de uma obrigação do contribuinte para com o Estado, ensejará a violação de sua privacidade. Ter-se-á uma empresa particular trabalhando e divulgando dados fornecidos pelo Estado em desfavor dos contribuintes.

A partir destas considerações podemos concluir que a adoção da medida terá conseqüências negativas para a economia e o desenvolvimento do País, já que visam, especificamente, dificultar as atividades de contribuintes inadimplentes. Esse efeito além de pernicioso para a economia será também pernicioso para o Fisco, já que restringir as atividades econômicas dos contribuintes, em dificuldades para o pagamento de suas dívidas, diminuirá as chances de recebimento. Além dessas previsões negativas, podemos afirmar, igualmente, que surgirão muitas situações em que o Fisco será condenado a indenizar contribuintes pelo abuso no manejo desse instrumento de proteção ao crédito, o que representará um duplo prejuízo para os contribuintes, eis que, como sempre, são eles que pagarão a conta, no final das contas.

Carlos Renato Lonel Alva Santos

Advogado da Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Advocacia, atua nas áreas do direito administrativo e tributário.

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Parmenas Alt
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