Diante do acordo fechado na segunda-feira, 20, para a renegociação das dívidas dos Estados com a União, as prefeituras iniciaram uma campanha para receberem o mesmo tratamento. Em carta, a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) reclama da exclusão das prefeituras nas rodadas de negociação e pede agora que o presidente em exercício Michel Temer (PMDB) abra um canal de diálogo. A principal demanda é resolução da dívida previdenciária dos municípios, que hoje supera R$ 100 bilhões, estima a CNM.
A entidade argumenta que o cálculo precisa ser revisto, uma vez que inclui dívidas prescritas e que continuam sendo cobradas. Antes, a Lei 8.212/1991 previa que débitos previdenciários seriam prescritos em dez anos, mas o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou o prazo inconstitucional em 2008. Assim, só poderiam ser cobradas dívidas de até cinco anos, como é a regra para passivos tributários.
Desde então, porém, a dívida previdenciária não foi revista, critica a CNM. Com a exclusão dos débitos prescritos, o recálculo de juros e a devolução do que foi pago de forma indevida, a cifra cairia a R$ 30 bilhões, diz a entidade.
Apesar da divergência, essa dívida segue sendo cobrada pela União por meio de bloqueios nos repasses do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), pagos em três parcelas por mês. No primeiro trimestre deste ano, 986 municípios (17,7% do total) tiveram pelo menos uma das parcelas zeradas, segundo levantamento da Confederação. Isso significa que uma parcela dos recursos ficou retida para o abatimento da dívida previdenciária. A prática também ocorreu entre 2013 e 2015.
Essa medida tem estrangulado o caixa dos municípios, que dependem dos recursos do fundo para pagar salários. Diante do aperto, algumas prefeituras têm dado prioridade às remunerações e ficado inadimplentes com a Previdência, o que cria uma bola de neve na dívida.
“Como os municípios estão priorizando salários, a situação está se aprofundando”, diz o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski. Ele reconhece, no entanto, que o fato de 2016 ser ano de eleições municipais dificulta a resolução do problema.
Os municípios também querem a renegociação das condições da dívida previdenciária. Isso porque a receita bloqueada no ano muitas vezes não paga sequer a parcela dos juros, o que faz o bolo crescer ainda mais. Grande parte dos débitos é atrelada à Selic, atualmente em 14,25% ao ano.
Entre os municípios que tiveram parcelas do FPM integralmente bloqueadas neste ano estão Campinas (SP) e Ribeirão Preto (SP), mas a maioria é formada por pequenas cidades, muitas vezes dependentes dos recursos federais. Ao todo, cerca de 4.900 dos 5.570 municípios têm dívidas previdenciárias, segundo a CNM.
Na carta, a confederação também pede que o governo federal regularize os repasses a programas sociais como o Bolsa Família. Segundo Ziulkoski, os pagamentos têm demorado a ocorrer, o que fragiliza ainda mais os caixas dos municípios, que são os responsáveis por operacionalizar os programas. “É uma pedalada permanente”, critica. Segundo ele, a aprovação da Desvinculação das Receitas da União (DRU), que elevou de 20% para 30% a fatia do Orçamento que a União pode direcionar livremente, foi “a pá de cal para enterrar as prefeituras”.
“Os municípios têm dificuldade muito maior que os Estados. O presidente colocou o fortalecimento de Estados e municípios, a criação de um novo pacto federativo, como prioridade. Mas achamos (a negociação recente) uma desconsideração com os municípios”, afirma Ziulkoski. “O governo convocou Estados, fez toda uma negociação, mas esqueceu os municípios.”
Ao contrário do que ocorreu com os Estados, a judicialização em relação a essas questões ainda é pequena devido à “desinformação” das próprias prefeituras. A confederação, por sua vez, não pode fazer uma representação unificada, explica Ziulkoski.