A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, propôs nesta terça-feira que a sociedade brasileira se mobilize para promover o que batizou de “Ação de Cidadania contra a Corrupção”, em uma referência à iniciativa criada nos anos 90 pelo ativista Herbert de Souza, o Betinho, para acabar com a fome.
“Ele [Betinho] disse: ‘Tenho fome de humanidade’. Nós hoje temos fome de justiça, de liberdade, mas principalmente da segurança de sabermos que podemos ter um Brasil muito melhor”, disse a ministra em evento organizado pela Rádio Jovem Pan na Zona Sul de São Paulo – antes dela, quem discursou foi o juiz Sergio Moro, responsável pelas ações da Operação Lava Jato na primeira instância em Curitiba.
“Precisamos dar resposta ao que a sociedade espera do Judiciário“, afirmou Cármen Lúcia, ressaltando que a corrupção “corrói as instituições, deteriora a política e descontrola a economia”. A presidente do STF também declarou que as práticas corruptas não podem ocorrer em nenhuma instância do Estado, principalmente no Judiciário, maior responsável por combatê-las, e ainda discorreu sobre a ética, dizendo que ela não é uma escolha do cidadão, mas a única forma de viver sem o caos.
Numa fala bem mais genérica – e poética – do que a de Moro, que criticou as propostas em discussão no Congresso para a reforma política, Cármen reiterou a necessidade de se mudar a forma de fazer política no Brasil e que não há soluções fora dela. “Não demonizo a política. Não acho que devemos viver fora dela”, disse a ministra.
Além da lembrança a Betinho, o discurso da autoridade máxima do Judiciário foi marcado por citações do poeta Fernando Pessoa, da filósofa Hannah Arendt e de referências ao seu estado natal, Minas Gerais.
No início de seu discurso, Cármen Lúcia lançou mão de diversas frases de efeito para pregar a conciliação. “Quero mudar o Brasil, não quero me mudar do Brasil. Este Brasil precisa de ser mudado. Precisa ser um país no qual a solidariedade, a fraternidade e as liberdades sejam devidamente respeitadas, o que não vem acontecendo”, disse a ministra.
A presidente do STF também abordou a questão feminina em sua fala. Afirmou que o Brasil tem leis eficientes e replicadas por outros países, como a Maria da Penha e a de improbidade administrativa, mas ponderou que há muita dificuldade em aplicá-las. Cármen Lúcia citou como exemplo o fato de que, apesar da legislação de proteção às mulheres, uma brasileira é estuprada a cada seis minutos.
Num momento de descontração no discurso, a ministra brincou com o seu hábito de falar muito. “Acho que pelo tempo que nós mulheres ficamos caladas, a gente sempre tem que ter direito de falar mais. Meu pai sempre dizia que eu só falava pouco no mês de fevereiro, porque o mês acabava antes de mim”, disse, arrancando risos da plateia.
Eduardo Gonçalves-Veja.Com