A trágica morte do candidato Eduardo Campos (PSB) na manhã de quarta-feira lança Marina Silva a uma realidade antes imponderável: a menos de uma semana do início da campanha de TV, ela terá de decidir se continua a caminhada de Campos, como sua sucessora, ou sepulta de uma vez por todas sua ambição pelo Palácio do Planalto. Diante de tal cenário, que colocou a disputa eleitoral de volta à estaca zero, o mercado se arma de incertezas. Fosse nas eleições passadas, o desaparecimento de um terceiro colocado nas pesquisas talvez não surtisse efeito representativo na avaliação dos investidores sobre as perspectivas para o país. Afinal, tanto a reeleição de Lula quanto a vitória de Dilma, em 2010, passaram praticamente incólumes ao olhar dos donos do dinheiro. Mas 2014 tem se mostrado um ano atípico: não só o mercado rechaça a reeleição da presidente Dilma Rousseff, como também responde com fortes oscilações a todo e qualquer acontecimento envolvendo o governo.
A resposta da BM&FBovespa à tragédia que se abateu sobre Campos foi emblemática. Em meio a rumores de que o avião estivesse ocupado tanto pelo candidato, quanto por sua vice, a Bolsa despencou cerca de 3% em questão de trinta minutos. Investidores se mostraram apreensivos com a possibilidade de não haver um terceiro candidato de peso — o que abriria mais espaço para uma vitória do PT sobre Aécio Neves (PSDB) no primeiro turno. A confirmação da ausência de Marina no voo fez a Bolsa reduzir as perdas e operar no azul por alguns minutos, antes de voltar a recuar, fechando em queda de 1,5%. Na avaliação do economista Gesner Oliveira, sócio da GO Associados, ainda é cedo para traçar cenários precisos, mas a força de uma provável candidatura de Marina transforma o jogo eleitoral daqui para frente. “A entrada da Marina muda não só as perspectivas para o primeiro turno, mas também para o segundo. Ironicamente, ao se tornar candidata numa circunstância de comoção nacional, Marina pode se fortalecer mais do que se tivesse sido escolhida lá atrás”, afirma.
Uma candidatura de Marina mais forte que a de Campos é a avaliação de todos os analistas ouvidos pelo site de VEJA nesta quarta-feira. Para João Augusto de Castro Neves, da consultoria Eurasia, a vice do PSB tem potencial, inclusive, de ir para o segundo turno com Dilma Rousseff, no lugar do candidato tucano, cenário pouco provável no caso de Campos. “Num hipotético segundo turno entre Dilma e Marina, os votos de Aécio são herdados por Marina, que também consegue pegar mais votos dos indecisos. Já o Aécio não herdaria tantos votos do PSB”, afirma Castro Neves. A Eurasia colocou em revisão sua análise eleitoral para o Brasil, mas ainda não divulgou se sua estimativa de vitória de Dilma, reafirmada até o relatório mais recente, se manterá. “O cenário ficou muito mais complexo”, diz o economista. Para Castro Neves, há uma discrepância entre a avaliação do mercado e dos eleitores sobre o pleito eleitoral. Aécio, segundo ele, continua como favorito dos investidores. Marina, se confirmar sua candidatura, vem em segundo lugar, enquanto Dilma permanece como a escolha a ser evitada. “O mercado tem uma opinião muito extrema de sucesso absoluto com Aécio e caos total com Dilma. O que, na realidade, não deve se concretizar”, diz.
Apesar da preferência por Aécio, o mercado parece não demonstrar apreensão ao ser confrontado com as convicções econômicas de Marina. Apesar de conflitos ideológicos com setores da economia, em especial o agronegócio, a vice de Campos levou para a campanha eleitoral um time heterogêneo de economistas que agradou investidores. Ele é capitaneado por Eduardo Giannetti da Fonseca e André Lara Resende — este último, um dos criadores do Plano Real. “Já faz algum tempo que a avaliação do mercado é positiva em relação a ela. A Marina mostra uma perspectiva de renovação e o mercado já deu sinais de que quer mudança”, afirma Oliveira, da GO Associados. Segundo o economista, no entanto, os desafios macroeconômicos que se formaram ao longo dos últimos anos, também conhecidos como a ‘herança maldita’ de Dilma, devem se sobrepor a qualquer plano de governo. “Tendo em vista o aconselhamento econômico de Marina e os desafios que se mostram adiante, algumas medidas serão inevitáveis tanto para ela quanto para Dilma e Aécio, como conter a deterioração fiscal, reajustar tarifas e tentar reconquistar a confiança do setor privado”.
Marina tem dez dias para protocolar sua substituição a Eduardo Campos junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Até lá, ao menos duas pesquisas serão divulgadas apontando intenções de voto numa hipotética candidatura da vice à Presidência da República. Seu potencial de definir o pleito poderá ser notado, sobretudo, no Sudeste, especialmente em São Paulo e Rio de Janeiro, onde teve desempenho acima da média nas eleições de 2010. Segundo Rafael Cortez, da Tendências, este é um ponto de atenção para os tucanos, já que, ainda no primeiro turno, Marina poderia angariar votos tanto de eleitores de Dilma quanto de Aécio. “Ela tem uma importante base de eleitores em Minas. E esse é o campo do Aécio, onde ele é mais forte. Se ela pode tirar força de Dilma, certamente também representa risco para a oposição”.
Revista VEJA