A senadora Marina Silva, pré-candidata à Presidência pelo Partido Verde (PV), disse que a possível saída do deputado Ciro Gomes (PSB-CE) da disputa presidencial é uma perda para o país e para a democracia. “Perde o país. Perde a democracia”, disse Marina Silva em Washington, onde participa das celebrações do Dia da Terra, no domingo.
O PSB deverá anunciar na terça-feira sua posição na disputa eleitoral. Na sexta-feira, uma reportagem do jornal Folha de S. Paulo afirmou que o partido já teria desistido de lançar a candidatura de Ciro Gomes, em favor de uma aliança com o PT, que tem como candidata a ex-ministra da Casa Civil Dilma Rousseff.
“Eu acho que em uma democracia, e principalmente em uma eleição em dois turnos, o importante é que as pessoas possam ter o maior leque de propostas, de projetos políticos, e de representantes desses projetos”, disse a senadora.
“E a operação de guerra que foi feita para inviabilizar a candidatura do Ciro Gomes é uma demonstração de que muitas vezes as pessoas falam da democracia no discurso, mas na hora de se comprometer com a sua efetividade, se isso pode arriscar seus projetos de poder, não sabendo lidar adequadamente com a alternância de poder, aí vêm as velhas formas de operar para eliminar possíveis concorrentes.”
Marina Silva criticou o tom plebiscitário da campanha e as comparações entre os governos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e entre os currículos de Dilma Rousseff e do ex-governador de São Paulo, José Serra (PSDB).
“A campanha estava na direção, e ainda estão tentando fazer isso, inclusive agora, com a inviabilização da candidatura de Ciro Gomes, que seja um plebiscito. E eu estou insistindo que não seja um plebiscito, que seja um processo político”, afirmou.
“Depois, é a história do embate, entre o passado do Fernando Henrique e o passado do presidente Lula, o embate entre o currículo da ministra Dilma e o currículo do governador Serra. E eu estou propondo que se faça um debate sobre as questões relevantes para o Brasil e um diálogo com a sociedade brasileira”, disse.
Questão ambiental
Durante os três dias de visita à capital americana, a pré-candidata do PV, que foi ministra do Meio Ambiente do presidente Lula, vai se encontrar com representantes do governo americano, empresários e personalidades ligadas à questão ambiental.
Neste sábado, a agenda de Marina Silva inclui uma reunião com a chefe da Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA, na sigla em inglês), Lisa Jackson. No domingo, ela fará um discurso nas comemorações do 40° Dia da Terra.
A senadora também vai se reunir com o cineasta James Cameron, diretor de Avatar, que recentemente esteve no Brasil em manifestações contra a construção da Usina de Belo Monte.
Marina Silva voltou a criticar o projeto de construção da usina de Belo Monte, que deve ser instalada na bacia do Rio Xingu, no Pará, e citou os questionamentos ambientais e de viabilidade econômica ligados ao empreendimento.
“É muito estranha a insistência do governo de fazer o leilão e dar curso a um processo que há 20 anos vem sendo questionado, que os questionamentos só se agravam, e se agravam agora inclusive naquilo em que eles achavam que era o forte, que é a viabilidade econômica”, disse.
Em entrevista a jornalistas brasileiros em Washington, Marina Silva disse que é “fundamental” apoiar as iniciativas do governo de Barack Obama na questão ambiental, depois de “quase 10 anos perdidos com o governo de George W. Bush”.
“A minha presença aqui tem muito esse sentido da parceria. Porque a questão climática não se resolve a partir de um país, de um governo isoladamente, ela se resolve no plano de esforços multilaterais”, disse.
Irã
A senadora também fez críticas à aproximação do governo brasileiro com o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad.
“A nossa posição é de crítica e de estranhamento em relação à atitude do governo brasileiro. É a única democracia ocidental que tem dado audiência pro Ahmadinejad”, disse Marina Silva.
O Irã sofre pressões dos Estados Unidos e de outros países para interromper seu programa de enriquecimento de urânio. Esses países temem que Teerã busque desenvolver armas atômicas, alegação que o governo iraniano nega.
“O Brasil, no meu entendimento, tem tido uma atitude preocupante. O Irã tem desrespeitado os direitos humanos”, disse Marina Silva.
“E aí vem outras questões. Por exemplo, a atitude do Brasil de ainda não ter assinado o protocolo adicional do Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP), (que) é algo que também faz com que o Brasil fique numa situação bastante delicada”, afirmou.
O Brasil é signatário do TNP, mas não do protocolo adicional, que prevê maior acesso da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) a instalações nucleares no país.
Apesar das críticas, a senadora disse que em vários aspectos houve avanços na política externa brasileira, que passou a olhar para regiões que nunca haviam sido valorizadas, como a África.
Preconceito e religião
A atuação de Marina Silva na questão ambiental e sua trajetória, de uma infância pobre em um seringal até o Congresso, costumam chamar a atenção da imprensa internacional.
Nesta semana, a revista britânica The Economist publicou um perfil sobre a pré-candidata, em que afirma que ela tem “princípios demais para ser jogada na briga eleitoral”.
A imprensa americana já afirmou que Marina Silva, se eleita, seria a primeira mulher e primeira negra a presidir o Brasil. Questionada sobre essa bandeira, a pré-candidata disse que sempre se considerou negra, mas que essa discussão deve entrar “no conjunto das ações de um país como o Brasil, que tem o desafio histórico de reparar em relação aos negros e em relação aos índios”.
Marina Silva, que é evangélica, disse que nunca foi alvo de preconceito por ser negra ou mulher, mas sim por sua religião. “Nunca me senti sofrendo preconceito em função de ser negra ou ser mulher”, afirmou. “Eu tenho identificado isso nos últimos 13 anos em função da minha posição espiritual, o que é muito estranho, as pessoas parecem que a priori já querem te rotular, me parece aí sim um viés de preconceito religioso.”
Questionada sobre o papel de sua religião na disputa pela Presidência, a senadora disse que “o fato de ser cristão, evangélico ou católico, não significa que você queira utilizar a condição de agente público para promover qualquer credo religioso”.
“O Estado brasileiro é um estado laico, e graças a esse Estado laico os evangélicos foram favorecidos. Agora, Estado laico não é Estado ateu, é exatamente para favorecer a posição de crentes e não-crentes”, disse.
TERRA
Alessandra Corrêa