Rapidez na tomada de decisões não foi o ponto forte do primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Muito dessa lentidão pode ser atribuído ao hábito de criar grupo de trabalho, instituição conhecida pela sigla GT. Para qualquer assunto, o governo saca um.
Problemas com a pesca da sardinha? Está criado um GT. Com o camarão? Mais um. Há muitos alcoólatras sendo atendidos pelo SUS? Outro. Machado de Assis não é tão lido? Um GT resolve. Os negros não têm empregos? Taí o GT. Pesquisa feita pelo Estado no Diário Oficial da União de 2003 até ontem mostra que no governo Lula foram criados 96 grupos de trabalho, a maioria deles sem grande resultado para mostrar.
Os GTs proliferaram principalmente nos 30 primeiros meses do governo Lula, coincidindo justamente com o período em que José Dirceu foi ministro da Casa Civil. Isso pode justificar um pouco a fama de concentrador de poder que Dirceu carrega, porque todo GT envolve um grande número de ministérios sob o comando da Casa Civil. O que cuidou dos problemas da população de Alcântara (MA) tinha 20 ministérios, mais o Comando da Aeronáutica. Na gestão de Dirceu, foram criados 77. Quando Dilma Rousseff assumiu o lugar do ex-ministro, em 22 de junho de 2005, ela acabou com a fúria criadora de grupos de trabalho. Em toda sua gestão, foram abertos 19.
Podem até não ser uma invenção do PT, mas os grupos de trabalho foram levados para o núcleo de decisão do governo federal pelos petistas. Pesquisa feita nos decretos publicados pelo Diário Oficial da União de janeiro de 1999 a dezembro de 2002 (segundo governo de Fernando Henrique Cardoso) demonstra que não foi criado um único GT no período. Parecido há apenas um grupo executivo (GE), de 22 de outubro de 1999. Tinha por função estudar formas de assentar famílias desalojadas pela Barragem da Hidrelétrica de Itaparica, no Rio São Francisco, divisa entre Bahia e Pernambuco.
FUNDEB
Muitos dos GTs constituídos durante a gestão de Dirceu não sensibilizaram sua sucessora. Foram simplesmente esquecidos e nunca encerraram seus trabalhos. Outros chegaram a bom termo. Fizeram sugestões importantes de emendas constitucionais ou projetos de lei – e, em alguns casos, a proposta foi aprovada, como a que criou o Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). Mas, mesmo nesses casos, dá para ver que o GT é um indutor da avassaladora força da burocracia que tem assustado Lula nos últimos meses. O caso do Fundeb é um exemplo. O GT levou mais de dois anos para apresentar conclusões – as mesmas a que chegara o então ministro da Educação, Cristovam Buarque, em 2003.
Chamou muito a atenção a criação, em janeiro de 2005, de um grupo para cuidar da “tomada de decisão sobre a gestão do uso sustentável da sardinha verdadeira (Sardinella brasiliensis)”, que envolveu três ministérios, a Secretaria da Pesca e a Agência Nacional de Águas.
O que poderia ser resolvido com menos burocracia se arrastou por mais de um ano, até que os integrantes do grupo decidiram encarregar o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) de cuidar da questão.
ACORDO
“Fizemos um acordo com os pescadores, de forma que a pesca da sardinha é suspensa por 120 dias, para a reprodução, e por mais 50 dias, chamados de período de recrutamento”, conta Rômulo Mello, diretor de Fauna e Recursos Pesqueiros do Ibama. Segundo ele, o acordo tem dado resultados e hoje a pesca da sardinha poderá ser assentada em uma quantidade ainda não definida, mas que poderá ficar entre 80 mil e 100 mil toneladas/ano. Em 1978, o Brasil pescou 230 mil toneladas de sardinha, mas, sem critério, os cardumes rarearam, caindo em seguida para 30 mil toneladas/ano, o que pôs em risco a sobrevivência da espécie e ameaçou comprometer a própria atividade pesqueira.
Com as medidas tomadas, os cardumes de sardinha voltaram a crescer. O mesmo acontece com a lagosta. Depois de mais de um ano de discussão no GT, concluiu-se que o crustáceo só deve ser pescado a no mínimo 4 milhas da costa. E, a partir de agora, somente será autorizada a pesca da lagosta por barcos que tenham no mínimo 4 metros, respeitado o período de reprodução. Com isso, o Brasil tem conseguido pescar 6 mil toneladas de lagosta, o principal produto de exportação da pesca do País.
OE
João Domingos