Procurada a se manifestar por entidades ligadas ao meio ambiente, a DPU emitiu nota técnica em que aponta a inconstitucionalidade e grave violação de direitos humanos na lei estadual que proíbe, por cinco anos, o transporte, armazenamento e comercialização
Prevista na Lei Ordinária nº 12.197/2023, a proibição do transporte, armazenamento e comercialização de pescado pelo período de cinco anos é inconstitucional. É o que aponta a Defensoria Pública da União (DPU), por intermédio da Defensoria Regional de Direitos Humanos em Mato Grosso (DRDH/MT), que emitiu nota técnica sobre a legislação estadual sancionada em julho passado pelo governador Mauro Mendes (União).
Conhecida como “Transporte Zero”, a norma começa a valer a partir de 1º de janeiro de 2024. Com a proibição, a pesca somente será permitida nas modalidades pesque e solte; captura de peixes às margens dos rios para consumo no local; e captura para subsistência ou para consumo próprio. Na prática, ficarão proibidas a pesca profissional artesanal e a pesca como profissão e como modo de vida tradicional. Cerca de 16 mil pescadores atuam na pesca artesanal no Estado.
“É evidente a incompatibilidade da Lei nº 12.197/2023 com a Constituição Federal de 1988, com diversas leis federais e tratados internacionais de direitos humanos. Além disso, verifica-se que a Lei nº 12.197/2023 gera uma grave violação de direitos humanos”, traz a nota técnica assinada pela defensora nacional de direitos humanos, Carolina Soares Castelliano Lucena de Castro, e pelo defensor regional de direitos humanos em Mato Grosso, Renan Sotto Mayor.
Além da inconstitucionalidade, o entendimento é de que a proposta representa “grave violação de direitos humanos no texto legislativo”. “A citada lei gera uma grave violação de direitos no Estado de Mato Grosso, afetando milhares de pescadores e seus familiares, a economia local, e, principalmente, o modo de vida específico de povos e comunidades tradicionais que utilizam a pesca como fonte de renda”, reforça.
Entre outras violações, o documento sinaliza que a lei estadual gera dano existencial, proíbe o exercício de uma profissão lícita e fundamental ao estado do Mato Grosso, extingue a cultura do povo mato-grossense e restringe o direito à aposentadoria dos pescadores artesanais, que são segurados especiais do Regime Geral de Previdência Social (RGPS).
A DPU foi procurada para se manifestar sobre a lei por diversas organizações da sociedade civil, como a WWF-Brasil; a Operação Amazônia Nativa (Opan); o Fórum Mato-Grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Formad); o Observatório Socioambiental de Mato Grosso (Observa-MT); a Rede de Comunidades Tradicionais Pantaneira; e o Instituto Centro de Vida (ICV).
OUTRO LADO – Desde a apresentação da lei, o governo de Mato Grosso tem justificado que o objetivo é combater a pesca predatória nos rios do Estado. Pela nova norma, durante três anos, o Estado pagará auxílio de um salário mínimo por mês para pescadores profissionais e artesanais inscritos no Registro Estadual de Pescadores Profissionais (Repesca) e no Registro Geral de Pesca (RGP).
Eles terão que comprovar residência fixa em Mato Grosso e que a pesca artesanal era sua profissão exclusiva e principal meio de subsistência até a lei entrar em vigor. O auxílio não será pago nos meses de piracema, considerando que os beneficiários já são atendidos pela Lei Federal n. 10.779/2003.
O Governo do Estado também vai promover a inserção dos pescadores em programas de qualificação da Secretaria de Estado de Assistência Social e Cidadania para o turismo ecológico e pesqueiro, e de produção sustentável da aquicultura.
A lei ainda prevê a instituição de uma linha de financiamento, por meio da agência de fomento “Desenvolve MT”, destinada aos pescadores beneficiados com o auxílio financeiro do “Transporte Zero”.
Fonte: DiáriodeCuibá