Investigações da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro identificaram quatro criminosos recolhidos na Penitenciária Major Eldo de Sá Correia (Mata Grande), em Rondonópolis (212 km ao Sul), como articuladores e operadores do golpe conhecido por “Falso Médico”, que pode ter enganado cerca de 500 vítimas, parentes de pacientes internados em hospitais do Brasil. O lucro obtido com a execução do golpe está na ordem de 200 mil, por mês.
A operação denominada “Hígia”, comandada pela 12ª Delegacia de Polícia de Copacabana (RJ), por meio do delegado titular da unidade, Gabriel Ferrando de Almeida e equipe, que estão em Rondonópolis, cumpriu oito mandados de prisão, sendo quatro contra presidiários da Mata Grande e quatro em desfavor de pessoas suspeitas de auxiliarem do lado de fora as ações criminosas.
As ordens judiciais foram cumpridas na tarde de quarta-feira (26) e na última quinta-feira (27), na ação que contou com o apoio da Polícia Judiciária Civil de Mato Grosso, por meio da Diretoria de Inteligência e Delegacia de Roubos e Furtos de Rondonópolis, e o Sistema Penitenciário da Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos (Sedjud).
O detento Wadson Sales Leonel foi apontado na investigação como o chefe da organização criminosa. Ele atuava se passando por médico, na captação de informações de hospitais e pacientes. O criminoso era auxiliado por Thiago Espíndola Oliveira, Wesley Vieira de Jesus e Iago Kairon Gomes da Silva, todos presos na mesma cela, no Raio I, junto ao “cabeça” Wadson.
Do lado de fora contavam com apoio de Simone Vieira de Jesus (mulher de Wadson), que também buscava informações de hospitais, captação de contas correntes e fornecimento de créditos para os celulares e recebia o dinheiro do golpe. Também integrava a organização: Kamila Ribeiro Nogueira (companheira de Wesley), Anabela Alves e Wester Honorato da Silva, nas funções de captar contas correntes, coordenar os saques e fornecer créditos para os celulares.
Em buscas na unidade prisional, os policiais apreenderam cinco celulares, 15 cadernos de anotações diversas como contas correntes e telefones de vítimas. O texto que os criminosos liam para as vítimas foi encontrado dentro de uma caixa de cotonetes.
Por telefone os detentos conseguiram enganar vítimas em várias localidades do Brasil, cobrando dinheiro para realização de exames de urgência. O delegado da 12ª DP do Rio de Janeiro, Gabriel Ferrando de Almeida, informou que há seis meses os investigadores vinham trabalhando na identificação dos autores, que estão presos no presídio mato-grossense.
Conforme o delegado, a apuração do setor de busca eletrônica da 12ª DP de Copacabana utilizou técnicas e medida cautelares, mediante prévia ordem judicial, na investigação, chegando ao monitoramento de 95 mil chamadas telefônicas, que totalizaram 1.930 horas de ligações. Foram interceptados 52 ramais telefônicos utilizados pelos criminosos.
Segundo a investigação, as vítimas dos criminosos são pacientes e hospitais localizados em diversos Estados do Brasil, tais como São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio Grande do Norte, Santa Catarina. O golpe tem abrangência nacional.
“Todos os partícipes possuem origem em Rondonópolis, sendo considerada a quadrilha mais especializada na execução dessa modalidade de fraude. Não se descarta o indiciamento, ao término das investigações, dos proprietários das contas correntes movimentadas pela quadrilha, fator este que pode aumentar consideravelmente o número de indiciados na investigação”, declarou o delegado Gabriel Ferrando.
Como agiam
A organização criminosa especializada na prática de inúmeros crimes de estelionatos voltados a familiares de pacientes internados em hospitais. Os criminosos, diante do acesso privilegiado a informações de pacientes internados, tais como dados pessoais, contato de familiares e tipo de plano de saúde, contatavam familiares noticiando um suposto procedimento médico de caráter emergencial, que deveria ser empregado no paciente internado. Diante da urgência da medida, parentes deveriam realizar depósitos em contas bancárias para que fosse viabilizado a realização do exame ou procedimento médico noticiado.
Os criminosos se valiam das informações e da vulnerabilidade das vítimas na aplicação dos golpes. Eles entravam em contato com pessoas do círculo íntimo de enfermos, noticiando um aparente agravamento do quadro médico e uma situação de urgência na realização de exames médicos, para qual cobravam o pagamento via depósito prévio em dinheiro. Na ocasião da ligação, uma conta bancária era informada para depósito por parte das vítimas.
A investigação apurou que o golpe tinha três etapas distintas. A primeira era a captação de informações pessoais de pacientes junto aos hospitais. A segunda a obtenção de contas correntes de terceiros (aluguel de contas bancárias), para depósitos por parte das vítimas e a terceira era a própria execução do golpe, mediante ligações telefônicas realizadas por criminosos, os quais adotavam um articulado enredo com o objetivo de ludibriar as vítimas e obter a indevida vantagem econômica.
Para os policiais, a rede hospitalar, de certa forma, também figurou como vítima do delito, tendo em vista que as informações eram obtidas dos hospitais mediante, também, o emprego de fraude, tendo em vista que os criminosos se especializaram em se passar por médicos para extrair informações de pacientes internados. Logo, apurou-se que funcionários dos hospitais eram induzidos a erro a fornecer informações a falsos médicos. Não foram identificados funcionários coniventes com a organização criminosa.
“Todas as etapas do golpe foram devidamente documentadas ao longo da investigação”, afirmou o delegado Gabriel.
Golpista em Rondonópolis
O presidiário, Wadson Sales Leonel, apontado como articulador dos golpes, é um criminoso que está preso por latrocínio, roubo e homicídios, sendo bastante conhecido dos policiais da Delegacia de Roubos e Furtos (Derf) de Rondonópolis, que efetuaram prisões contra ele anteriormente.
O delegado, Gustavo Belão, adjunto da Derf Rondonópolis, disse que os golpes não param. Logo que uma modalidade fica conhecida e as pessoas são orientadas quanto aquele delito, os criminosos inovam mudando o tipo do golpe. Um dos mais recentes, que gerou duas prisões pela Polícia Civil, é o da falsa transferência bancária.
“Já realizamos prisões de crimes de estelionato sendo aplicado por presos. A compra e venda de produtos pela internet vem sendo usada pelos golpistas, que ao mandar a foto do extrato, a vítima a acredita e entrega o produto”, disse. “A orientação é conferir no banco e do falso médico ligar no hospital e confirmar se há mesmo aquele agravamento do paciente”, orienta
Integração
A troca de informações e cooperação em ações policiais de outras unidades da federação são práticas adotadas pela filosofia de trabalho da Polícia Judiciária Civil de Mato Grosso. Assim como conta com a colaboração em ações e investigações de alcance em outros estados, presta apoio nas atividades desenvolvidas por outras Polícias Civis e demais forças policiais do Brasil, quando solicitada.
“Em várias operações temos demonstrado o êxito e a Inteligência tem trabalhado para fomentar as parcerias”, disse o delegado Coordenador de Inteligência, Luiz Henrique de Oliveira.
Na investigação do Rio de Janeiro atuaram no suporte o Laboratório de Tecnologia contra a Lavagem de Dinheiro do RJ, Polícia Civil do Estado do Mato Grosso, pela Delegacia Especializada de Roubos e Furtos (Derf e pela Diretoria de Inteligência e a Diretoria Geral, e o Núcleo de Inteligência do Presídio de Mata Grande.
Nome
Hígia, na mitologia grega, era a filha de Esculápio. Era a deusa da saúde, limpeza e sanidade (e posteriormente: a Lua). O aludido nome foi escolhido tendo em vista o alvo da operação, que é desbaratar uma quadrilha de fraudadores que visavam pacientes internados na mais variadas redes hospitalares existentes pelo país.