A aparente ameaça de um cenário que aponta para um segundo turno entre Lula (PT) e Bolsonaro (PSC) nas eleições de 2018 acendeu o sinal de alerta nos partidos que convergem para o centro – esquerda ou direita. Por isso, nos últimos dias, foi deflagrada nos bastidores uma articulação destinada a encontrar um nome de consenso capaz de unir PMDB, PSDB, DEM, PPS, PSB, PP, PR, PRB, PV.
Dirigentes destas legendas concordam que a pulverização de candidaturas, hoje situadas na órbita do governo, aplaina o caminho para uma polarização entre Lula e Bolsonaro, ambos na dianteira das intenções de voto com 35% e 16% respectivamente. A estratégia, até então restrita às reuniões intramuros entre as cúpulas partidárias, foi verbalizada na terça-feira 31.
Em clima de campanha, o prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), desembarcou no Rio de Janeiro e aproveitou a agenda para dar seu aval ao projeto político, ao qual classificou de “frente ampla de partidos de centro”. “Se nós, que temos uma posição central para salvar o Brasil, não estivermos unidos, quem ganhará a eleição será um extremista, de esquerda ou de direita”, alertou.
Ideia gestada no planalto
A ideia original dessa espécie de terceira via partiu inicialmente do presidente da República, Michel Temer, preocupado em buscar um nome que dê continuidade aos projetos iniciados em seu governo. Temer acredita que o candidato da base aliada terá a campanha facilitada pelos indicadores que apontam a recuperação da economia e a garantia de geração de empregos em 2018. Aposta na resposta dos eleitores ao êxito de seus programas de modernização.
Doria, pelo visto, também joga suas fichas na mesma perspectiva. Ao defender o candidato único de partidos de centro, deixou claro que leva como certa a participação do PSDB nesta frente. Fontes ligadas ao governo concordam com o prefeito e vão ainda mais longe: afirmam que, sem o apoio dos tucanos, a união dos partidos da base será inviável.
“Se nós, que temos uma posição central para salvar o Brasil,
não nos unirmos, quem ganhará a eleição será um extremista”
João Doria, prefeito de São Paulo
O projeto alimentado por Temer não terá necessariamente o prefeito de São Paulo na cabeça da chapa, já que Doria precisa primeiro resolver sua disputa interna com o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. Só depois de resolvido o atual impasse, se saberá quem será escolhido como o candidato do PSDB à Presidência em 2018. Uma alternativa de Doria poderia ser a troca de legenda.
Em vez de disputar desgastantes e incertas prévias com Alckmin, haveria a opção de se filiar ao DEM ou ao próprio PMDB de Temer. No campo governista, Doria ou qualquer outro candidato do PSDB ou mesmo do PMDB, na verdade, enfrentaria um adversário poderoso no interior da base aliada.
O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, hoje filiado ao PSD, tem manifestado a vontade de se lançar candidato à sucessão de seu chefe no ano que vem. Como os dois estão de olho na mesma chapa, o PMDB teria de escolher um nome para compor com o PSDB. Portanto, a novela só trocaria de personagens, mas continuaria com final indefinido.
Sem entrar na discussão sobre quem seria o cabeça de chapa da coligação aliada, Doria defende a ideia da frente única como única arma capaz de evitar a polarização Lula e Bolsonaro. Assim, deixa claro que quer compor, não dividir. O candidato se resolve mais adiante. Que pode até ser ele, inclusive.
A preocupação do tucano toma por base as recentes pesquisas sobre intenções de voto para a Presidência. Tanto o instituto Datafolha quanto o Ibope indicam um segundo turno entre o ex-presidente Lula e o deputado Jair Bolsonaro. Se tudo permanecer como está, ou seja, com os partidos do espectro governista divididos, o quadro tende a se consolidar. Daí a forte preocupação dos caciques de PMDB, PSDB, DEM, PPS, PSB e de mais quatro partidos da base governista – temor este que, nos últimos dias, também passou a reinar no mercado e no meio empresarial.
Nos cenários estimulados pelas pesquisas, nos quais os entrevistadores apresentam uma lista de possíveis candidatos ao Planalto, Lula aparece à frente, e sempre seguido por Bolsonaro. No Datafolha, Lula soma 36%, contra 16% de Bolsonaro. Já no Ibope, o resultado é 35% para Lula e 13% para Bolsonaro. Os demais, Marina, Alckmin, Doria, Ciro e Luciano Huck, aparecem distantes.
A frente única defendida por Temer e Doria, portanto, poder ser uma solução, mais ainda se as posições de Lula e Bolsonaro se cristalizarem nas próximas pesquisas. Resta saber se os interesses dos partidos, de fato, vão convergir. É o que questiona David Fleischer, cientista político da UnB.
Para ele, uma composição entre PMDB e PSDB para a disputa sucessória poderia não interessar a Alckmin. “Dificilmente o Alckmin seria escolhido pela articulação de centro. Ele é frio, não sorri. Não possui um discurso amigável. Já a grande vantagem do Doria é ser classificado como um outsider”, analisa Fleischer.
Outra desvantagem de Alckmin é que as recentes pesquisas apontam um forte desgaste do chamado PSDB tradicional. Por isso, há que se aguardar a frente única tornar-se real. Seria, de fato, uma saída alternativa aos extremos, hoje personificados por Lula e Bolsonaro, e um caminho para o salutar debate democrático.
Tucanos não se bicam
O PSDB volta a viver uma rotina de brigas internas que só compromete sua já desgastada imagem. A última confusão envolveu deputados mineiros, ligados ao senador Aécio Neves, e o presidente da sigla, Tasso Jereissati.
O motivo da crise foi a contratação da empresa Ideia Big Data para criar um plano de ação nas redes sociais. A escolha irritou a ala mineira do PSDB, porque o dono da empresa foi responsável pela campanha do petista Fernando Pimentel.
Além disso,a ideia do PSDB de repetir velhas fórmulas, colocando como candidato Geraldo Alckmin, que não empolga e já foi derrotado para presidente, incomoda as alas do partido que anseiam por renovação e sabem que, nas próximas eleições, aquela agremiação que representar o novo deve levar a disputa.
Fonte:IstoÉ/Ary Filgueira