O governo Luiz Inácio Lula da Silva investiu R$ 4,9 bilhões na manutenção das rodovias federais (as BRs) desde 2003, mas não conseguiu deixá-las em boa condição de tráfego – 69% dos trechos estão em condição ruim ou regular. A União tem engordado ano a ano seus gastos com a manutenção dessas estradas. Decisões do Tribunal de Contas da União (TCU) indicam, no entanto, que o governo gasta muito e mal quando o assunto são as rodovias federais. Os problemas apontados pelo TCU são muitos: falta planejamento para as obras, os contratos são freqüentemente superfaturados, falta fiscalização e punição para os desvios, além de não haver prioridades definidas para os investimentos.
Na atual gestão, os recursos empregados na manutenção da malha saltaram de R$ 471,9 milhões (em 2003) para quase R$ 2 bilhões (em 2006), segundo levantamento feito no sistema de execução orçamentária federal, a pedido do Estado. Os resultados do maior aporte são questionáveis. O maior exemplo disso foi a operação tapa-buracos, deflagrada em janeiro deste ano, ao custo aproximado de R$ 500 milhões, para recuperar 27 mil quilômetros de estradas. Na ocasião, o presidente foi acusado pela oposição de fazer uso eleitoral da iniciativa e ainda teve os contratos devassados por técnicos do TCU. Concluiu-se que a operação foi um desperdício de dinheiro, pois havia custos superestimados, uso de material de má qualidade – boa parte do asfalto voltou a apresentar problemas após pouco tempo – e faltava fiscalização das obras.
Numa análise feita nos 101 contratos da operação tapa-buracos, em 48 foram encontrados indícios de “irregularidades graves”, na avaliação do TCU. No Paraná, o Ministério Público chegou a pedir a paralisação da operação em três trechos da BR-476 – equivalentes a 70 quilômetros de obras – por problemas de “sobrepreço, dispensa de licitação injustificada, pagamentos de serviços não-realizados e inexistência de projeto básico”, entre outros problemas. Em Mato Grosso, o TCU descobriu que o contrato para a recuperação de dois trechos da malha – relativos à BR-070 e à BR-174 – foi assinado somente após as obras serem executadas.
Levantamento divulgado pelo Departamento Nacional de Transportes (Dnit) sustenta que a operação tapa-buracos – oficialmente chamada de Programa Emergencial de Trafegabilidade e Segurança nas Estradas (Petse) – apresentou bons resultados. Ela teria feito subir a fatia de estradas federais em boas condições de 18%, no início do ano, para 31%, antes das férias de verão, segundo o órgão.
MALHA VELHA
O Brasil tem aproximadamente 71 mil quilômetros de rodovias federais, dos quais 54 mil quilômetros estão pavimentados. Desse total, a maior parte necessita de obras de reparos. “A malha rodoviária é predominante velha e excessivamente utilizada. Oitenta por cento da extensão tem mais de dez anos de existência e ultrapassa a vida útil projetada”, afirma um dos acórdãos emitidos em 2006 pelo TCU, com base em relatórios do próprio Dnit.
Não seria necessário nem Dnit nem TCU para atestar que grande parte das BRs não está em boas condições. Sobram crateras nas pistas, além de ondulações e rachaduras; faltam placas de sinalização e as existentes por vezes estão cobertas pela vegetação, por falta de corte nas laterais das rodovias; os buracos são comuns também nos acostamentos, e falta fiscalização. Algumas das principais rodovias federais que atravessam o País, como a BR-101 ou a BR-361, apresentam trechos em condições adequadas, principalmente em Estados do Sudeste e Sul. No restante do Brasil, predomina a precariedade, que representa risco à vida dos usuários e prejuízos à economia nacional.
O levantamento no sistema de execução orçamentária do governo, feito para o Estado pelo site Contas Abertas, mostra que a União tem aumentado os recursos do setor perto de meio bilhão de reais a cada ano. Os administradores federais também têm dado maior atenção às recomendações feitas pelo TCU. O Dnit passou a disponibilizar em seu site a lista das 51 obras sob sua responsabilidade com graves problemas, divulgada pelo tribunal neste ano, após uma auditoria geral nos contratos do departamento. A maior parte se refere a rodovias.
FISCALIZAÇÃO APERTADA
Os avanços do governo também se devem em alguma medida à maior fiscalização. Nos últimos anos, órgãos de controle como o TCU têm sido vigilantes e as cobranças têm sido recorrentes. “As causas para a calamidade das estradas foram atribuídas ao poder público, que não faz corretamente a sua parte para oferecer aos usuários uma satisfação no tráfego rodoviário condigna do esforço tributário a que são submetidos”, relatou o ministro Marcos Vinicios Vilaça, do TCU, em uma das maiores e mais amplas auditorias feitas pelo órgão nas rodovias, em 2004. O texto, dizem os ministros, vale para o contexto atual.
Avaliando os resultados das mais recentes auditorias do órgão, conclui-se que a fiscalização apertada ainda será necessária por mais tempo. Relatório do tribunal elaborado neste ano que termina dá uma medida da situação. “O cenário atual é descrito por uma malha rodoviária em precárias condições de tráfego, sendo que os recursos necessários para sua recuperação e conservação estão disponíveis, mas não são aplicados devidamente pelo governo federal, impedindo a solução definitiva do problema e dando margem a ações repentinas de recuperação como foi o Petse”, afirma o documento, referindo-se à operação tapa-buracos.
O Dnit e o Ministério dos Transportes foram procurados na tarde de ontem e informaram que se manifestariam sobre o assunto a partir de hoje.