O comandante do Exército, general Enzo Martins Peri, discorda do governador do Rio, Sérgio Cabral Filho (PMDB), que insiste no emprego de tropas militares nas ruas do Rio. A restrição em apoiar a proposta foi manifestada ontem em conversas com colegas da cúpula do Exército e com o general Luiz Cesário da Silveira Filho, comandante militar do Leste (representação oficial da Força no Estado).
Nas discussões, Peri disse que só há uma alternativa para o Exército atender o governador: que ele se declare incapaz de desempenhar seu dever constitucional de suprir a segurança. Dessa forma, teria que formalizar o pedido ao Ministério da Defesa –na prática, uma intervenção militar nos órgãos de segurança do Estado. Quando assumiu, em janeiro, o governador já anunciara a disposição de ter Exército, Marinha e Aeronáutica nas ruas. Em reunião no Palácio Guanabara, ele manifestou essa pretensão ao general Cesário e aos comandantes do 1º Distrito Naval (Marinha), vice-almirante Luiz Umberto de Mendonça, e do 3º Comar (Aeronáutica), major-brigadeiro Ailton Pohlmann. Ouviu que essa ação não tinha amparo na Constituição.
Na reunião, coube ao comandante militar do Leste explicar ao governador os motivos da resistência. Mesmo assim, Cabral Filho insistiu na idéia. Pela Constituição (artigo 144), cabe ao Estado garantir e administrar a segurança pública. Só a decretação de uma intervenção federal autorizaria as Forças Armadas a atuar no patrulhamento ostensivo no Rio, em atuação na “garantia da lei e da ordem”, concordam advogados constitucionalistas e militares ouvidos pela Folha. A medida é regulada pelo artigo 142 da Constituição e pela Lei Complementar 117, de 2004.
Esta última prevê a atuação do Exército quando o governo estadual se declarar incapaz na execução dessa “missão constitucional”. A partir daí, as Forças Armadas atuariam, mas, “de forma episódica, em área previamente estabelecida e por tempo limitado”, em “ações de caráter preventivo e repressivo necessárias para assegurar o resultado das operações na garantia da lei e da ordem”.
Nesse caso, o governo estadual perderia o comando de suas polícias enquanto perdurasse a ação das Forças Armadas, a quem caberia “o controle operacional dos órgãos de segurança pública”.
Vulgarização
O comandante do Exército disse ontem a seu staff que a lei é clara: a “missão”, se ocorrer, será dentro das formalidades da lei, com princípio e fim, senão haverá o que na cúpula da Força está se chamando de “vulgarização” do emprego de militares na segurança pública. Apesar da negativa dos comandantes, quando encontrar hoje com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Rio, Cabral Filho vai oficializar o pedido para que as Forças Armadas façam um trabalho de policiamento ostensivo no Rio por tempo indeterminado.
Para ele, como as Forças Armadas têm seu maior contingente no Rio, a atuação desses militares é mais fácil do que a permanência da Força Nacional de Segurança pós-Pan. “O presidente teve uma reação muito positiva de dividir comigo esse problema”, disse. Ao saber da intenção de Cabral, Lula disse que vai olhar “com carinho” o pedido e que “a criança [referindo-se à segurança pública]” é de todos.
Tarso
O ministro da Justiça, Tarso Genro, disse, por meio da assessoria de imprensa, que o uso das Forças Armadas em funções policiais ou supletivas de segurança é uma decisão exclusiva do presidente. “No caso do Rio, o presidente tomará uma decisão após ouvir a demanda do governador Sérgio Cabral, que está justamente preocupado com a segurança pública do seu Estado”, disse.
fol