Apesar de ser acusado de desvios de dinheiro público que passam dos R$ 400 milhões, o ex-deputado Gilmar Fabris (PSD) não costuma dar bandeira e registrar bens em seu nome. Vivendo entre São Paulo e Cuiabá, o ex-parlamentar ficou apenas 40 dias preso – foi solto e desde então permanece em liberdade.
Em mais uma matéria da série O Crime Compensa? o jornal A Gazeta descobriu que a família de Fabris – que teria participado dos esquemas chefiados por ele na Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT) – possui empresas com capital social de quase R$ 90 milhões, além de um apartamento em Cuiabá avaliado em torno de R$ 2 milhões.
Apesar de ser notório que Fabris tenha fazendas – conforme depoimentos na Justiça e investigações do Ministério Público de Mato Grosso – não há nenhum registro de propriedades no nome do pecuarista. A ausência de registro pode ter sido uma tática do deputado para escapar dos bloqueios judiciais, determinados para garantir o ressarcimento do dinheiro surrupiado.
O único registro em nome de Fabris em Mato Grosso data de julho de 1984 quando ele comprou, junto com o servidor da Assembleia Benedito Ferreira de Moura Júnior, uma fatia da Fazenda Santo Antônio do Rio Vermelho, em Rondonópolis. Desde então, Fabris registrou quase nada em seu nome.
Fazendas arrendadas
O jornal A Gazeta apurou que, de forma recorrente, o parlamentar arrenda propriedades em Mato Grosso principalmente para a criação de gado – sua principal atividade econômica. Arrendar evita, com isso, que ele apareça como proprietário e tenha seus bens bloqueados pelo judiciário, em alguma ação do Ministério Público que visa o ressarcimento ao erário.
O nome de Fabris aparece como arrendatário em 3 fazendas: São José do Jurigue, de 1.377 hectares, na beira da BR-364, em Pedra Preta; na Fazenda Ijuí, de 2.178 hectares na beira da BR 163 em Rondonópolis; seu nome também aparece como arrendatário de uma propriedade de 15.771 hectares em Brasnorte, que pertence a empresa Laranjal Agropastoril. Em todos os casos, Fabris arrendou as terras para a pecuária.
Conhecido pela inteligência política e pela capacidade de pensar sempre à frente, desde quando foi vereador em Rondonópolis, Fabris não tem imóveis em Cuiabá – pelo menos não imóveis registrados. Sua esposa, a jornalista Anglisey Volcov Fabris, é dona de um apartamento no condomínio Bouganville, considerado de classe alta. Quem quiser comprá-lo precisará desembolsar pelo menos R$ 2 milhões, segundo avaliação feita por um corretor a pedido do jornal A Gazeta.
Seu marido, Gilmar Fabris, acumula tributos não pagos. Dados da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) mostram que o parlamentar deve R$ 529 mil. A PGFN não informa a natureza do débito de meio milhão, mas sabe-se que o valor se refere a impostos não previdenciários, como IPTU, IPVA e Imposto de Renda.
Conquanto acumulem dívidas, a família Volcov Fabris possui empresas com capital social milionário, ambas com sede em São Paulo. É o caso da Campos e Volcov de Campos Consultoria Ltda., com capital social de R$ 5 milhões, e a FVF Participações e Investimentos Ltda., com capital social de R$ 84,7 milhões.
Laços de família
Campos e Volcov de Campos Consultoria Ltda tem como sócio um nome recorrente nas ações civis públicas que Fabris também responde: Ocimar Carneiro de Campos, cunhado de Anglisey Volcov e advogado do Partido Social Democrático (PSD), que teria participado do desvio de dinheiro através da emissão de cartas de crédito para auditores da Secretaria de Estado de Fazenda (Sefaz).
Segundo a Polícia Civil, Ocimar atuava como testa-de-ferro de Fabris e teria sido ele o responsável por repassar R$ 46 milhões em cartas de crédito para Anglisey. Ocimar se apossou da maior parte do valor devido aos servidores da Sefaz, a título de honorários advocatícios e sob o pretexto de facilitar a comercialização das certidões.
Anglisey, aliás, é uma das sócias da segunda empresa, a FVF Participações e Investimentos Ltda., que também tem como sócio outros membros da família Volcov, como a sogra e uma sobrinha do ex-parlamentar que é servidora da Assembleia Legislativa. Lotada na presidência da ALMT, Gabriele recebe cerca de R$ 5,1 mil por mês.
Em abril deste ano a Justiça determinou o bloqueio de R$ 64 mil em bens do ex-parlamentar porque Fabris distribuiu, sem qualquer finalidade de interesse público, passagens a parentes e pessoas próximas que, assim como ele, iam e vinham de São Paulo para Cuiabá. O bloqueio não foi cumprido totalmente, justamente por conta da dificuldade de se rastrear os bens do réu.
Ceder benefícios da Assembleia para terceiros também permitiu que Ocimar Carneiro de Campos utilizasse cartões funcionais do legislativo estadual para abastecer seu carro particular e do ex-assessor, segundo denúncia do Ministério Público. Os devios ocorreram entre abril de 2016 e março de 2018.
No caso da primeira ação, sobre pagamento de passagens, viajaram de graça outra sobrinha, a esposa, seus dois filhos e ainda um funcionário de fazendas do ex-deputado.
Nesta ação civil pública, em um dos depoimentos ao Ministério Público sobre a emissão de passagens, uma servidora da Assembleia revelou que Fabris tem pelo menos duas fazendas, uma em Pedra Petra e outra em Rondonópolis. Segundo esta mesma servidora, seus funcionários viajavam a serviço e a mando de Fabris, quase sempre com o pagamento das passagens feito pela Assembleia.
Apesar das declarações sobre suas propriedades, não há nada registrado em nome do ex-deputado. Mesmo na última eleição, quando teve seu registro de candidatura indeferido por conta da Lei da Ficha Limpa, Fabris não informou sobre estas fazendas a Justiça Eleitoral. Em sua declaração de bens ele disse apenas que possui R$ 4,5 milhões em dinheiro vivo.
Outro lado
A reportagem buscou contato telefônico e por mensagens via aplicativo, por diversas vezes, com a defesa do ex-parlamentar, mas as ligações não foram atendidas ou retornadas.
A ficha de Fabris na Justiça
Operação Ventríloquo réu por desvios de R$ 9 mi usando seguro do extinto Bamerindus
Operação Cartas Marcadas réu por fraudes de R$ 418 mi com cartas de crédito da Sefaz
Operação Arca de Noé condenado a 6 anos de prisão por desviar R$ 1,5 mi da ALMT
Operação Malebolge preso por 40 dias após fugir minutos antes da chegada da PF
Operação Ararath acusado de receber propina mensal do ex-governador Silval Barbosa
Gazeta digital/ Lázaro Thor Borges