Já se sabe que um eventual governo do vice-presidente Michel Temer terá de administrar um déficit monumental para ajustar o orçamento público. Mas, além do prejuízo conhecido, de cerca de R$ 360 bilhões, existem os “esqueletos” da gestão de Dilma Rousseff, gastos até o momento desconhecidos, cuja projeção conservadora de especialistas de diferentes áreas é de que passe de R$ 250 bilhões.
Há quem diga que o prejuízo pode ser ainda maior. Em relatório, a agência de classificação de risco Moody’s estimou que, no pior cenário, o prejuízo do governo vai a R$ 600 bilhões. O que popularmente se chama de “esqueleto”, na literatura econômica é chamado de “gasto contingente”, despesa excepcional gerada por derrapadas na gestão da política econômica que fica escondida até que exploda ou que alguém “jogue luz” sobre ela.
Para especialistas em contas públicas, a despesa tende a proliferar. "Tem uma coisa que precisa ficar clara: a dinâmica do gasto social, do gasto com previdência, do gasto com pessoal, é muito previsível. Não há surpresa. A gente conhece e não deixou esqueletos. Mas a política setorial deixou", explica o economista Mansueto Almeida.
As estimativas de gastos extras feitas a pedido da reportagem incluem eventuais capitalizações que o Tesouro tenha de fazer nas estatais Petrobras, Eletrobras e Caixa Econômica Federal; a renegociação das dívidas dos Estados, que vão gerar perdas para a União; o risco de inadimplência com o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies); e a manutenção do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).
Estimativas
A agência de risco Moody’s dedicou um relatório inteiro à discussão dos passivos contingentes no Brasil, observando apenas os grandes desembolsos que podem vir pela frente. Pelas suas estimativas, ao longo dos próximos três anos, os gastos extraordinários podem variar entre 5% e 10% do Produto Interno Bruto (PIB): algo entre R$ 295 bilhões e R$ 590 bilhões. Como esse tipo de gastos afeta o fôlego financeiro da União, a Moody’s estimou que os gastos levariam a dívida – hoje perto de 70% – para cerca de 90% do PIB em 2018.
A agência avaliou que há possibilidade de o governo ter de socorrer tanto a Petrobras quanto a Eletrobras, porque ambas estão sob pressão financeira. Entre 2016 e 2018, só a Petrobras demandaria cerca de R$ 300 bilhões – mais de R$ 100 bilhões apenas para pagar dívidas.
Foi analisada, também, a saúde dos bancos públicos: Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil e Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A agência considerou que a Caixa é a instituição mais sensível a um eventual socorro. Hoje, a Moody’s não vê risco no segmento, mas, se houver deterioração e estresse das instituições, o passivo contingente tende a explodir, indo a R$ 600 bilhões.
A agência ainda considerou o custo da renegociação da dívida dos Estados, já que vão gerar uma conta extra para o governo federal que vai impactar a formação de superávit e pesar sobre a dívida. No momento é muito difícil prever o tamanho da conta. Pedro Jucá Maciel, assessor parlamentar de Assuntos Econômicos no Senado, lembra que ela pode ir a R$ 402 bilhões se o Supremo Tribunal Federal (STF) aceitar a tese de que é preciso trocar o indexador da dívida de juros compostos para juros simples. O julgamento está suspenso até junho.
A secretária de Fazenda de Goiás, Ana Carla Costa, lembra que neste meio tempo a União já está perdendo. Os Estados que ganharam liminares vem reduzindo os pagamentos ao governo federal. Apenas no mês de abril, já não foram pagos R$ 2,6 bilhões. "Se prevalecer o que consta no Projeto de Lei Complementar que trata do tema, o caixa federal deixaria de receber R$ 51 bilhões entre 2016 a 2018", diz ela.
A situação econômica do País é tão crítica que os economistas têm dificuldade de bater o martelo até para qual será o tamanho do buraco nas contas conhecidas. O economista Samuel Pessôa lembra que, para cobrir o déficit do ano passado e fazer um superávit, para que a dívida fique estável, seriam necessários R$ 360 bilhões.
Fies e FAT
Dois fundos chamam a atenção dos especialistas em finanças públicas. O primeiro é o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies). Entre 2010 e 2014, o gasto anual explodiu: foi de R$ 1,1 bilhão para R$ 13,4 bilhões. Um relatório da Controladoria Geral da União, do ano passado, fez o alerta: 47% dos beneficiários estavam com pagamentos atrasados.
Em relatório ao mercado, no início de 2016, o banco Santander estimou que a inadimplência no Fies podia ir a 25% – por baixo, a conta iria a R$ 8 bilhões. A outra preocupação é o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), que cobre o seguro-desemprego.
O FAT opera no vermelho desde 2009. O governo mudou as regras do benefício e aliviou o rombo, mas, com o desemprego batendo recorde, o saldo negativo para o Tesouro deve passar de R$ 10 bilhões neste ano.
Por:O Estadão-ConteúdoIG