Uma jovem médica sentou para conversar com uma jovem paciente terminal de câncer e seu marido, para discutir o prognóstico sombrio quanto à doença. A paciente começou a chorar. A médica também chorou. Foi uma cena sem dúvida comovente. Mas será que os médicos devem exibir tanta emoção assim, no contato com os pacientes?
Por anos, escolas de medicina e programas de treinamento de residentes evitaram deliberadamente o assunto “emoção”. Os médicos aprendiam a mecânica do câncer e de outras doenças sérias. Mas quando chegava a hora de revelar diagnósticos negativos, ninguém tinha muito a lhes dizer.
Hoje em dia, todas as escolas de medicina oferecem alguma instrução sobre assuntos como o relacionamento entre médicos e pacientes e como comunicar más notícias. Mas saber como reagir a uma onda pessoal de estresse ou tristeza continua a ser um sério desafio. É admissível chorar? E abraçar um paciente que comece a chorar?
Um médico que acautela contra o excesso de emoção é o Dr. Hiram Cody, diretor interino do serviço de câncer de mama no Centro de Câncer Memorial Sloan-Kettering. Embora enfatize a necessidade de que os médicos “compreendam, se identifiquem, tenham empatia e reconfortem”, ele diz que o trabalho dele “não envolve ser emotivo e/ou chorar com meus pacientes”.
Existem dois motivos para essa postura, diz Cody aos médicos jovens a quem instrui. Emoção demais não é terapêutico, para o paciente, e pode causar desgaste emocional acelerado para o médico.
Choro liberado?
Essas crenças são compartilhadas por muitos outros médicos, mas dados novos sugerem que chorar, em um ambiente médico, é ocorrência comum entre os médicos mais jovens.
Em uma recente conferência da Sociedade de Medicina Interna, o Dr. Anthony Sung, da Escola de Medicina de Harvard, e outros colegas reportaram que 69% dos estudantes de medicina e 74% dos internos haviam chorado pelo menos uma vez. Como seria de esperar, o número de mulheres que choram é duas vezes superior ao de homem.
Em certas ocasiões, nas enfermarias, as emoções simplesmente fluem. Por exemplo, em um documentário da rede pública de TV PBS, de 1988, Jane Liebschutz, aluna de medicina na Universidade Harvard, vê seu paciente morrer inesperadamente durante uma operação de ponte de safena.
Ela começa a chorar e se afasta dos colegas, até que o cirurgião chefe, que presenciou a cena, a procura e diz que o que ela estava sentindo era natural.
Outros médicos podem se colocar deliberadamente em situações emotivas. A Dra. May Hua, anestesiologista residente do Centro Médico da Universidade Colúmbia, me disse recentemente que, quando interna, a residente que a supervisionava, Dra. Benita Burke, deixava de almoçar para passar mais tempo com seus pacientes de câncer.
As duas definiam essa atividade como “trabalho de saúde mental”, e o contato permitia que se dedicassem a questões não estritamente médicas. Burke muitas vezes terminava chorando ou abraçando o paciente. “Acho que os pacientes adoravam Benita”, disse Hua. “Tanto como médica quanto como amiga”.
Entretanto, apesar da admiração pela colega, ela compreendeu essa exibição pública de emoção não funcionava em seu caso pessoal. “Sabia que era algo que eu não era capaz de fazer, porque preciso manter certo distanciamento das pessoas”.
Compreendi exatamente o que Hua quis dizer. Não sei se por conta de minha personalidade ou porque sou homem, eu tampouco choro na frente de meus pacientes, e nunca o fiz.
Burke diz acreditar que chora por que “se envolve muito” com seus casos, o que a leva a “tratar tudo emocionalmente”. No caso da paciente de câncer de pulmão, Burke foi a primeira médica a informá-la de que tratamento mais agressivo dificilmente ajudaria – ou seja, em outras palavras, que a paciente estava morrendo.
Mas ela disse compreender que esse nível de envolvimento é incomum, ainda que acredite que ela mesma não conseguiria ser uma médica diferente. “Sempre fui uma pessoa emotiva, para começar”, disse.
O estudo de Sung se encerra com um apelo aos médicos que ocupam posições de chefia para que reconheçam e discutam abertamente a incidência freqüente de episódios de choro entre os estudantes mais jovens de medicina.
No entanto, embora os profissionais de saúde – não só médicos mas também enfermeiras e assistentes sociais – possam debater entre si se mostrar emoção é ou não correto, o que importa mais, provavelmente, é a impressão dos pacientes.
Visão do paciente
Da mesma maneira que diferentes médicos reagem de maneira diferente a situações tristes, as reações de pacientes e de seus familiares também variam. Embora alguns possam apreciar o contato físico ou as lágrimas do profissional, outros podem considerar que isso é meloso demais.
Pacientes de câncer podem passar por situações como essa com mais freqüente do que os de outras doenças, Sharon Rapoport, paciente de câncer de mama de Roanoke, Virgínia, que conseguiu derrotar a doença, disse que admirava muito médicos como Cody, que podem parecer reservados mas comunicam sua preocupação por meio de suas ações.
Mas Rapoport diz também que aprecia ainda mais os médicos que se sentem confortáveis em expor mais suas emoções. “Se isso significa lágrimas”, ela disse, “que venham as lágrimas”.