Relatório apresentado pelo Ministério do Esporte em julho aponta desvios de R$ 17 milhões em convênios que a pasta assinou com organizações não governamentais sediadas em Brasília e em seus arredores.
Encaminhado em resposta a um pedido de informações de um deputado do Distrito Federal, o documento descreve 15 projetos em que os recursos repassados pelo governo teriam sido desviados de sua finalidade.
Embora as irregularidades tenham sido detectadas pelo próprio governo, o relatório mostra que em muitos dos casos o ministério demora para agir, levando anos para cobrar as entidades em que encontra problemas.
Segundo o ministério, as ONGs apontadas no relatório não prestaram contas do dinheiro que receberam, usaram notas fiscais frias para comprovar gastos e atenderam menos crianças do que o previsto em seus contratos.
Os projetos receberam recursos do programa Segundo Tempo, que repassa dinheiro público a ONGs, prefeituras e governos estaduais para incentivar a prática de atividades esportivas em comunidades carentes.
O programa está no centro da crise enfrentada pelo ministro do Esporte, Orlando Silva, desde a semana passada, quando foi acusado de usar os convênios para desviar recursos públicos para os cofres do seu partido, o PC do B. Ele nega as acusações.
O policial militar João Dias Ferreira, dono de duas ONGs citadas no relatório do ministério, disse à Polícia Federal na semana passada que só passou a sofrer cobranças depois que se recusou a pagar propinas para o partido.
Em entrevista à Folha, o pastor David Castro, fundador de uma igreja que recebeu dinheiro do Segundo Tempo e também aparece no relatório, disse que emissários do ministério cobravam 10% de propina para os cofres do PC do B.
O levantamento feito pelo ministério foi entregue após um requerimento do deputado federal Izalci Lucas (PR-DF), aliado do ex-governador Joaquim Roriz e adversário do atual governador, Agnelo Queiroz (PT), que foi ministro antes de Orlando Silva.
A CGU (Controladoria-Geral da União) apontou nos últimos anos irregularidades em 67 convênios do ministério com ONGs, prefeituras e governos estaduais e cobra a devolução de R$ 26,5 milhões repassados a essas entidades.
Segundo o ministério, três ONGs apontadas no relatório não apresentaram prestações de contas, mais de três anos após receberem os recursos.
Uma dessas entidades é a 100 Dimensão Cooperativa, que recebeu R$ 331 mil para oferecer atividades esportivas a mil crianças e encerrou seu trabalho em 2006.
Sonia Maria da Silva, dirigente da ONG, diz que a prestação não foi feita por causa de problemas na documentação. “As atividades aconteceram, eu levo você na padaria onde teve o lanche.” Hoje a ONG trabalha com reciclagem de lixo.
Outra entidade apontada no relatório, a Liga de Futebol Society teve as contas parcialmente aprovadas. Segundo Ferreira, ela faz parte do esquema de desvio de verbas.
A liga tem como sede um apartamento em Sobradinho, nos arredores de Brasília. A Folha visitou o local, e o porteiro disse que uma moradora recebe as correspondências da ONG, mas ela não foi localizada pela reportagem.
(RUBENS VALENTE, DIMMI AMORA, RENATO MACHADO E ANDREZA MATAIS)
F.COM