O enviado especial da Organização das Nações Unidas (ONU) a Mianmar, Ibrahim Gambari, enfrentou a primeira derrota diplomática no país da Ásia meridional ao não conseguir se encontrar com o líder da junta militar que governa o país, general Than Shwe, ou o vice, general Maung Aye, neste domingo. Gambari conseguiu se reunir com outros membros da junta.
Mais detalhes sobre a razão da possível negação dos líderes em receber Gambari não foram divulgados. Hoje, o enviado da ONU conversou com diversos líderes da oposição e conseguiu uma vitória diplomática ao se reunir com Aung San Suu Kyi, prêmio Nobel da Paz.
Arte/ Folha Online
A dissidente foi trazida de sua prisão domiciliar para encontrar o enviado. Ontem, os EUA expressaram preocupação de que o encontro não ocorresse. A reunião durou cerca de 90 minutos, mas detalhes não foram divulgados. Até mesmo partidários pró-democracia se mostraram supresos com o encontro, segundo a Associated Press.
Os protestos em Mianmar, um país da Ásia meridional, começaram quanto houve um aumento no preço dos combustíveis em agosto e ganharam atenção mundial com o engajamento de monges budistas nas manifestações. O caso se tornou alvo da preocupação mundial quando a junta militar passou a reprimir os protestos com uso de força.
A repressão violenta fez com que o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, enviasse Gambari ao país com urgência.
O enviado chegou ao país neste sábado e foi diretamente à capital Nay Pyi Daw, no interior do país, onde se encontrou com membros da junta militar que governa o país desde o final da década de 90. Por volta de 45 anos, de diferentes maneiras, Mianmar é controlado por militares. O enviado pernoitou na capital.
Enquanto Gambari realizava os encontros, milhares de militares praticamente bloquearam as maiores cidades do país neste sábado. Há relatos de que pessoas foram presas durante a noite, como mais uma tentativa do regime silenciar as manifestações contrárias.
Um diplomata asiático, com a condição de não ter seu nome revelado, afirmou o número de militares que guardavam as ruas em Yangun era de aproximadamente 20 mil, após uma chegada de reforços durante a madrugada.
“As forças de segurança estão demonstrando força. Eu acho que a possibilidade de manifestantes virem para as ruas e mobilizar outros para enfrentar a junta é zero”, afirmou o diplomata.
O enviado especial deve pernoitar hoje em Yangun, segundo diplomatas.
“Nós queremos que Gambari fique aqui tempo suficiente para começar um processo genuíno de reconciliação nacional”, disse o embaixador britânico Mark Canning.
“Ele deve ter todo o tempo que precisar. Isto requer acesso a membros do governo assim como a líderes políticos”, afirmou.
Êxitos e fracassos
Apesar dos aparentes sucessos de Gambari, fontes diplomáticas ainda se preocupam com o sucesso da missão, segundo a Associated Press. Não está claro se o enviado conseguirá que a junta permita que ele exerça uma influência real nos assuntos internos de Mianmar.
A ONU falhou repetidamente em conseguir uma reconciliação entre o governo militar e oposição pró-democracia no país. Gambari e seu predecessor, Razali Ismail, da Malásia, também falharam em conseguir a liberada para Aung San Suu Kyi.
Gambari havia sido também o último estrangeiro a se encontrar com ela, em 11 de novembro de 2006.
O partido dela ganhou as eleições gerais de 1990, que ocorreram após o movimento de 1988, quando milhares de manifestantes saíram às ruas e somente foram calados após a morte de 3.000 pessoas.
No entanto, após o resultado das eleições, o partido foi impedido de chegar ao poder e seus líderes foram encarcerados.
Dos últimos 18 anos, a líder dissidente passou aproximadamente 12 em prisão domiciliar e raramente é vista em público.
Monges
Poucos monges foram vistos em sua costumeira ronda matutina. “Nós não vamos protestar mais, nós budistas acreditamos que os ensinamentos de Buda irão vencer o mal”, disse um monge.
Alguns monges, também em condição de não terem seus nomes divulgados pela Associated Press, disseram que prisões continuam a ser feitas no país. O número de prisioneiros total poderia chegar a 1.000, incluindo diversos líderes proeminentes da oposição. Acredita-se que estes novos presos se somem a mais 1.100 encarcerados desde que as manifestações começaram, em agosto.
“Nós pedimos desculpas aos estrangeiros por se sentirem inseguros. As pessoas neste país são muito boas e gentis, mas os soldados são muito duros”, disse um morador de Yangun ao repórter da Associated Press.
Críticas
A reação violenta aos protestos provocou críticas de praticamente todos os lugares do mundo, até mesmo de aliados asiáticos de Mianmar, caso da China.
Muitos diplomatas, em conversas anônimas com Associated Press e Reuters, acreditam que a influência da China, a maior parceira econômica de Mianmar, tenha sido fundamental nos progressos feitos até agora.
No entanto, há a preocupação de que China, Índia e Rússia não estejam dispostas a estabelecer sanções contra Mianmar –um país que possui reservas de recursos naturais como petróleo e gás.
Já o Japão, após a morte de um jornalista japonês enquanto cobria os protestos na última quinta-feira (27), revisa a ajuda dada a Mianmar. Um enviado japonês chegou neste domingo ao país para investigar a morte de Kenji Nagai, 50.
Imagens da morte de Nagai mostra um soldado atirando a queima-roupa contra ele.
Neste domingo, o papa Bento 16 disse estar preocupado com a situação em Mianmar. Cerca de 1% dos aproximadamente 54 milhões de pessoas de Mianmar são católicos. Outros 3% pertencem a outras denominações cristãs.
“Eu sigo com apreensão estes eventos muito sérios”, disse o papa neste domingo em sua residência de verão nas proximidades de Roma.
FoOnL