O total de chuva foi quase o dobro do que chove normalmente em janeiro na cidade. A média normal para o mês é de 258 milímetros (cada milímetro equivale a um litro de água por metro quadrado). A maior quantidade de chuva já medida pelo Inmet ocorreu em março de 2006, quando choveu 608 milímetros ao longo do mês. A média de chuva para março fica em torno de 178 milímetros.
Segundo informações do Inmet, a chuva deste domingo, em que a cidade mais uma vez ficou em atenção por causa do temporal, não entra na contagem de janeiro. O órgão segue a norma da Organização Meteorológica Mundial e a última medição válida para janeiro foi feita às 9h de domingo.
O volume de chuva de domingo contará para fevereiro. A média normal para este mês, segundo o Inmet, é de 217 mm, mas a previsão é que a chuva seja acima da média.
Já os dados recolhidos pela Universidade de São Paulo (USP) desde os anos 1930 e pelo Centro de Gerenciamento de Emergências (CGE) desde 1996 coincidem ao apontar que nunca antes choveu tanto sobre São Paulo em um único mês. Os dois órgãos colocam este janeiro como o mais chuvoso na história da cidade.
Técnicos da estação meteorológica do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP na zona norte da cidade afirmam que em janeiro foram superados os 628,9 milímetros, muito acima do recorde anterior, registrado em 1989 (424,9 milímetros).
Um especialista em análise de riscos do CGE, ligado à Prefeitura da capital, também disse que a média nas 31 estações espalhadas pela cidade é de 459 milímetros. Segundo o CGE, a marca anterior para um mês de janeiro estava nos 318,8 milímetros, registrados em 1999. O índice do Inmet é considerado o oficial.
Sem tregua em janeiro
Com a chuva de domingo, foram 40 dias consecutivos de chuva em São Paulo. Uma contagem que pode ser traduzida por prejuízo e dor. Desde 1º de dezembro do ano passado, quando começou a Operação Verão, a Defesa Civil já registrou 68 mortes do Estado por causa das chuvas (uma ocorrência registrada em Cunha, no dia 26, está sob avaliação do órgão). O número é quase três vezes mais que nos quatro meses da temporada passada. Entre dezembro de 2008 e abril de 2009 foram 24 vítimas.
Entre as 68 mortes, 45 teriam sido causadas por deslizamentos ou desabamentos e 8, por raios. O número de pessoas que morreram afogadas ou arrastadas por enxurradas chegou a 15. Sete das 12 pessoas que morreram na capital paulista, neste verão, moravam em áreas consideradas de risco pela Defesa Civil e morreram soterradas em suas próprias casas.
Neste período, uma série de ocorrências – ainda difícil de converter o quanto representa em perda para a cidade – foi registrada. Foram casas destruídas, desmoronamento de terras, estradas bloqueadas e alagamentos que ainda deixam pessoas e cidades praticamente ilhadas. A Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp), por exemplo, calcula um prejuízo de pelo menos R$ 15 milhões provocado pelas enchentes.
Moradores do Jardim Romano, na zona leste da cidade, vivem há 50 dias no meio da enchente. O conjunto habitacional do bairro cercado pelas águas é o reflexo do descaso. São 620 famílias obrigadas a conviver com o lixo, lama e ratos. A Caixa Econômica Federal, responsável pelo empreendimento, começou a transferir os moradores, mas somente aqueles que moram no térreo, onde a água já invadiu os apartamentos.
No interior de São Paulo, o transbordamento de represas do Sistema Cantareira obrigou mais de 1,3 mil famílias a abandonarem suas casas em cidades como Bragança, Morungaba, Amparo e Atibaia. E, se vier mais chuva forte, as regiões ribeirinhas das cidades de Suzano, Mogi das Cruzes e Itaquaquecetuba também vão sofrer com alagamentos. Segundo a Sabesp, o sistema de produção do Alto Tietê já está com 89,1% da capacidade utilizada.
No Estado, já são 31 municípios em situação de emergência e sete em alerta por causa das fortes chuvas. O número de pessoas que deixaram suas casas chega a 5.161, entre desabrigados e desalojados, e aquelas que foram, de alguma forma, afetadas pela chuva a quase 20 mil.
As cidades em situação de emergência são Álvares Machado, Atibaia, Bofete, Bom Jesus dos Perdões, Caieiras, Caiuá, Capivari, Chavantes, Cotia, Ferraz de Vasconcelos, Franco da Rocha, Getulina, Guararema, Inúbia Paulista, Itapevi, Lucélia, Lourdes, Manduri, Mineiros do Tietê, Mirassol, Osasco, Oscar Bressane, Pardinho, Pracinha, Presidente Venceslau, São José do Rio Preto, São Lourenço da Serra, Santa Barbara D”Oeste, Santo André, Santo Antônio do Pinhal e Sumaré.
No litoral norte estão em alerta os municípios de São Sebastião e Ubatuba. No Grande ABC, as cidades de Mauá e Ribeirão Pires. No Vale do Paraíba são as cidades de Guaratinguetá, São Luiz do Paraitinga e Cunha – essas duas últimas também estão em situação de calamidade pública.
Chuva atípica
Segundo o Inmet, uma sobreposição de fenômenos explica essa chuva atípica no Estado de São Paulo. “A forma como cada um desses fatores está atuando, porém, ainda é desconhecida”, afirma Franco Villela, meteorologista do Inmet.
Segundo Villela, são três fatores que devem ser considerados: o El Niño (entenda o que é e como ele age), uma anomalia de temperatura no Oceano Atlântico, na região do Equador (as águas estão cerca de 2ºC mais quentes) e um inverno com chuva acima do normal. “O inverno foi muito chuvoso, praticamente não teve estação seca”, diz Villela. “De julho de 2009 a janeiro deste ano, tivemos recorde de chuva. Os último sete meses, comparados com todos os outros anos, desde 1943 quando o Inmet começou a medir o volume de chuva, foram os mais chuvosos da história”, completa. E a chuva não deve dar tregua. A previsão é que ela persista até abril.