A chikungunya, classificada pelo ministro da Saúde, Ricardo Barros, como o pior problema de saúde que o Brasil deverá enfrentar no próximo verão, mostra seu poder de disseminação antes mesmo da chegada da estação. Dados do Ministério da Saúde indicam que a doença já está presente em dois de cada cinco municípios brasileiros e já provocou 138 mortes neste ano.
Se o verão de 2014/2015 foi marcado por uma epidemia recorde de dengue no país e o de 2015/2016 causou pânico pela descoberta da relação do vírus zika com a ocorrência de microcefalia, a estação de 2016/2017 deverá, segundo especialistas, registrar uma explosão de casos de chikungunya, se a circulação do vírus seguir a mesma tendência observada neste ano.
O número de notificações da doença passou de 38,3 mil, em 2015, para 251 mil em 2016. No ano passado, 696 cidades brasileiras foram atingidas pela chikungunya. Em 2016, já são 2.281 municípios. Pelo menos sete estados brasileiros já registram índices epidêmicos do problema (mais de 300 casos por 100 mil habitantes), todos no Nordeste.
Eu diria que 2016 já é o ano em que a chikungunya está muito preocupante e, apesar disso, ainda temos muita falta de informação, diz o infectologista Rivaldo Venâncio, diretor da Fiocruz Mato Grosso do Sul.
Dimensionar com exatidão o alcance da epidemia esbarra nas limitações dos métodos diagnósticos. As semelhanças entre os vírus da chikungunya, zika e dengue e de alguns dos seus sintomas dificultam a criação de testes precisos e podem causar confusões quando o diagnóstico é feito somente por avaliação clínica, prática comum em períodos epidêmicos.
Presidente da Sociedade Brasileira de Dengue e Arboviroses, o infectologista Artur Timerman afirma que, de um modo geral, as epidemias costumam começar com poucos casos, que se tornam crescentes, chegam ao ápice e caem. A chikungunya teve relatos de casos há cinco anos no Nordeste. Depois, houve um grande número de casos relatados há dois anos, um ano antes da zika. Está seguindo o trajeto que seguiu a dengue, diz.
Sudeste &ndash A chegada do vírus à região sudeste neste ano também deve contribuir para que o próximo verão seja marcado por mais registros da doença. Aqui, a gente tem uma população maior e cidades mais urbanizadas, com condições de ter um surto de qualquer um desses arbovírus, diz o virologista e professor de infectologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Celso Granato.
Segundo dados do Centro de Vigilância Epidemiológica da Secretaria Estadual da Saúde de São Paulo, 62 das 645 cidades paulistas já tiveram casos confirmados da doença em 2016. Considerando também as suspeitas, são 298 municípios do Estado com registros da patologia. Na capital paulista, 23 dos 96 distritos já confirmaram casos de chikungunya.
Uma das principais preocupações com a expansão da doença é que ela pode ser incapacitante. Estamos aprendendo muito agora, porque os efeitos mais complicados aparecem quando há muitos casos. É uma doença que pode afetar a pessoa por um ou dois anos e não há tratamento eficiente para a artrose crônica que ela causa. E a doença pega as articulações mais usadas, explica Granato.
Timerman diz que a postura do Ministério da Saúde de alertar sobre a possibilidade de maior disseminação da doença não terá efeitos na população sem ações de combate ao mosquito associadas a mudanças nas cidades.
Estamos com três vírus circulando e não sabemos o impacto disso. Esse é um dos problemas de saúde pública mais dramáticos. Fala-se em combater o vetor de forma emergencial, mas é preciso pensar em saneamento básico, cidades menos impermeabilizadas e com mais áreas verdes.
O ministério afirmou, em nota, que o aumento de casos era previsto, uma vez que a doença é recente e, por isso, há mais pessoas suscetíveis. A pasta diz ainda que tem se preparado para o próximo verão, intensificando as ações de prevenção e combate ao mosquito, com medidas como mobilizações nacionais para coleta de pneus e conscientização da população sobre a importância da continuidade das ações de combate ao mosquito.
(Com Estadão Conteúdo)-VEJA.COM