Com recursos reduzidos para sua política externa, o Brasil perdeu o direito de votos em instituições internacionais, sofreu derrotas em eleições para cargos, foi excluído do comando das missões de paz e teve sua credibilidade de potência emergente afetada.
No total, a dívida do País com as agências da ONU soma R$ 662 milhões e os efeitos já começaram a ser sentidos.
Na Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), o Brasil perdeu seu direito de voto desde o dia 1.º de janeiro de 2015 depois de acumular uma dívida de R$ 90,2 milhões, segundo os dados oficiais. O Itamaraty não paga suas contas desde 2012. Para restabelecer seus direitos na AIEA, basta um depósito de R$ 10,3 milhões nas contas da entidade. Mas, por enquanto, não há sinal do governo de que o montante será pago.
Na semana passada, o Estado revelou que, diante de uma dívida de R$ 15,4 milhõese dois anos sem fazer contribuições financeiras, o Brasil também perdeu o direito ao voto na assembleia das partes do Tribunal Penal Internacional. Por isso, o Itamaraty não pode eleger juízes e nem votar sobre o orçamento da entidade.
Em Viena, na sede do AIEA, o Brasil já foi excluído de votações importantes sobre a questão nuclear do Irã, país que justamente viu a mediação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para tentar fechar um acordo, em 2010.
Impacto
A suspensão do Brasil também pode ter um impacto para os interesses do País. Uma vez construídos os submarinos nucleares brasileiros, o governo terá de submeter à AIEA uma proposta de salvaguardas para garantir a proteção dos segredos industriais dos aparelhos. Mas, sem poder votar, não teria como atuar em uma resolução sobre o Brasil.
Outro impacto pode ser o corte de projetos da AIEA no Brasil. Para 2016 e 2017, a agência aprovou cinco programas de cooperação nos campos de saúde e agricultura, justamente para desenvolver a tecnologia nuclear nessas áreas. Com a falta de contribuições nacionais, esses projetos devem ser revistos.
Na Unesco, o Brasil perderá seu direito ao voto nas decisões da entidade a partir de maio. O Itamaraty acumula uma dívida de R$ 61,3 milhões e o último depósito feito nas contas da entidade em Paris foi em 3 de maio de 2013.
Na Organização da ONU para o Desenvolvimento Industrial (Unido), o Brasil foi obrigado a negociar um plano de pagamento das dívidas, que chegam a US$ 15 milhões. Na Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), o Brasil não pagou sua cota de 2014 e acumula uma dívida de R$ 38,6 milhões.
Já no fundo da ONU para financiar as Operações de Paz, o Itamaraty somava até o final de dezembro uma dívida de R$ 224,3 milhões. Nos últimos anos, o Brasil assumiu o comando das tropas da ONU no Haiti, mandou militares ao Congo e ao Líbano, mas, internamente, a entidade optou por buscar novos parceiros para comandar tropas pelo mundo. A dívida do Brasil ainda soma outros R$ 198 milhões à secretaria da ONU.
Contexto
A crise no pagamento das cotas brasileiras ocorreu após a ONU modificar os critérios de contribuições e elevar a participação dos países emergentes na conta final da entidade. Questionado pela reportagem sobre o não pagamento de suas contribuições obrigatórias e sobre o impacto da perda do direito ao voto, o Itamaraty não se pronunciou até a conclusão desta edição.
Apesar de ter sido cortado em diversos órgãos, o Brasil mantém a participação na Assembleia Geral, o principal órgão deliberativo da ONU, em que todos os países têm direito a voto para tratarem de assuntos que afetam a vida de todos os habitantes do planeta.
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