Em meio ao mal estar entre Brasil e Estados Unidos gerado pelas recentes denúncias de espionagem, a presidente Dilma Rousseff abrirá na manhã desta terça-feira (24) a Assembleia-Geral das Nações Unidas, em Nova York, com um discurso em favor do respeito à privacidade dos cidadãos e à soberania dos países.
O chefe de Estado brasileiro é, tradicionalmente, sempre o primeiro a discursar porque o Brasil foi o primeiro pais a virar membro da ONU, em 1945, após a Segunda Guerra Mundial. A presidente usará cerca de 30 minutos para expor, entre outros temas, a proposta de que as Nações Unidas crie regras claras sobre o acesso a informações privadas na internet e imponha limites às ações de inteligência entre as nações.
Segundo auxiliares de Dilma, ela quer uma espécie de "código internacional" para a internet, com normas que garantam a privacidade no meio eletrônico. Para a presidente, além de afetar a soberania do Brasil, a NSA, agência de segurança dos Estados Unidos, pode estar violando o direito de privacidade dos indivíduos ao acessar o conteúdo de e-mails como estratégia de inteligência.
A fala antecede o discurso do presidente norte-americano, Barack Obama, que subirá à tribuna da Assembleia das Nações Unidas logo após Dilma. Na última terça-feira (17), a presidente anunciou o adiamento da visita de Estado que faria em outubro a Washington, nos Estados Unidos.
A decisão foi motivada pelas denúncias de que a NSA monitorou comunicações de Dilma com seus assessores e também a Petrobras, segundo revelou o programaFantástico.
Antes de discursar na assembleia, a presidente levará a proposta de regulamentação do acesso a conteúdos de internet e a critica à atuação da NSA diretamente ao secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, em uma reunião bilateral que terá início às 8h30.
'Dignidade'
Nesta segunda (23), Dilma tratou do tema com a presidente da Argentina, Cristina Kirchner. Após o encontro, que ocorreu no hotel onde a presidente brasileira está hospedada em Nova York, Kirchner afirmou que a espionagem dos Estados Unidos sobre o governo brasileiro afeta a "dignidade" de todos os países sul-americanos.
"A condenação e a posição da presidente Dilma em relação à espionagem é uma questão de dignidade e respeito à soberania do seu país. Brasil é nosso principal sócio no Mercosul. A verdade é que a espionagem afeta a dignidade da região em geral", disse.
Dilma também se reuniu com o ex-presidente dos Estados Unidos Bill Clinton, mas, de acordo com o Planalto, eles só abordaram ações da Global Iniciative, fundação criada pelo norte-americano para promover o desenvolvimento sustentável.
De acordo com a ministra da Secretaria de Comunicação Social, Helena Chagas, Clinton fez um convite para que Dilma participe de um encontro promovido pela fundação com autoridades nacionais e estrangeiras que vai ocorrer entre 8 e 10 de dezembro no Rio de Janeiro.
A ministra negou especulações de que o ex-presidente dos EUA tenha se encontrado com Dilma numa tentativa de "acalmar os ânimos" da governante em relação às denúncias de espionagem envolvendo o governo norte-americano.
"A conversa entre os dois girou, sobretudo, sobre o trabalho da fundação. Não procede a especulação de que Clinton tenha sido enviado como intermediário para tratar das denúncias de espionagem", afirmou.
Síria
No discurso que fará na ONU, Dilma também deve abordar os conflitos na Síria que já provocaram mais de 100 mil mortes. A presidente vai condenar a violência no país e o uso de armas químicas, mas defenderá uma solução diplomática, sem o uso da força contra o regime do presidente sírio, Bashar al-Assad.
A guerra civil síria dura quase dois anos, já matou mais de 110 mil pessoas e ameaça a estabilidade do Oriente Médio. O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, defendeu uma intervenção militar, mas a Rússia apresentou como alternativa um plano que prevê o desarmamento gradual da Síria.
Após reunião com a presidente Dilma nesta segunda, Cristina Kirchner também defendeu uma solução negociada para a Síria. Para ela, o conflito revela a necessidade de ampliação do Conselho de Segurança das Nações Unidas. O Brasil pleiteia uma cadeira permanente no grupo hoje formado por Estados Unidos, China, Rússia, Inglaterra e França.
"O direito de veto quando há um conflito é a melhor forma de não resolver um problema e é necessário mudar as coisas para que elas funcionem. O que teria acontecido se não tivesse ocorrido esse acordo de desarmamento entre Rússia e EUA? O Conselho de Segurança é ineficaz e obsoleto para enfrentar situações de crise", argumentou a presidente argentina.
Rio+20
Outro tema do discurso de Dilma será o cumprimento do documento firmado durante a Rio+20, a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, realizada em junho do ano passado, no Rio de Janeiro. A conferência produziu um documento assinado pelos 188 países que participaram do evento.
Após discursar na abertura da Assembleia-Geral da ONU Dilma participa às 15h de terça (24) da primeira sessão do Foro de Alto Nível de Desenvolvimento Sustentável, criado para analisar as realizações e deliberações da Rio+20.
Nathalia PassarinhoDo G1, em Nova York