domingo, 22/12/2024
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Crise Financeira afeta Mais de 50 milhões de pessoas na maior parte dos EUA

O dinheiro está derretendo e as perspectivas são assustadoras. É como se o planeta, de uma hora para outra, mergulhasse num pesadelo coletivo. As consequências são as piores possíveis. Não dá mais para fingir que não é com você e ignorar as notícias.
A estimativa do relator para o Direito à Alimentação da Organização das Nações Unidas (ONU), Olivier de Schutter, é de que a queda das bolsas em índices catastróficos no mundo todo tenha afetado mais de 50 milhões de pessoas, agravando a miséria e fazendo o número dos que padecem com a fome passar de 900 milhões. Além destes, 100 milhões sofrerão pobreza extrema. Ou seja, a crise atingirá em cheio 1 bilhão de pessoas (cinco vezes a população do Brasil).

As previsões são sombrias. Ao jornal “O Estado de S. Paulo”, o economista de Bangladesh Muhammad Yunnus, Prêmio Nobel da Paz em 2006, disse que “quem tem vários milhões de dólares continuará com alguns milhões. Já aqueles que tinham como pagar uma refeição inteira, em pouco tempo poderão pagar apenas por metade.”
Tudo começou nos Estados Unidos, a então maior e mais sólida economia do planeta. Na crise imobiliária, muitos americanos perderam casas e passaram a morar em carros ou acampamentos. A Organização Mundial da Saúde (OMS) manifestou preocupação de que a pobreza e a insegurança aumentem a onda de transtornos mentais e suicídios. Na Califórnia, um homem matou a família e se matou em seguida. Em carta deixada à polícia, ele culpava a crise e o desespero por não encontrar emprego.

Imigrantes se sentem a parte fraca da corda. Brasileiros que vivem nos Estados Unidos estão sofrendo. Uma brasileira que mora há 15 anos no país, falou à Folha Universal. Ela preferiu não ter o nome divulgado e enviou o relato por e-mail. “Estamos voltando ao Brasil por causa da crise. Perdemos a nossa casa, na qual, só de entrada, demos
US$ 120 mil (R$ 261 mil). Conseguimos vendê-la bem abaixo do valor, e nos consideramos sortudos. Muitos amigos perderam a casa para o banco, perderam dinheiro e têm o nome “sujo”. Estávamos com a viagem marcada para outubro, mas teremos que adiar porque a empresa que meu marido trabalha há 15 anos faliu. Agora, vamos esperar mais alguns meses até termos o dinheiro para levar nossa mudança e comprar as passagens. Somos cinco. O que isso mudou para mim e minha família? Tudo! Planos, sonhos. Temos dois filhos adolescentes que estão tristes por ter que largar os amigos e a escola. Eles não se lembram do Brasil e falam o português errado. E têm medo de não ir bem na escola no Brasil. A crise mudou tudo”, escreveu.

Desabrigados
Cilene Dias, outra brasileira radicada com a família nos
Estados Unidos há 10 anos também está assustada. “Devolvi minha casa por causa dos juros”, conta. Desesperada com o aumento do preço das
prestações, ela, como milhares de pessoas, primeiro tentou vender o imóvel. Descobriu que as casas novas estavam sendo vendidas pelo mesmo preço que pedia. “Quando comprei, o juro era de 9%. Depois de 3 anos, o valor começou a subir e em janeiro já estava em 13, 75%. Tentei vender para, pelo menos,
quitar o que devia ao banco, mas com a queda de preço dos imóveis, não consegui”, relata Cilene, que hoje mora em um apartamento alugado e se considera sortuda. Muitos acabaram desabrigados.O francês Christophe Aguiton, do conselho científico do grupo, cobra mudanças imediatas. “Há tempos que temos dito que o sistema está louco”, lembra, para defender medidas urgentes. “É claro que os governos têm que intervir e dar segurança, além de ajudar quem perdeu tudo. Mas, ao mesmo tempo, é preciso proibir paraísos fiscais e controlar a loucura do mercado”, defende. Paraísos fiscais são regiões controladas por poderosas instituições financeiras em que a falta de taxas e de fiscalização vira atrativo para ricaços de todo o mundo. A liberdade atrai também chefões do crime, especialistas em lavagem de
dinheiro e especuladores.
No Brasil, para minimizar o impacto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva determinou que parte das reservas internacionais fosse destinada a garantir recursos para exportações e que o Banco Central ajudasse instituições financeiras em dificuldades. A falta de transparência e garantias do pacote motivou críticas.
Para o professor Nildo Ouriques, da UFSC, a intervenção é desastrada. “As medidas são para favorecer multinacionais, banqueiros e latifundiários. A crise concentra o poder, a propriedade e a riqueza. A pobreza se concentra porque quem tem uma casinha vai vender, e a riqueza se concentra porque rico tem crédito. Nós precisamos fortalecer as organizações sociais e civis como instrumento de defesa”, diz o economista, que acredita que a crise pode ser o início de uma nova ordem mundial. “Estamos perdidos? Talvez não. Talvez estejamos acordando”, conclui o professor.O número de sem-teto disparou nos Estados Unidos. Os americanos foram as primeiras vítimas da crise que derrubou as bolsas de valores de todo o planeta, mas não foram as únicas. Em meio ao pânico que tomou conta do mercado e ao clima de insegurança, ficou uma perspectiva sombria, principalmente para os menos favorecidos. “Há quem ganhe e quem perca na crise. Banqueiros, latifundiários e multinacionais ganham muito. Trabalhadores, pequenos empresários e pequenos negócios perdem quase tudo. É sempre desigual”, analisa o economista Nildo Ouriques, professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Ele considera impreciso dizer que a “casa caiu” por aqui: “A casa não caiu porque a gente já estava na rua da amargura”.

A crise chegou no Brasil de forma arrasadora, com grandes empresas registrando prejuízos de milhões e previsão de cortes. O desemprego e falta de crédito na recessão afetam principalmente os pobres.
Na semana terminada no dia 10, marcada por interrupções e tentativas desesperadas de frear a desvalorização na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), as ações caíram mais de 20%. Além das grandes
empresas, cerca de 50 mil pequenos investidores que aplicam as economias no pregão foram afetados. Gabriel Lovato, um deles, desistiu de acompanhar as cotações. “Vou esperar, não adianta tirar agora”, conforma-se.

Efeito dominó
operadores da bolsa brasileira surtaram. “Foi um sentimento ruim, mostrou que as autoridades não têm controle. Muitas empresas de médio porte, com faturamento entre US$ 50 milhões e
US$ 100 milhões (R$ 109 milhões e R$ 218 milhões), ficaram perto de quebrar”, relembra um operador de um grande banco, que preferiu não se identificar. “O clima foi de tensão. Os clientes pararam de se posicionar. Tudo travou”.
O efeito dominó que atingiu a Bovespa começou com a crise imobiliária que deixou a brasileira Cilene Dias no aperto e provocou a falência de dois dos maiores bancos de investimento norte-americanos, Lehman Brothers e Merrill Lynch. O economista Fábio Kanczuk, professor da Universidade de São Paulo (USP), explica que a quantidade de empréstimos beira a irresponsabilidade. Os bancos pretendiam aproveitar o crescimento imobiliário, ignorando o risco de calotes. Quando a economia americana saiu dos eixos, o número de inadimplentes disparou.

Aos primeiros sinais de turbulência, os“O valor dos imóveis despencou e isso criou um incentivo para as pessoas não pagarem. Elas pensaram ‘eu peguei um empréstimo para pagar a casa e agora ela não vale mais nada? Deixa o banco pegar de volta!’ Acontece que o sistema financeiro americano é todo interconectado. Um banco empresta para outro que empresta para outro. Os papéis ficam rodando e de repente ninguém mais sabe quem está com o risco”, resume Kanczuk.
Ele compara a operação a um jogo de mico, em que não se pode chegar ao final da rodada com a carta na mão: “Se você não sabe quem está com o mico, não troca cartas.
Se não sabe onde está o risco, não empresta dinheiro.”

Caos mundial
O colapso do sistema já havia sido previsto por alguns dos principais críticos do mercado livre. Antes da quebradeira, o economista François Chesnais, da Universidade de Paris (França), já alertava que junto com catástrofes climáticas o mundo assistiria ao caos financeiro. A pressão para que o capital especulativo seja controlado não é nova. Desde 1998, a Associação pela Taxação de Transações e por Ajuda aos Cidadãos (Attac) tem cobrado a criação de mecanismos para regular o mercado.

F.U/Por Andrea Dip e Daniel Santini

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Parmenas Alt
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