quinta-feira, 21/11/2024
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Crimes bárbaros retomam debate sobre maioridade penal

Fabíola Santos Corrêa foi morta em maio, aos 12 anos, de forma cruel. Duas amigas, também adolescentes, perfuraram o seu peito e, com uma faca e uma barra de ferro, retiraram seu coração. O crime aconteceu em São Joaquim das Bicas, na grande Belo Horizonte. No mês passado, um garoto de apenas 16 anos foi preso acusado de liderar uma quadrilha responsável por arrastões a bares e restaurantes de São Paulo. Nesta nova modalidade de assaltos, é comum clientes e funcionários relatarem agressões físicas ou psicológicas.
Dados da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo mostram que houve um aumento em 2012 do número de jovens apreendidos pela polícia no Estado. Nos primeiros três meses, foram apreendidos 29,5% mais adolescentes do que no mesmo período de 2011. Se comparado com 2010, ano em que os números começaram a ter um movimento de alta, o crescimento chega a 48,5%. Em junho deste ano, 14 menores foram detidos por participar de roubos a prédios residenciais e a restaurantes na capital paulista.

A brutalidade com que os jovens cometem crimes retoma a discussão sobre o endurecimento das penas reguladas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Pela lei, a pena máxima a ser cumprida por jovens com até 18 anos incompletos é de três anos de internação em instituição especializada. Há também a possibilidade de uma série de medidas mais leves para casos em que não haja ato infracional violento.

A reportagem do iG visitou uma unidade da Fundação Casa, órgão responsável pela internação de jovens infratores no Estado de São Paulo, em Osasco. Ouviu o relato de D., de 17 anos, que aos 16 matou um homem. Ao tentar roubar uma moto, o proprietário reagiu e levou um tiro. Internado há oito meses na unidade, cumpre a última das quatro etapas do programa socioeducativo da instituição e está prestes a sair.

“Garoto com uma arma na mão inverte sua posição social", diz sociólogo
Entender comportamentos desse tipo é um desafio até para quem trabalha com a questão. “Há um certo prazer em realizar esses atos violentos”, explica o professor Antônio Sérgio Spagnol, doutor em sociologia pela USP (Universidade de São Paulo). Para ele, os jovens cometem atos de crueldade para conquistar um espaço na sociedade. “O garoto com uma arma na mão inverte sua posição social. Ele tenta reverter essa situação de humilhação [em que vive]”, diz.

Liana de Paula, pesquisadora de políticas públicas da Fundação Instituto de Administração (FIA), aponta “uma escalada da cultura da violência”. Ela explica que, em alguns casos, esses atos podem se tornar valorizados. “O adolescente envolvido com o crime ganha prestígio entre os colegas.”

Para o promotor do Ministério Público Paulo Thales César de Oliveira, menores como D. e as jovens apreendidas em Minas Gerais deveriam ficar internados por mais tempo. “A nossa lei é extremamente branda. Ela não foi pensada para o adolescente infrator de hoje. Foi baseada em tratados da década de 70. O infrator era o batedor de carteira da Sé [região central da capital]. Eram os chamados ‘pivetes’. Eles não usavam arma, o crime mudou, houve um aumento da violência”, diz.

Especialistas, no entanto, alertam que os atos de violência devem ser vistos em um contexto maior. “Nós estamos mais violentos e isso se reflete dentro de casa. Um grupo mais marginalizado talvez possa sentir isso de forma mais extrema”, explica a professora do Instituto de Psicologia da USP Henriette Morato.

Na pesquisa de sua tese de doutorado, o professor Antônio Sérgio Spagnol acompanhou 20 jovens de classe média que realizaram infrações graves, desde roubo a mão armada até homicídio. Para ele, é um erro acreditar que apenas jovens pobres são violentos. No estudo, que investiga os jovens delinquentes em São Paulo, Spagnol analisou casos como de um menino de classe média, filho de um advogado, que atirou em um motorista durante assalto na Avenida Faria Lima, em São Paulo, porque o homem se recusou a entregar o carro. “O pai dele tinha três carros na garagem e ele queria roubar um para ir à praia com amigos”, lembra.

A psicóloga e doutora pela PUC de São Paulo Gabriela Glaskow trabalha com jovens em medida de semiliberdade. Ela diz que o envolvimento com o tráfico – maior causa de apreensão de adolescentes em São Paulo – muda a trajetória social do menor. “Ele passa a ter acesso econômico, se torna visível, até com as meninas, com a família, ele leva dinheiro para casa, por mais que muitas famílias se sintam constrangidas por saberem a origem do dinheiro.”

Há quem atribua esses atos violentos a transtornos mentais. Mas o responsável pela coordenação do grupo de psiquiatras que atende na Fundação Casa, o psiquiatra forense Daniel Martins de Barros, do Hospital das Clínicas, discorda. Barros realizou pesquisa com internos e constatou que na maioria dos casos “o jovem infrator não é um psicopata, ele sabe o que é certo e o que é errado”.

A pesquisa avaliou o discernimento moral de internos e os classificou segundo uma escala de frieza emocional . A conclusão é de que não há uma razão clínica para a criminalidade. “É importante desfazer esse estigma”, afirma o médico.

Gabriela Glaskow complementa: “Procuram causas nos indivíduos e esquecem os fatores sociais”. Ela acredita que jovens capazes de atos extremamente cruéis, como as adolescentes apreendidas em Minas Gerais, sempre existiram, mas são exceções. “O jovem no Brasil é mais vítima do que autor de violência”, diz.

De acordo com o mais recente levantamento da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, de 2011, apenas 3,4% das pessoas privadas de liberdade no País são menores

Alexandre Dall´Ara – iG São Paulo

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Parmenas Alt
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