Um quarto das armas e da munição que chegam aos paióis do crime organizado no Brasil, a exemplo da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), é desviado de órgãos de Segurança do Paraguai, Argentina e Uruguai. A informação, obtida com exclusividade pela reportagem, está presente no relatório da CPI do Tráfico de Armas – que está em fase de conclusão na Câmara dos Deputados, em Brasília.
A rota do tráfico internacional de armas e munição vindas pela Tríplice Fronteira para o Brasil foi descoberta durante a Operação Serraluz, realizada pelas polícias Federal (PF) e Civil do Rio Grande do Sul (RS), em 2005. As investigações apontam que militares estrangeiros estão integrando a “rede” do tráfico, que conta com a participação de Erineu Domingos Soligo, o Pingo, “braço-direito” do traficante Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar.
Pistola argentina
O relator da CPI, deputado Paulo Pimenta (PT-RS), informou que interceptações telefônicas comprovam a facilidade dos criminosos em obter armas nos países vizinhos. “Nas conversas, os bandidos, com muita desenvoltura e detalhes, falam com seus interlocutores sobre como conseguir o armamento”, revela o deputado.
O delegado Rafael França, da Delegacia de Repressão a Entorpecentes da PF gaúcha, foi dos responsáveis pela Serraluz, que resultou na prisão de 34 pessoas. No depoimento à CPI, revelou que, segundo as investigações, atravessadores têm acesso às armas no Uruguai e Argentina através de policiais e militares dos dois países. Um dos indícios foi a apreensão de pistola 45, de uso do exército argentino, com munição, na operação.
França contou ainda que a quadrilha, parcialmente desarticulada na Serraluz, tinha fuzis 762, coletes à prova de bala e explosivos. O delegado Guilherme Pacífico, da Polícia Civil gaúcha, que também comandou a operação, destacou que na Argentina e no Paraguai drogas e carros são usados como moeda de troca na compra de armas e que inicialmente a operação era para coibir o roubo de carga.
Parceiro de Beira-Mar é preso na ação
Preso na Operação Serraluz e posto em liberdade dois meses depois medidante mandado judicial, o traficante Jair de Oliveira, apontado pela polícia do Sul como um dos chefões do pó e das armas da região, voltou a ser capturado em julho, em Novo Hamburgo (RS).
Parceiro de Fernandinho Beira-Mar, Oliveira tem lojas de veículos no Sul que seriam usadas para lavar dinheiro do tráfico. Encarcerado no presídio de segurança máxima de Catanduvas (PR), Beira-Mar é ligado às facções criminosas Primeiro Comando da Capital (PCC), em São Paulo, e Comando Vermelho (CV), no Rio.
Oliveira tem mandado de prisão por corrupção ativa expedido pela 1ª Vara Criminal de São Leopoldo (RS). Em 2004, subornou dois policiais que cumpririam mandado de busca em sua casa.
O bandido não é o único ligado a Beira-Mar que esteve sob a mira da Operação Serraluz. Erineu Domingos Soligo, o Pingo, braço-direito do megatraficante, que vive na fronteira do Paraguai e Mato Grosso do Sul, também é citado como integrante do bando de Oliveira no “negócio” das armas.
Memória
Neste domingo, a reportagem mostrou o armamento de guerra apreendido no Paraguai, junto à fronteira com o Brasil, que seguiria para homens do Primeiro Comando da Capital (PCC), em São Paulo, e também para bandidos do Comando Vermelho (CV), no Rio, segundo investigações da Secretaria Nacional Antidrogas daquele país.
O arsenal tem, no total, 228 pistolas, uma metralhadora antiaérea, duas submetralhadoras, sete fuzis, oito silenciadores, 120 carregadores e mais de 50 caixas de munição calibre 9 mm. A polícia paraguaia interceptou o material – avaliado em R$ 3 milhões – momentos antes de a carga atravessar a fronteira com o Brasil numa caminhonete com placa de São Paulo.
A Polícia Federal suspeita de que Fernandinho Beira-Mar tenha negociado as armas, mas diz que, apesar das fortes evidências, precisa de mais provas para vincular o ex-chefão do pó no Brasil ao arsenal apreendido.