A guerrilha colombiana deve libertar de forma incondicional todos os seus reféns (mais de 700) e abandonar a luta armada. Estes conselhos sensatos merecem destaque porque foram dados por uma figura insensata. Hugo Chávez é o mais proeminente partidário público das Farc. O maior e mais antigo (e tão anacrônico) grupo rebelde latino-americano recebe do regime de Caracas apoio político, econômico e, de acordo com evidências que se avolumam, militar.
Os conselhos do presidente da Venezuela revertem sua retórica bombástica. As autoridades de Bogotá saudaram as palavras de Chávez com sensata prudência, pedindo fatos concretos, ou seja, que Chávez efetivamente abandone o apoio à luta armada na Colômbia. O governo americano seguiu a mesma linha.
Desconfiança é a atitude correta. Há cinco meses, Chávez qualificou os rebeldes de força legítima, digna de reconhecimento diplomático internacional. Agora ele define os bandoleiros que sequestram inclusive civis e traficam drogas como anacrônicos. Enfraquecido dentro de casa, Chávez não tem sido muito constante ultimamente, como na reversão da decisão de reorganizar os serviços de inteligência da Venezuela, num processo de cubanização. Pelo projeto abandonado, juízes seriam forcados a cooperar com os serviços de inteligência.
No caso colombiano, é importante ver o contexto: as Farc estão acuadas, a Colômbia acaba de anunciar a captura de dois venezuelanos , inclusive um identificado como sargento da Guarda Nacional, que estariam levando munição para as Farc, e estas prisões podem aumentar a pressão para que o governo Bush coloque a Venezuela na lista de países que patrocinam o terrorismo.
E a situação pode ficar complicada para Chávez. Ele reagiu inicialmente de forma estridente às descobertas nos computadores pertencentes ao líder das Farc Raúl Reyes, morto em uma operação militar colombiana no Equador em fevereiro, Estas informações provariam o apoio da Venezuela aos rebeldes. De acordo com opositores em Caracas, citados pela BBC de Londres, estas evidências poderiam ser usadas contra Chávez em tribunais internacionais.
A reversão, pelo menos pública, de Chávez teve como alvo direto Alfonso Cano, que tenta consolidar seu comando nas FARC, na esteira da morte (ataque cardíaco) do veterano dirigente Manuel Marulanda. Ao contrário do antecessor vindo da base camponesa da organização, Cano é um intelectual de classe média, com raízes na politica estudantil em Bogotá. Ele tem reputação de dogmático e intransigente, atributos a serem realçados neste momento de consolidação do seu poder e demonstração que a guerrilha pode se recuperar das derrotas miitares.
Mas esta aí a realidade. As unidades de combate da guerrilha estão sendo neutralizadas pelas forças governamentais, treinadas e financiadas pelos EUA, as comunicações por rádio interrompidas e centenas de rebeldes desertam todo mês. No ano passado, pela primeira vez em 25 anos, as Farc não ocuparam nenhuma nova cidade. As forças de segurança estão na ofensiva e confiantes que debilitaram os rebeldes a ponto de os terem incapacitado como ameaça à existência do Estado colombiano.
Sem negociar, as Farc irão despencar de vez para o crime comum, sem nenhuma legitimidade política. Melhor escutar os conselhos, por mais suspeitos que sejam.