Na ficção, tudo é mais fácil. Pinóquio contava uma mentira e o fato era estampado em seu rosto. Com o nariz enorme, ele ficava sem o milagre da Fada Azul e não merecia ser transformado em um menino de carne e osso. Aconselhado pelo Grilo Falante, ele aprendeu a lição e passou a somente dizer a verdade.
Deixando a fantasia de lado, no mundo real as coisas nem sempre são tão simples assim. Os pais, sem o auxílio de nenhuma varinha de condão, precisam saber o que fazer quando são os filhos que se transformam em “Pinóquios”. A pequena Luana Gola Alves, de 8 anos, por exemplo, não fica com o nariz avantajado.
Ainda assim, sua mãe, Carina Gola, reconhece na hora quando a menina está mentindo. “Desde o momento em que ela começou a falar, estabeleci que não dizer a verdade é algo ruim, que não traz nenhum benefício. Com isso, eu identifico em seus olhos quando ela mente. Ela se sente mal e logo vem me contar o que aconteceu de fato”, conta Carina.
As mentirinhas de Luana são as “clássicas” da infância. Sabe aquela dor de cabeça que aparece um pouquinho antes do horário da escola? Também entram na lista a lição de casa já cumprida em menos de cinco minutos e a garantia de que o banho foi tomado, mesmo com os pés e as mãos imundos. Vez ou outra, Luana acaba se rendendo a essas “falhas”.
“Mas eu nunca menti”, afirma a menina, imediatamente ao ser perguntada. Após alguns segundos, ela tenta consertar. “Acho que menti só uma vez. Porém, não lembro muito bem como aconteceu”, emenda.
Luana confirma que aprendeu quando ainda era novinha que a mentira decepciona os outros. “A minha mãe me ensinou que, quando as pessoas descobrem a mentira, elas ficam tristes. Não gosto de mentir, só quando é necessário, tipo um assunto particular que os outros não precisam ficar sabendo”, afirma, com propriedade.
Para ensinar essa lição e solucionar o problema das pequenas mentiras da filha, a “mágica” de Carina é conversar. “Toda vez, explico que, sem confiança, ninguém vai acreditar nela. Envergonhada, Luana não consegue mentir direito”, diz a mãe, aliviada.
A fórmula de Carina, segundo os especialistas, é mesmo a que mais funciona nos casos das mentirinhas. Mas, para que esses pequenos deslizes não virem problemas maiores no futuro, pais e mães precisam ficar atentos. Se não são barradas cedo, as mentirinhas podem gerar adultos sem ética e com dificuldades nas relações humanas.
BOXE:
NÃO ACREDITE E NEM FINJA QUE ACREDITA (*)
“Meu filho não mente.” Essa afirmação não revela uma crença, mas uma espécie de conivência com a mentira que o filho contou. O filho mente, sim, mas é preferível acreditar no filho do que na escola, no síndico, no guarda, no funcionário de casa, etc. É uma forma muito pouco eficiente de acobertar uma mentira, ao mesmo tempo uma maneira ingênua ou covarde de os pais enfrentarem um filho que está mentindo. O motivo principal desta mentira é acobertar uma verdade que o próprio filho sabe que até mesmo seus próprios pais não a aceitariam. Portanto, quando os pais acreditam ou demonstram que acreditam sem de fato acreditar, reforçam no filho o mecanismo da mentira.
A mentira continua quando encontra pessoas que acreditam nela. Isto é, o filho continuará mentindo porque os seus próprios pais acreditam nela. Somente os pais sabem se estão verdadeiramente acreditando no filho ou se estão fingindo que acreditam. Muito pior para o filho quando este percebe que os pais estão fingindo que acreditam, pois ele percebe que os pais também não estão sendo verdadeiros. Ou seja, se os próprios pais mentem, mesmo que seja para poupar o filho, por que o próprio filho não haveria de mentir para se poupar das suas responsabilidades? Desta maneira os pais não estão preparando o filho para fazer parte dos cidadãos que querem uma sociedade mais justa, mas estão reforçando o filho a ser um transgressor social.
Estes pais deveriam clicar o “atualizar” nas suas vidas, principalmente no que se refere à educação dos filhos. Porque para termos uma sociedade mais humana e justa é necessário que o cidadão seja preparado desde a infância. O novo paradigma da educação é que os pais não permitam que o filho faça em casa, com eles, o que não poderá fazer como cidadão e que o estimulem a praticar em casa, com eles, o que ele terá que fazer fora de casa. Se os pais perceberem que as mentiras do filho começam a atrapalhar o cotidiano, acomodar irregularidades, prejudicar outras pessoas, está na hora de procurar ajuda especializada com um psicoterapeuta. Este(a) psicoterapeuta funcionará como uma prótese provisória até que a mentira fraturada se recupere, transformando-se em uma verdade.