Com a Resolução nº 175 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que determina que a partir de Hoje todos os cartórios de Registro Civil do país devem converter a união estável homoafetiva em casamento civil, sem a necessidade de enviar o pedido ao Poder Judiciário, milhares de casais brasileiros poderão legalizar juridicamente suas uniões. Em 2011, o Supremo Tribunal Federal (STF) já havia reconhecido a união estável entre os homossexuais.
Em novembro de 2011, o casal formado por Carlos Tufvesson e André Piva celebrou a união estável, após 16 anos de convívio. Os dois, porém, pertencem a uma classe social mais tolerante com relacionamentos gays, tabu que cai pior terra com a nova resolução da CNJ, como confirma a pedagoga Simone Queiroz, de 46 anos. Há 18 anos ela mantém um relacionamento com a segurança e secretária Aline Peixoto, de 37. Desde julho do ano passado, as duas já têm a união estável e nesta quinta (15), primeiro dia da resolução, já procuraram o Cartório do Catete (4ºRCPN) para obter informações sobre o procedimento a ser adotado.
“É uma grande vitória de toda comunidade LGBT, mas ao mesmo tempo acho que é uma conquista que não deveria ter tido tanta luta, pois se trata de um direito de cada cidadão: estar com quem ama. Fico feliz por ser o mesmo trâmite dos casamentos heterossexuais, a listagem de documentos é a mesma”, comemora Simone, que é homossexual e evangélica.
Segundo a pedagoga, a nova resolução pode ser positiva em relação à homofobia, no entanto, não em curto prazo.
“Claro que é positivo nesse sentido, mas o preconceito é algo da cabeça das pessoas, é algo que elas praticam, então creio que ainda vai demorar muito para reconhecerem que nós podemos amar alguém do mesmo sexo. Vai demorar, mas agora as pessoas vão ser obrigadas a respeitar”, afirma Simone.
A Oficial Registradora do Cartório do Catete (4ºRCPN), Priscilla Machado Milhomem, comemora a resolução do CNJ, mas ela afirma, no entanto, que ainda irá esperar o juiz de direito responsável pelo cartório se pronunciar.
“Nós nunca recusamos o procedimento e sempre recebemos normalmente os documentos para habilitar o processo do casamento civil. Encaminhamos para os juízes e promotores avaliarem. Só que o juiz sempre recusou, tanto é que até hoje só registramos um casal homoafetivo neste cartório. Esperamos que ele acate a medida do CNJ e revogue a portaria que exige que o processo passe pelo juiz. Há este impasse e, por questão de hierarquia, ainda vamos esperar ele se pronunciar, mas a questão deve ser resolvida em poucos dias”, acredita a registradora do cartório.
De acordo com Priscilla, a demanda do Cartório do Catete é de cerca de 80 casamentos por mês: “Agora esperamos que este número aumente para 90”.
Para o presidente da Federação Brasileira de Notários e Registradores (Febranor) e da Associação de Notários e Registradores do Brasil (Anoreg), Rogério Portugal Bacellar, “haverá uma demanda natural”.
“A demanda será como aconteceu na época do divórcio, nada exagerado. O mais importante é que a resolução veio disciplinar o que já vinha acontecendo em alguns estados brasileiros. O CNJ trouxe mais tranquilidade ao resto do país”, afirma Bacellar.
Já na opinião do presidente do grupo LGBT Arco Íris, Julio Moreira, a resolução do CNJ trará mais visibilidade à causa.
“Com isso, nenhum juiz poderá retroceder da medida, qualquer cidadão poderá recorrer à Corregedoria para fazer valer seus direitos. No âmbito da América Latina, o Congresso de países como Argentina e Uruguai já vêm reconhecendo o casamento civil e nós não podemos ficar para trás. Lógico que no congresso brasileiro existem os conservadores, mas a questão já é uma realidade, dentro de uma demanda real. Foi um passo muito significativo e não há como retroceder”, ressalta Moreira.
De acordo com o censo do IBGE de 2010, há no Brasil cerca de 60 mil casais homoafetivos. Alguns desses estão contabilizados pelo Núcleo de Defesa da Diversidade Sexual e Direitos Homoafetivos (Nudiversis). Segundo a defensora pública e coordenadora do núcleo, Luciana da Mota Gomes de Souza, o Nudiversis tem 117 pedidos de casamento civil.
“Desses, 15 foram considerados procedentes, 32 já foram julgados improcedentes e temos em andamento 70”, afirma Luciana.
*Do Projeto de Estágio do Jornal do Brasil
CaioLima