Na terça-feira da última semana, a barbearia de seu Nelson virou ponto turístico em Santa Bárbara D”Oeste. Não que tenha sido encontrado lá um fóssil de dinossauro, petróleo embaixo da terra ou um filho perdido de Dom Pedro II. Tudo isso é porque Dunga resolveu incluir o nome de Diego Tardelli na lista de convocados da Seleção Brasileira para o amistoso contra a Estônia.
Aqui está uma alegria só, né? Todo mundo me liga, perguntam dele, dão os parabéns”, explica Nelson, 75 anos, avô de Diego Tardelli. O barbeiro mais antigo de Santa Bárbara, pacata cidade do interior paulista, com cerca de 187 mil habitantes, parecia surpreso com o telefonema da reportagem do Terra, mas não hesitou em contar boas histórias sobre a infância do rebento, maior goleador do futebol brasileiro em 2009.
“Ele jogava futebol em todos os campinhos e quadras por aqui, mas principalmente em um do André Cruz, ex-zagueiro da Seleção. Todo mundo vinha sempre me perguntar dele, perguntar se ele ia jogar bola. A prefeitura também sempre vinha buscá-lo pra jogar”, conta, entusiasmado. Maurílio D”elboux, ex-diretor de futebol do União Barbarense na época, concorda. “Sempre se mostrou diferente dos outros. Ele jogava pra tudo quanto é time. Na rua, em futebol de salão…”.
Entre um ou outro elogio e história contada sobre Diego, seu Nelson faz um porém. “Ele era muito desligado quando era molecão e não falava com as pessoas”, fala o avô. “A gente dava dura e no dia seguinte ele fazia a mesma coisa”, concorda Maurílio. O que talvez explique a personalidade problemática do agora convocado para a Seleção Brasileira.
“Ele não ia treinar às vezes e vinha me pedir dinheiro para ir nos bailinhos de Americana (cidade vizinha)”, conta o avô, que tem saudade de Diego. “Faz 2 anos e meio que a gente não se vê. Ele nunca me deu quase nada e eu também nunca pedi”, lembra, sem ressentimentos.
“Tenho 64 anos trabalhando só como barbeiro. Trabalho demais, às vezes até meia-noite”, fala seu Nelson, com orgulho, aos 75 anos de vida. “Já até perdi (os movimentos de) um dedo”, completa. Na barbearia em que comanda, o avô de Tardelli exibe orgulhoso os recortes de jornal do neto famoso, em meio aos quadros do tempo em que também jogava futebol nos campos locais. “Joguei bola até os 48, nunca bebi e nunca fumei”, ressalta.
A caminhada e as estripulias do corintiano Diego Tardelli
Quando criança e adolescente, ninguém em Santa Bárbara conhecia Diego e muito menos Tardelli. Acontece que o hoje atacante do Atlético-MG tinha os cabelos descoloridos, em homenagem a um ídolo corintiano. “Todo mundo só o chamava de Dinei”, conta Maurílio.
“Ele é corintiano roxo, mas não falo pra ninguém. Não pode falar. Acho que é até agora, só que não tem coragem de falar”, brinca o avô, seu Nelson. Apesar disso, Diego Tardelli teve uma passagem pelo Santos na adolescência, mas não permaneceu, justamente, por mau comportamento. Lá, atuou ao lado do xará que se tornaria grande parceiro de Robinho.
O desempenho em campo era, como quase sempre, muito bom. Mas quando sua mãe, dona Ivânia, telefonou para saber do filho, teve uma surpresa desagradável. Em vez de frequentar a escola, Diego “matava” as aulas no colégio para curtir as praias de Santos. E foi dispensado.
Na volta para casa, Diego Tardelli então foi jogar nas categorias de base do União Barbarense e fez misérias, a ponto de defender os juvenis, juniores e profissionais ao mesmo tempo. Dependendo da importância do jogo, o clube definia em qual equipe teria seu jogador mais valioso.
Certa vez, Tardelli jogou três partidas, uma por cada time, em um intervalo de 24 horas. Em uma manhã de sábado, marcou três vezes contra os juvenis do São Caetano. Na tarde, pelos juniores, marcou outros dois contra a Inter de Limeira. Domingo cedo, pelos profissionais, venceu o Ituano por 2 a 0 e fez outro – seu único no time de cima. Aos 17 anos, a trajetória de Diego já se aproximava do São Paulo.
A chegada ao Morumbi
No início de 2003, Diego viajou até a capital, onde faria um amistoso contra os juvenis do São Paulo. O Barbarense venceu por 1 a 0, gol dele, destaque da partida. No fim de semana, dirigentes são-paulinos foram até Santa Bárbara observá-lo.
“O time estava perdendo e o Diego entrou no intervalo, porque estava sendo poupado. Ele fez um gol e viraram o jogo para 3 a 2. Depois do jogo, vieram perguntar sobre ele pra minha filha, sobre o contrato dele. Era alguém do São Paulo, acho que o Cilinho”, lembra seu Nelson.
Os emissários são-paulinos então foram até o cartório de Santa Bárbara, pagaram a multa rescisória – avaliada em cerca de R$ 21 mil – e levaram Diego Tardelli para o Morumbi. “Também deram um Gol zero quilômetro para a minha filha”, diz o avô.
A transferência causou polêmica e estremeceu a relação entre São Paulo e União Barbarense, como recorda Maurílio D”elboux. “Nós procuramos eles para fazer parceria, mas nos falaram que não queriam. No outro dia, foram lá e compraram ele sozinho”.
No mesmo ano, Diego Tardelli estrearia nos profissionais do São Paulo, contra o Coritiba, no Campeonato Brasileiro. Bastaram 10 minutos em campo para ele virar sensação. Talentoso e problemático, colecionou gols na mesma medida de faltas a treinamentos, o que agora parece remediado no Atlético-MG. E também na Seleção Brasileira.
Redação Terra