Apesar de a Al-Qaeda não ter conseguido lançar nenhum grande ataque em território ocidental desde 7 de julho de 2005, quando deixou 56 mortos e 700 feridos no sistema de transporte de Londres, a rede terrorista do saudita Osama Bin Laden ainda é uma grande preocupação para as agências de inteligência do Ocidente.
O motivo nem é mais só o temor de que terroristas estrangeiros consigam repetir a sofisticação do 11 de Setembro de 2001, quando aviões lançados contra as Torres Gêmeas, em Nova York, e contra o Pentágono, em Washington, deixaram quase 3 mil mortos nos EUA. O temor agora é de que terroristas com base nos EUA ou na Europa – alguns deles com nacionalidades locais – planejem e lancem atentados.
Exemplos recentes não faltam. Na próxima semana, começa nos EUA o julgamento de uma aparente típica americana da Pensilvânia, cuja prisão, em outubro, voltou a acender o sinal de alerta para o risco de terrorismo doméstico em território americano.
Usando o pseudônimo de “Jihad Jane” (Jane Guerra Santa, em tradução livre), Colleen R. LaRose, de 46 anos, declarou-se em março inocente das acusações de recrutar terroristas via online e de conspirar com radicais islâmicos para matar um dos 12 cartunistas dinamarqueses que, em 2006, desataram a fúria de alguns países muçulmanos por desenhar charges ironizando o Profeta Maomé.
Mas suas declarações cibernéticas contradisseram sua alegação de inocência. Cobrindo os cabelos loiros com um véu islâmico, Jihad Jane postou um vídeo no YouTube declarando que pretendia fazer algo para atenuar o sofrimento dos muçulmanos. Além disso, segundo seu indiciamento, ela viajou à Europa em agosto onde planejava treinar “jihadistas”.
Tudo interconectado via web
O caso de LaRose é o exemplo de como americanos “desequilibrados” podem estar suscetíveis às investidas de grupos radicais e engrossar o coro dos que usam a internet como ferramenta terrorista.
O potencial desses contatos se comprovarem letais foi exposto em 5 de novembro, quando o psiquiatra militar americano Nidal Malik Hasan, de 39 anos, deixou 13 mortos e 30 feridos ao abrir fogo contra seus companheiros dentro da Base de Fort Hood, no Texas.
Investigações sobre a motivação do ataque indicaram que Hasan visitava regularmente sites radicais e, em 2001, teve o imã americano Anwar al-Aulaqi como seu “mentor espiritual” quando freqüentava uma mesquita na Virgínia. Nos anos seguintes, os dois mantiveram contato por e-mail, segundo informações da inteligência americana.
Atualmente com paradeiro incerto no Iêmen, Aulaqi também teria influenciado o nigeriano Umar Faruk Abdulmutallab, de 23 anos, suspeito de tentar explodir um avião que fazia a rota Amsterdã-Detroit em 25 de dezembro.
Segundo as investigações, Abdulmutallab teria entrado em contato por e-mail com Aulaqi e depois o encontrado pessoalmente no Iêmen, onde atua a Al-Qaeda da Península Arábica. O grupo teria fornecido ao nigeriano os explosivos que escondeu em suas roupas íntimas e não conseguiu detonar no avião com mais de 300 pessoas a bordo.
“Apesar dos vários golpes que a organização sofreu, a tentativa de ataque do Natal mostrou que a Al-Qaeda continua muito perigosa”, afirmou ao iG o ex-agente da CIA Bruce Riedel, especialista em terrorismo e política externa da Brookings Institution.
Para sorte do presidente dos EUA, Barack Obama, o nigeriano fracassou no atentado, afirmou Riedel. “Se o ataque tivesse sido bem-sucedido, teria transformado a presidência de Obama assim como a de George W. Bush (2001-2009)”, disse. “Se o nigeriano tivesse tido êxito, o presidente americano seria muito criticado pela oposição republicana, que o acusaria de ser fraco nas questões de segurança nacional”, completou.
Inicialmente mais atuante no Paquistão e Afeganistão, a rede espalhou-se por países como Iêmen, Argélia, Iraque e Somália após ser fortemente golpeada com a invasão da coalizão liderada pelos EUA ao Afeganistão, em 2001.
Para o jornalista americano Lawrence Wright, a tentativa de ataque também revelou o quão desarticulada continua a inteligência americana, apesar de ela ter sido reestruturada por Bush após o 11 de Setembro.
“Os EUA não ficarão seguros até que tenhamos pessoas dentro da burocracia de inteligência com uma profunda compreensão das linguagens e das culturas que fomentam os movimentos terroristas”, disse Wright, que é autor do livro “O Vulto das Torres: A Al-Qaeda e o Caminho até o 11/9”, que lhe rendeu o Prêmio Pulitzer de não-ficção em2007.
Consciente das falhas “potencialmente desastrosas” das agências de inteligência, Obama ordenou uma nova reformulação do sistema em 7 de janeiro, 13 dias depois do ataque frustrado. Distribuir relatórios de inteligência de forma mais rápida e direta, melhorar o processamento e a integração de dados coletados e fortalecer o critério para inclusão de pessoas nas listas de observação de possíveis terroristas foram algumas das medidas anunciadas pelo presidente americano.
E é bom que as agências continuem em alerta máximo neste ano, advertiu Riedel. Segundo o especialista da Brookings Institution, há informações de que a Al-Qaeda planeja lançar um novo ataque contra os EUA, nos moldes da tentativa frustrada de Natal, ainda neste ano. “É muito provável que o novo plano esteja sendo elaborado no Iêmen ou no Paquistão”, afirmou.
Leda Balbino, iG São Paulo/u.sEG