Recentemente, Rosângela Oliveira Silva, de 30 anos, foi enterrada em Belém. A polícia paraense relatou que ela se submeteu a um aborto um dia antes, na casa de uma técnica de enfermagem, sofreu complicações e chegou morta ao hospital. Esse é mais um caso que serve para aumentar uma estatística crescente no País, que reforça a polêmica acerca do aborto – assunto que tem levado o clero romano a uma seqüência de derrotas por conta de seu conservadorismo.
Segundo relatório divulgado pela Federação Internacional de Planejamento Familiar (IPPF, em inglês), dos 46 milhões de abortos realizados por ano no mundo, 19 milhões põem em risco a vida da mulher, ocasionando 70 mil mortes anuais, o que, de acordo com especialistas, seria evitado com a legalização, a qual o clero romano se opõe.
O maior número de gestações interrompidas, principalmente as ilegais, acontece nos países pobres (96%). O documento mostra que 78% do total ocorre nos países em desenvolvimento.
A ilegalidade causa enormes prejuízos no Brasil. O Ministério da Saúde (MS) estima a ocorrência de 1 milhão de abortos anuais, levando 180 mulheres à morte. Entidades que lutam pela legalização do procedimento, porém, acreditam que o número real seja o dobro ou triplo do exposto pelo MS.
De acordo com a IPPF, no ano passado, os abortos clandestinos foram responsáveis por 230.523 internações no Sistema Único de Saúde (SUS) – quase 700 por dia – para o tratamento de complicações após procedimentos ilegais, ao custo total de quase R$ 33,7 milhões. Já as 2.068 internações relativas àqueles permitidos por lei (em caso de risco de morte para a mãe e de gravidez resultante de estupro) custaram ao SUS R$ 302,8 mil.
– Só existe problema de mortalidade materna causada por interrupção ilegal da gravidez nos países onde a legislação não permite a realização dos abortos nas condições médicas adequadas – ressaltou a diretora da IPPF, Carmen Barroso.
As práticas ilegais ainda são adotadas no Brasil. A maior parte das mulheres utiliza métodos letais, como garrafadas, talos de mamona ou agulhas de crochê e recorrem a clínicas clandestinas, sem equipamentos e higiene necessários. O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ), Wadih Damous, disse que a aborção é praticada por quase um milhão na clandestinidade. Ele relatou que “está mais do que na hora de a sociedade civil enfrentar o tema de forma aberta e sem preconceito”.
No Brasil, a lei permite o fim da gestação em casos restritos: quando há risco para a mulher ou quando a gravidez decorre de estupro. Fora isso, tal prática é tida como crime previsto no Código Penal, sujeito à pena que varia de um a oito anos de prisão.